quando se é

i

e quando algo acontece mas somente os olhos

vêem, os ouvidos sentem? quando o tal eu não

se apercebe, não põe fé naquilo que os sóbrios

instintos parecem adivinhar da mão

sendo jogada ali? e quando depois surge

uma estranha sensação de que algo óbvio, próximo,

aconteceu a si? e quando logo fulgem

evidências mas não há o que as confira um sólido

liame com o tabuleiro então disponível ?

quando após exames não fica discernível

ao eu aquilo que ao cérebro já chegou?

pobre alma ocupada – como ser diferente? –

primariamente além do mero viver

precisa saber lidar com o “eu sou”

ii

mas permanece a alma, entretanto, a desconfiar.

a encasquetar-se, obstinar-se que há algo a fugir.

até anseia inteligir, mas como acessar

a tais instâncias recônditas em si?

camadas que foi condicionada a abafar,

relegar ao segundo plano, para ,enfim,

cingir o seu eu, suprimir a inicial

paúra, àquela mistura feita em seu cadinho -

seu corpo – e que a incutiu um horror que doeu )

quando migrou do breu para a claridão,

do acolhedor derredor para a imensidão

rica alma, porém, quando apesar deste mundo

brindá-la com perigos no pano de fundo

tem à Humanidade a acolher como um dos seus.

iii

e com esta Humanidade há de aprender fáceis

soluções para problemas complexos, tácteis

sensações parecem sobrepor-se a tudo

que à alma circunda, o grito torna-se mudo

- o grito que inunda ao corpo com suas tensões

e, ainda assim, o eu teima em ignorar às razões -

o grito do acontecido - e, sendo assim, válido

mas ignorado, torna-se sintoma, pálido

e tênue, vira rizoma, posto que esquálido,

pois brota aquém, aqui, além, embota a máquina

- até que algum azeite a destrave, leia a página

em que está escondido o princípio anárquico

e cause deleite ao dar forma ao que, no máximo,

freqüentaria sonhos tidos como fantásticos