SONETO ( Mário Faustino )

Necessito de um ser, um ser humano
Que me envolva de ser
Contra o não ser universal, arcano
Impossível de ler

À luz da lua que ressarce o dano
Cruel de adormecer
A sós, à noite, ao pé do desumano
Desejo de morrer.

Necessito de um ser, de seu abraço
Escuro e palpitante
Necessito de um ser dormente e lasso

Contra meu ser arfante:
Necessito de um ser sendo ao meu lado
Um ser profundo e aberto, um ser amado.


Mário Faustino, um gênio consagrado que a crítica literária pouco divulgou. Piauiense de Teresina ( 1930 -1962 ). Jornalista, advogado, poeta, tradutor, crítico literario. Encantado pela beleza e alto nível de sua realização literária, trago ao público do Recanto das Letras o soneto supra, seguido do meu breve comentário.

O poema tem por título SONETO, que a mensagem lhe impõe antes que o rigor formal reclame a uniformidade métrica clássica parnasiana, característica da tradicional forma de composição.
No primeiro quarteto o eu lírico ( sujeito oculto ), evidencia-se na primeira pessoa, carente de outro ser (humano ) que o "envolva de ser". Tem-se aí a conotação deste vocábulo, ser ( substantivo ) e ser ( verbo ) constituindo-se na carência física/afetiva do poeta. Um ser contrário ao " ser universal", ou seja, ao comum e misterioso ser, cuja essência não se deixa transparecer. Aquele ser que não se dá conta de sí mesmo e, consequentemente, nada tem essencialmente que envolva e complete o outro ser.
O transitivo indireto "necessito" se completa com o objeto indireto, imaginário "ser", reforçado pelo adjunto adnominal "humano" de que precisa. Não de um ser qualquer, mas de um ser humano, contrário ao arcano que se não ler, que não se mostra.
O segundo quarteto vem com a alegórica assonância " à luz da lua", sob a qual o poeta, solitariamente, atenua o " desumano desejo de morrer".
Repete-se no primeiro terceto a necessidade de um ser, aqui mais próximo, quase palpável, cujo abraço lhe estenda," dormente e lasso" ao ser carente.
"Arfante", neste epílogo a fechar com "chave de ouro" a necessidade do poeta de ter consigo não um simples ser "arcano", estranho e enigmático, mas alguém que, ao seu lado, seja-lhe visivelmente claro, aberto e profundamente amado.
Proposital ou intuitivamente, a estrutura do soneto se compõe nessa igual necessidade de completar-se em contagem silábica, como que cadenciando a mesma carência do poeta que, nem ligou pra pra isso na inquieta necessidade do SER.

Hermílio
LordHermilioWerther
Enviado por LordHermilioWerther em 13/09/2008
Reeditado em 23/05/2009
Código do texto: T1176548
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