Memórias de um sargento de milícias - Manuel Antonio de Almeida

Manuel Antonio de Almeida - Memórias de um sargento de milícias, RJ, Nova Fronteira, 2022

Manuel Antonio de Almeida (1831-1861) viveu pouco (morreu num naufrágio nas costas do Rio de Janeiro), escreveu apenas duas obras de fôlego, este livro e mais o drama lírico Dois Amores, mas pelas qualidades de Memórias de Um Sargento de Milícias entrou com brilho para a história da literatura brasileira. MAM tinha apenas 21 anos quando deu vida a Leonardo, pai e filho, major Vidigal (este realmente existiu), D. Maria, Luisinha e outros personagens deste romance. Que, por vezes se lê como se estivéssemos lendo uma obra de Machado de Assis (1839-1908), seu contemporâneo mas alguns anos mais jovem.

Assim como Machado faria também, MAM lê e expõe os pensamentos dos personagens, dialoga com o leitor, coloca-o no meio de sua história recheada de observações sobre a vida fluminense durante o primeiro reinado ("Era no tempo do rei.", é a famosa frase de início), conta sobre os usos e costumes desse tempo, sobretudo entre os membros das classes média e baixa, faz uso do humor (que há de sobra aqui) e da ironia, enfim revela-se um autor bastante moderno para a época. Cabe perguntar: teria MAM lido A Vida e as Opiniões do Cavalheiro Tristram Shandy, de Laurence Sterne, publicado quase cem anos antes? Sabemos que Machado leu e foi influenciado pelo autor inglês.

Não acontece grande coisa em Memórias de Um Sargento de Milícias (publicado em 1854-1855), ninguém é totalmente bom ou ruim, os personagens não passam por transformações, não temos um herói para salvar donzelas em perigo, não temos uma mocinha virtuosa etc., diferentemente do que acontecia na literatura romântica. Então, embora tenhamos um final feliz, tudo termine bem para todos, não é possível dizer que MAM seja um autor romântico. Ele é um precursor do realismo brasileiro, inaugurado justamente por Machado de Assis e seu magistral Memórias Póstumas de Brás Cubas (publicado em 1880-1881).

Sendo o livro de MAM em grande parte uma saborosa crônica de costumes, então sua leitura é muito prazerosa o tempo todo. É uma pena que o autor tenha morrido tão jovem e deixado apenas esta obra para reconhecimento de seu inegável talento de romancista. Também é lamentável que pareça não haver grande empenho em nossas escolas para apresentar devidamente a obra de MAM (ou a de Machado de Assis e de outros autores do passado) aos jovens leitores e estudantes.