Eu, Myriam Rios (memórias)
        
          Perfil: 
       "Myrian Rios, nascida em Belo Horizonte, começou sua carreira há 28 anos, num concurso para novos talentos da Rede Globo. Sua primeira novela foi "O Feijão e o Sonho", exibida em junho de 1976. A partir daí, atuou em mais de 20 novelas como atriz, e como apresentadora nos programas "Globo de Ouro" e "Vídeo Show". 
Produziu e atuou em musicais infantis e também no cinema. 
      Atualmente, é apresentadora do programa "Atitude Solidária", da TV Canção Nova, e "Semeando Esperança", na Rádio Canção Nova AM, pela rede nacional."
(transcrito da contracapa) 
 

I – Qualidades: 
a) português correto, sempre; 
b) estilo ágil, períodos curtos, concisos; 
c) ternura, encantamento, pureza juvenil; 
d) não há palavras vazias: todas bem empregadas, valorizando a mensagem da autora; 
e) as fotos, em preto-e-branco, dão um tom de irrealidade celeste, graças à sábia seleção; 
f) a capa, absoluta em arte e bom-gosto; 
g) as letras, num tamanho ideal; 
h) o extremo cuidado editorial; 
i) a revisão técnica, a cargo de Camila Castro Sanches. 
 

II – Defeitos: 
a) Estilo: 
     Supercomum, pobre mesmo, sem a menor preocupação da autora em reescrever --- reelaborando assim --- seu livro. Faltou perdição literária. Faltou coragem e tempo para perder-se na floresta da Literatura, de onde os bons literatos regressam conduzidos pelas palavras mais luminosas, puras, verdes e únicas, que formarão o seu estilo estonteante, garantindo-lhes a leitura eterna. 
    Essa sua escritura muito arrumadinha, papai-mamãe, feijão-com-arroz, vestidinho dominical, comunica com competência sim, cumpre bem a missão de narrar, sim; todavia, onde a fundura e a fúria dos largos rios inavegáveis? 
 
b) Religião: 
     Excesso de religiosidade, resultando numa obra de auto-ajuda, de testemunho, ou meramente doutrinária, de convencimento ideológico --- e não memórias na acepção literária. 
 
c) Amores: 
    Afinal, a mulher Myrian amou e foi amada por três homens, em princípio: Roberto Carlos Braga, Edmar da Fontoura (mencionado às páginas 60, 80 e 88) e um terceiro personagem; pois ela só fala, ou fala muito mais, do primeiro. 
     Entendemos que não se trata de autopromoção ou estrelismo, pois toda a sua obra contém afirmações sinceras de absoluta humildade, de purificação espiritual pela experiência e o elemento (ou poder) divino. Fora que ela teve uma carreira ofuscante na televisão e no teatro, independente de qualquer apoio sentimental: o seu puro talento a elevou artisticamente. 
     Ora, então por que não reservou ela o mesmo espaço gráfico e importância biográfica aos três? 
     Afigura-se-nos um privilégio, uma discriminação, uma violação a um direito natural... 
 
d) Prefácio: 
     O próprio Padre Jonas Abib, no prefácio, se refere ao livro como "um testemunho". (p. 11)  E acrescenta: "Não é uma biografia.". 
E segue discorrendo sobre a humildade com que Myrian relata seus erros e acertos, transformando esse relato num convite à nossa "conversão", ao mesmo "renascimento" com ela ocorrido. 
      Fala ainda da "simplicidade encantadora" com que ela narra fatos tão pessoais quanto delicados. 
      Acertou, o pároco: o estilo myriano transpira sinceridade, confiança e a serenidade de quem prefere a discrição do confessionário. 
      Acertou ainda ele ao se referir à obra como um "livro tão meigo, tão direto"... 
     O único aspecto que desmerece o seu prefácio é a repetição, de várias maneiras, da afirmação: "Nasceu uma nova Myrian Rios". É novo nascimento para lá, novo nascimento para cá... Cansa, e como. 
     Ia eu apontar alguns chavões, como "ela abre o coração"; contudo observo que todo o prefácio abriga um colossal canteiro de frases e idéias feitas...  
 
                                                  @ 
 
               Considerações finais: 
          1 - Indico o livro ao público juvenil, pela montanha de mensagens positivas, de chamamentos à vida, ao amor, à família, à fama, ao sonho... E ainda pelo relato sem pompa ou afetação de “como funciona” a ascensão de uma estrelinha: muita luta honesta, dedicação, lealdade, união e incentivo de familiares e amigos e... sorte! 
          2 - Obra confessional, sim; mas inteiramente denotativa, não nos levando a maiores reflexões filosóficas ou interpretações estéticas. Construída com as palavras de sentido unívoco, dispensando portanto as ferramentas do sonho maior. 
          3 - Citar Machado de Assis glorifica, sem dúvida. Assim, lembro as "Memórias Póstumas de Brás Cubas". E lembro, ainda, "Por Onde Andou meu Coração", de Maria Helena Cardoso  1903 - ? ). 
         Entendemos que nem todas as memórias aspiram à condição literária. Na verdade, somos nós, os críticos, que assim as sonhamos...  Elas pertencem ao gênero ensaístico. 
          4 - O leitor crítico, esse curiosíssimo pássaro, adora cair em alçapões literários, em arapucas surpreendentes, em armadilhas e labirintos inesperados --- preferindo se libertar sozinho, a duras penas, perdendo penas, partindo as asas, quebrando o bico, ferindo-se todo. Adora. E, pequena Fênix, depois levanta voo, feliz, restaurado pelos grãos de beleza e grandeza que encontrou no livro-prisão. Mas onde a prisão deste livro?! 
          5 - Ora, o que pereniza uma obra? --- Sua linguagem, entre outras razões. A força lírica com que foi escrita. E sua literariedade, ou o predomínio da Arte sobre a Religião, a Filosofia, a História --- sua universalidade enfim, e não o fato de ela existir apenas para católicos, filósofos ou historiadores. 
       A verdadeira obra-de-arte literária possui mil pastores e incontáveis parábolas, destinadas a infinitos rebanhos --- e não um só Pastor e um só Rebanho. 
       Admito entretanto que há memórias literárias e não-literárias, inexistindo qualquer superioridade entre elas, constituindo as segundas importantes documentos de sua época. 
      Admito também que, em momento algum, arvorou-se a autora de haver escrito uma obra-prima. O livro, enfim --- desvanecemo-nos em afirmá-lo ---, é de uma cordialidade gandhiana. Um exemplo singelo de intenções abertas. 
          6 - Ora, ela escreveu “Eu, Myrian Rios” ainda jovem, bela, famosa e carismática, num contexto favorável, de empatia nacional. Entretanto, o que restará de tudo isto daqui a cem anos? Desse ‘glamour’, desse ambiente propício, dessa irretornável época? --- Nada. Ou simplesmente o que se relatou dela --- se bem relatado. Só. 
          ---“E por que não serei mais lida?!” --- indagará indignada. 
      Porque, lindíssima, educadíssima e simpaticíssima Myrian, em 2108 todos teremos perecido, e a geração atuante terá novos ícones, novas Myrians, com novas mensagens em novos livros com o mesmo estilo, os mesmos temas e apelos repetidos que a farão desaparecer muitos antes da face da Terra da Literatura, implacável com memórias repletas de ladainhas, santos e procissões, além de revelações e milagres inverossímeis. 
      Apelo enfim para que ela zele pelo futuro de sua arte, como zela pelo futuro de sua alma. 
 
 
          
Eu, Myriam Rios (memórias), de Myriam 
          Rios.  96 págs.  Editora Canção Nova, SP, 
          2006.  

          Pedidos a www.myrianrios.com 
                   ou a 
www.cancaonova.com



Texto modificado 27 vezes até 22/02/2013.
Ocupei-me de sua obra por 43:00h, até 22/20/2013.

Enviado por Jô do Recanto das Letras em 22/03/2008
Reeditado em 22/02/2013
Código do texto: T912351
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