Análise de Texto Literário "Catar Feijão".

Análise de textos literários

A idéia de analisar textos nasceu de uma troca de mensagens entre Recantistas que identificavam a necessidade de uma análise detalhada de textos literários. Visitando determinados tópicos do Recanto percebemos alguma dificuldade de identificar certos aspectos comuns em poesia; resolvemos então propor a criação de um tópico que realizasse alguma coisa neste sentido.

Este esboço é resultado de um primeiro movimento para estruturar um modelo que atenda ao desenvolvimento necessário de todos os Recantistas que demonstrarem interesse em conhecer algumas particularidades sobre esta forma de expressão.

Este trabalho não pretende unanimidade, ao contrário, solicita complementação e intervenção na construção de um modelo que proporcionaria material de pesquisa aos usuários que nos acessam; desta forma dando maior visibilidade ao trabalho realizado nas oficinas de criação literária e reforçando o interesse de nosso público.

O texto escolhido para esta primeira experiência é da autoria de João Cabral de Melo Neto, “Catar feijão”.

CATAR FEIJÂO

1.

Catar feijão se limita com escrever:

joga-se os grãos na água do alguidar

e as palavras na da folha de papel;

e depois, joga-se fora o que boiar.

Certo, toda palavra boiará no papel,

água congelada, por chumbo seu verbo:

pois para catar feijão, soprar nele,

e jogar fora o leve e oco, palha e eco.

2.

Ora, nesse catar feijão, entra um risco:

o de entre os grãos pesados entre

um grão qualquer, pedra ou indigesto,

um grão imastigável, de quebrar dente.

Certo não, quanto ao catar palavras:

a pedra dá à frase seu grão mais vivo:

obstrui a leitura fluviante, flutual,

açula a atenção, isca-a com o risco.

João Cabral de Melo Neto.

Começaremos pela análise estilística, observando os aspectos semânticos; nesta etapa destacamos as palavras e analisamos sua significação ocasional e expressiva. Complementa esta etapa a análise do emprego expressivo das figuras de palavras (metáfora, metonímia, etc.) e figuras de pensamento e sentimento (antítese, eufemismo, hipérbole, etc.).

Pesquisa do vocabulário.

Catar | v. tr. | s. m.

Catar

v. tr.

1. Pesquisar, buscar.

2. Espiolhar.

3. Buscar e matar (os parasitas capilares).

4. Examinar atentamente.

5. Acatar.

s. m.

6. Ant. Récua de camelos ou mulas.

Limita

3ª pess. sing. pres. ind. de limitar

2ª pess. sing. imp. de limitar

Limitar

v. tr.

1. Servir de limite a.

2. Pôr limites a; demarcar.

3. Restringir.

4. Moderar.

5. Aprazar, marcar, fixar.

v. intr.

6. Confinar.

v. pron.

7. Não passar além de.

8. Não se exceder.

9. Ater-se.

10. Contentar-se.

11. Restringir-se.

Escrever | v. tr. | v. intr. | v. pron.

Escrever (ê)

v. tr.

1. Pôr ou dizer por escrito.

2. Encher de letras.

3. Compor, redigir.

4. Ortografar.

5. Fig. Fixar, gravar.

v. intr.

6. Representar o pensamento por meio de caracteres.

7. Dirigir-se por escrito a alguém.

8. Formar letras.

9. Ser escritor.

v. pron.

10. Corresponder-se, cartear-se.

grão | s. m. | adj. 2 gén.

grão

s. m.

1. Cada uma das sementes de várias gramíneas e de alguns legumes.

2. Por ext. Grão-de-bico.

3. A planta que dá o grão-de-bico.

4. Nome genérico de vários corpos arredondados que não excedem o tamanho de um grão de milho.

5. Antigo peso correspondente a 496 miligramas.

6. Mó superior do moinho.

7. Pop. Testículo.

adj. 2 gén.

8. Grande.

Alguidar | s. m.

Alguidar

s. m.

Vaso, geralmente de barro, mais largo que alto, e cuja boca tem muito maior diâmetro que o fundo.

Água | s. f. | s. f. pl.

Água

s. f.

1. Líquido natural, transparente, incolor, geralmente insípido e inodoro, que brota da terra, e ocupa os 4/5 do Globo.

2. Lugar por onde a água corre ou se aglomera.

3. Chuva.

4. Suor.

5. Lágrimas.

6. Seiva.

7. Limpidez (das pedras preciosas).

8. Lustre, brilho.

9. Nome de vários preparados farmacêuticos.

10. Veio por onde entra água no navio.

Águas

s. f. pl.

11. Sítio onde se tomam águas minerais.

12. Urina.

13. Vertentes do telhado.

14. Ondulações, reflexos.

15. Hemorragia que precede o parto.

16. Limites marítimos de uma nação.

Boiar | v. intr. | v. tr.

Boiar

v. intr.

1. Andar em cima e à mercê da água.

2. Bras. Fig. Almoçar ou jantar.

3. Pop. Errar em algum exercício, dançar mal.

v. tr.

4. Amarrar (à bóia).

5. Fig. Hesitar.

Congelada

sing. part. pass. de congelar

fem. sing. de congelado

Congelar -

v. tr.

1. Transformar um líquido em sólido pela ação do frio.

2. Coagular.

3. Fig. Embaraçar, embargar.

Congelado

adj.

1. Frio como gelo.

2. Coagulado.

Chumbo | s. m. | s. m. pl.

1ª pess. sing. pres. ind. de chumbar

Chumbo

s. m.

1. Metal denso (Pb), n.º 82, de massa atômica 207,21, de um cinzento azulado.

2. Grão desse metal para armas de fogo.

3. Reprovação escolar.

4. Fam. Juízo, tino.

5. Caractere, composição de imprensa.

Chumbos

s. m. pl.

6. Pedaços de chumbo que, postos na borda das redes, as obrigam a afundar-se.

Chumbar

v. tr.

1. Soldar com chumbo.

2. Guarnecer de chumbo.

3. Pôr o selo de chumbo (da alfândega).

4. Tapar com chumbo ou outro metal.

5. Enganar.

6. Prender.

7. Reprovar (em exame).

8. Pop. Embriagar.

Verbo | s. m.

Verbo

s. m.

1. Palavra.

2. Relig. A segunda pessoa da Trindade, encarnada em Jesus Cristo. (Nesta acepção, grafa-se com inicial maiúscula.)

3. A sabedoria eterna. (Nesta acepção, grafa-se com inicial maiúscula.)

4. Gram. Palavra com a qual afirmamos a existência de uma ação, um estado ou uma qualidade que atribuímos ao sujeito da oração.

5. Tom de voz.

6. Elocução; eloqüência.

7. Expressão; parte principal de uma coisa.

8. Ant. Rifão; ditado.

Soprar | v. tr. | v. intr.

Soprar

v. tr.

1. Dirigir o sopro para.

2. Agitar com o sopro.

3. Apagar com o sopro.

4. Bafejar.

5. Insinuar; sugerir.

6. Atear.

7. Suscitar.

8. Segredar.

9. Provocar a ocultas.

v. intr.

10. Agitar-se.

11. Ventar.

12. Emitir sopro.

13. Pop. Denunciar (em segredo).

14. Dar com a língua nos dentes, cometer inconfidência.

Leve | adj.

1ª pess. sing. pres. conj. de levar

3ª pess. sing. imp. de levar

3ª pess. sing. pres. conj. de levar

Leve

adj.

1. Que tem pouco peso.

2. Ágil.

3. De fácil digestão.

4. Pequeno, insignificante.

5. Mal distinto, vago, subtil; delicado.

6. Aliviado; não opresso.

7. De leve: levemente.

Levar

v. tr.

1. Tirar (alguma coisa) de diante de alguém.

2. Ter (alguma coisa) consigo ou sobre si.

3. Ter no bolso.

4. Vestir.

5. Usar.

6. Transportar.

7. Arrastar.

8. Persuadir.

9. Roubar.

10. Gastar.

11. Exigir ou receber como preço.

12. Comportar, conter.

13. Encerrar.

v. intr.

14. Conduzir.

15. Apanhar pancadas.

v. pron.

16. Deixar-se guiar.

17. Mar. Levantar ferro.

18. Levar a cabo: concluir.

19. Levar à cena: representar.

20. Levar água no bico: ter intenção reservada.

21. Levar a mal: não gostar.

22. Levar a palma a alguém: excedê-lo.

23. Levar couro e cabelo: levar caro.

24. Levar para tabaco: apanhar pancada ou castigo.

25. Levar-se do Diabo: enfurecer-se.

Oco | adj. | s. m.

oco (ô)

adj.

1. Que não tem nada dentro; sem miolo.

2. Fig. Fútil, vão; sem juízo.

s. m.

3. Vão; cavidade.

Palha | s. f.

Palha

s. f.

1. A haste seca das plantas gramíneas.

2. O que fica depois da debulha.

3. Palhinha.

4. Partícula de alguma erva ou coisa semelhante.

5. Fig. Coisa insignificante.

6. Banalidade.

7. Falha nas pedras preciosas, nos metais ou no vidro.

8. Dar palha a: enganar com boas palavras, intrujar.

9. Fumo de palha: coisa de pouca monta.

10. Homem de palha: homem sem préstimo.

11. Partir a palha: acabar a inimizade; terminar a contenda.

eco | s. m.

-eco

eco-

eco-

Eco

(latim echo, - us)

s. m.

1. Repetição de um som reenviado por um corpo duro.

2. Som assim repetido.

3. Som pouco claro. = RUMOR

4. Imitação ou repetição de palavras ou atos.

5. Fig. Pessoa que, quando fala, só repete o que outrem disse.

6. Notícia pouco clara ou sem fundamento. = BOATO, RUMOR

7. Recordação ou vestígio. = MEMÓRIA

8. Corrente de simpatia; bom acolhimento. = ADESÃO

9. Fís. Reflexão de uma onda eletromagnética ou de radiofreqüência.

10. Poét. Versif. Composição em que se repete a última parte do último verso.

-eco (é)

(origem pré-romana)

Forma diminutiva, geralmente pejorativa (ex.: estudanteco, livreco).

eco-

(grego oíkos, -ou, casa, habitação, bens)

1. Significa casa, domicílio.

2. Significa meio ambiente, ecologia.

eco-

(latim echo, -us)

Significa eco, ressonância.

Risco | s. m.

1ª pess. sing. pres. ind. de riscar

Risco

s. m.

1. Risca.

2. Delineamento; traçado; debuxo.

3. Perigo; inconveniente.

4. Gír. Golpe com instrumento cortante.

5. A risco de: expondo-se a.

6. Correr o risco: estar exposto a perigo.

Riscar

v. tr.

1. Fazer riscos em.

2. Apagar com riscos.

3. Marcar; delinear.

4. Eliminar.

5. Traçar.

6. Excluir; suprimir; expungir.

v. intr.

7. Perder a amizade, ser excluído das relações de.

8. Pop. Travar luta; brigar.

v. pron.

9. Apagar-se; excluir-se; sumir-se.

Pesado | adj.

sing. part. pass. de pesar

Pesado

adj.

1. Que pesa muito; grave.

2. Intenso; profundo.

3. Carregado de humores, vapores, etc.

4. Cheio, enfartado.

5. Tardo, que é muito lento.

6. Obeso.

7. Incômodo, molesto, enfadonho, impertinente.

8. Grosseiro, ofensivo; sensível.

9. Duro, áspero e insofrível; forte; violento; danoso.

10. Ditos: palavras, graças pesadas, ditos, palavras, graças grosseiras ou ofensivas.

11. Indústria pesada: o mesmo que siderurgia.

12. Pesado a ouro: diz-se do que tem custado muito caro.

13. Pesado de anos: que é muito idoso.

14. Pesado de cuidados: cheio de cuidados.

15. Ser pesado a alguma pessoa: ser-lhe importuno ou incómodo; causar-lhe despesa.

16. Ter a mão pesada: castigar duramente, com severidade.

Pesar

(latim penso, - are, pesar, ponderar)

v. tr.

1. Determinar o peso de.

2. Tomar o peso a.

3. Sopesar.

4. Manifestar ou acusar o peso de.

5. Fig. Examinar com atenção e prudência; ponderar.

v. intr.

6. Ter gravidade ou peso.

7. Exercer pressão.

8. Ter estima ou valor.

9. Influir; atuar no ânimo (a razão ou motivo de alguma coisa).

10. Servir de encargo ou ônus.

11. Arrepender-se ou doer-se de alguma coisa.

12. Tornar-se incômodo.

v. pron.

13. Suspender-se, equilibrar-se no ar.

14. Fazer verificar o seu próprio peso.

15. Fig. Avaliar-se com imparcialidade.

16. Conhecer-se.

17. Meter a mão na consciência.

s. m.

18. Sentimento ou dor interior.

19. Mágoa, desgosto.

20. Arrependimento.

21. Remorso.

22. Em que pese a: ainda que lhe custe, mal grado seu.

23. O dinheiro pesa-lhe: diz-se de um pródigo que se apressa em gastá-lo.

24. Pesa ouro ou montes de ouro: diz-se de pessoa muito rica.

25. Pesar as palavras: falar com gravidade, pausada e refletidamente.

26. Pesar na balança: ter influência.

27. Pese(m) embora: apesar de, não obstante.

Pedra | s. f.

Pedra

s. f.

1. Substância dura e compacta que forma as rochas.

2. Fragmento de pedra.

3. Granizo.

4. Pedaço de uma substância sólida e dura.

5. Ardósia, quadro preto.

6. Peça de jogo de tabuleiro.

7. Joalh. Pedra preciosa.

8. Med. Cálculo, concreção.

9. Bot. Corpo duro que aparece no mesocarpo dos frutos.

10. Fig. Pessoa estúpida e incapaz de aprender.

11. Ant. Peso de oito arráteis.

12. Pedra de afiar ou pedra da lei: pedra de amolar.

13. Pedra de escândalo: motivo de escândalo.

14. Pedra de moinho: mó.

15. Pedra filosofal: segredo que a alquimia intentava descobrir para fazer ouro.

16. Fig. Coisa preciosa, mas impossível de achar.

17. Pedra fundamental: a que serve de fundamento, base.

18. Pedra preciosa: diamante, rubi, topázio, etc.

19. Pedra solta: pedras sobrepostas sem argamassa.

Indigesto | adj.

Indigesto

adj.

1. Que causa indigestão.

2. Difícil de digerir.

3. Fig. Enfadonho.

4. Desagradável.

5. Repugnante.

6. Desordenado, sem nexo.

Imastigável

Neologismo; adj.

Impossível de mastigar,

imponderável

Frase | s. f.

Frase

s. f.

1. Reunião de palavras que forma um sentido completo; locução; expressão.

2. Mús. Seguimento regular, ininterrupto, de canto, de harmonia, que forma um sentido.

3. Falar sem frases: dizer apenas o necessário.

4. Fazer frases: falar ou escrever em estilo empolado e quase sempre oco de sentido.

5. Frase feita: maneira de falar consagrada pelo uso.

Vivo | adj. | adv. | s. m. | s. m. pl.

1ª pess. sing. pres. ind. de viver

Vivo

adj.

1. Que vive.

2. Que tem muita vivacidade.

3. Animado, buliçoso.

4. Que concebe facilmente, penetrante.

5. Que representa com energia e naturalidade.

6. Ativo.

7. Brilhante.

8. Ardente, fervente; diligente, decidido.

9. Acalorado, enérgico, impetuoso.

10. Arrebatado.

11. Rápido, ligeiro, acelerado, apressado.

12. Presente, não esquecido.

13. Eficaz, ativo, forte.

14. Cortante, agudo, afiado.

adv.

15. Fortemente, com força.

s. m.

16. Pessoa viva.

17. A natureza ou os seus produtos.

18. Parte do organismo subjacente à pele.

19. Fig. O que há de mais íntimo; o âmago; o que mais dói ou mais se estima.

20. A força, o auge, o ponto mais importante.

21. Tira de fazenda, ou debrum, que serve para guarnecer artigos de vestuário.

Vivos

s. m. pl.

22. Beira Trás-os-M. Animais domésticos.

23. Hip. Vívula.

24. Água viva: água corrente.

25. À viva força: violentamente, pela força.

26. Cal viva: cal anidra ou virgem, cal não apagada.

27. Carne viva: qualquer parte do corpo quando está desnudada da pele.

28. De viva voz: falando, não por escrito; não por intermédio de outrem, mas pessoalmente.

29. Fogo vivo: tiroteio renhido.

30. Língua viva: falada atualmente.

31. Natureza viva: os seres pertencentes ao reino vegetal e animal.

32. Quadro vivo: conjunto de pessoas agrupadas de maneira a representar uma cena ou um quadro conhecido.

Viver (ê)

v. intr.

1. Ter vida, existir.

2. Habitar.

3. Alimentar-se.

4. Proporcionar-se o alimento e o necessário para a vida.

5. Passar a vida de tal ou tal maneira.

6. Conduzir-se, portar-se, proceder.

7. Conviver, entreter relações.

8. Conservar-se, durar, passar aos vindouros.

9. Gozar a vida; aproveitar-se da vida; tirar vantagem de tudo.

10. Passar toda ou a maior parte da existência em; não poder existir fora de.

v. tr.

11. Passar (a vida), existir.

s. m.

12. A vida; procedimento, comportamento.

Leitura | s. f.

Leitura

s. f.

1. O que se lê.

2. Arte ou ato de ler.

3. Conhecimentos adquiridos com a leitura.

Fluviante e flutual

Neologismo partindo de fluvial e flutuante

Flutuação própria de rio;

Considera a densidade e a saturação da água dos rios.

Açula

3ª pess. sing. pres. ind. de açular

2ª pess. sing. imp. de açular

Açular

v. tr.

1. Incitar (o cão) a morder.

2. Fig. Excitar.

Isca | s. f. | interj.

Isca

s. f.

1. Engodo do anzol.

2. Substância a que se comunica o fogo das faíscas do fuzil.

3. Tira de fígado frito.

4. Pop. Lasca de bacalhau.

5. Fig. Pequeno bocado; engodo; atrativo.

interj.

6. Bras. Voz com que se estimulam os cães.

Pesquisa efetuada no Dicionário Priberam on line e confrontada com o Dicionário Aurélio. Colhi do texto os termos que contém uma expressividade relevante e permita uma maior variedade de leituras conforme sua aplicação corrente.

É importante reler o texto e buscar dentre as opções postas, todas as possíveis mensagens do seu autor. As opções podem ser ocasionais ou expressivas, faz relação direta com a dinâmica da construção do texto.

A infra estrutura do texto começa a ficar exposta.

O passo seguinte é a prospecção das figuras de palavras e de pensamento, que será considerada conjuntamente com elementos da pauta rítmica buscando agregar elementos que funcionam conjuntamente.

Convém colocar que este é um metapoema, um texto que aborda questões sobre textos, desta forma ele necessita de uma análise integrada, onde seus dados são analisados e relacionados buscando um encadeamento claro entre elementos e propostas.

Nota-se um uso objetivo de oxítonas e paroxítonas na seleção vocabular; interligadas por monossílabos conferindo uma estrutura harmoniosa e cerebral. A construção desta cadencia estabelece uma estrutura rítmica na qual o poema se desenvolverá. As aliterações e assonâncias sustentarão o ritmo do poema em todo seu curso.

Exemplos: Aliteração em /g/: “joga-se os grão na água do alguidar”, (v.2); em /p/: “pois para catar esse feijão soprar nele”(v.7).

A aliteração ocorre praticamente em todos os versos, muitas vezes de mais de um consoante. Exemplo: “obstrui a leitura fluviante, flutual”(v.14) em que /t/ e o encontro consonantal /fl/ surgem, fonossemanticamente, perfeitamente empregados.

Quanto à assonância presente no poema, exemplificá-la, seria citá-lo inteiro. A incidência das vogais /i/ e /u/ no verso acima (v.14) é um bom exemplo. Dois outros mais com vogais /o/ e /a: “e depois joga-se fora o que boiar”, (v.6) e “e jogar fora o leve e oco, palha e eco”. (v.8)

Além desses elementos, tem papel fundamental, não apenas, mas também, para a realização rítmica do poema, a reiteração de palavras e expressões. Outro aspecto esse que perpassa por todo o poema. Note-se, por exemplo, a grande freqüência dos verbos que “catar”, “jogar” e dos substantivos “feijão”, “grãos” e “palavras”. Que além de realizarem importante papel no nível semântico, através da reiteração acrescem ao ritmo do poema.

Analisar a pauta rítmica de um poema as vezes nos coloca diante de tônicas e átonas, é necessário considerar um elemento importante e nem sempre destacado nas análises: a pausa.

Considerando a forma da elaboração do ritmo no poema, e considerando a pontuação aplicada, além da disposição dos versos, teremos um curso de leitura orientado pelo autor.

As pausas, sejam por pontuação, ou pela construção dos pés, constituem a fluência da leitura e a unidade da relação das idéias. Especialmente no nosso modelo, a aplicação de uma abordagem lógico-argumentativa que situa o leitor diante da reflexão do autor.

A pausa permite o lapso para o encadeamento das imagens que o texto comunica; seja um verso como parcela de uma impressão contida numa estrofe, ainda, seja um fragmento produzido por elisão ou zeugma, impõe uma necessária interação mental, proposta pelo autor, que a pausa permite assimilar sem atropelos no tempo do poema.

Sirvam de exemplo: a elisão de água em: “e (água) as palavras na da folha de papel;” v.3; e a intrincada construção com versos 5, 6 e 7: “Acertos, toda a palavra boiará no papel. Água congelada (que é água congelada), por chumbo seu verbo (por ser de chumbo o seu verbo); / pois para catar esse feijão, soprar nele (é necessário soprar nele)”.

O poema vai sendo desvendado à partir da exposição dos seus esteios, e torna evidente a proposta do autor.

Quanto às estrofes é necessário um breve comentário antes de adentrar na análise.

Ele utiliza a oitava lírica que é a construção mais próxima da oitava heróica, que se utilizou Camões na composição d’Os Lusíadas*. Esta opção acrescenta valor à proposta do autor ao incluir tal forma no seu poema, e possibilitar uma comparação entre elas num espaço-tempo diferente.

Outra referencia sobre este tipo de estrofe é a glosa, uma composição típica de repentistas e muito freqüente no nordeste brasileiro. Este poema faz parte de um conjunto que fazia uma relação entre Espanha e Nordeste, a referencia das ocorrências comuns em formas praticadas no nordeste, incluindo a forma de “escolher” feijões, reitera os propósitos do autor.

Na primeira parte o poeta descreve o que se pode denominar de habitual, comum num ato de catar feijão: a limpa, isto é, “jogar fora o leve e oco, palha e eco” (v.8) que é a sobra, a sujeira – o “eco”, pois o bom do feijão fica no fundo.

Ocorre, porém, que já desde aí o poema conotativamente inicia seu jogo poético. A começar pelo título: “Catar feijão”. Nada mais despistador. Na verdade, ao término de sua leitura, sabe-se que lhe interessa mesmo é o “catar” palavras. E nessa linha do despiste, o primeiro verso enuncia que “catar feijão se limita com escrever:” (v.1), quando quer mesmo a idéia de que escrever se limita com catar feijão.

O jogo através do símile se faz o inverso, toma-se o real comparado na condição de comparante. A composição começa por demonstrar assim que ela toma-se a si mesma como modelo desse catar feijão em que “a pedra ‘da à frase seu grão mais vivo:/ obstrui a leitura fluviante, flutual, /açula a atenção, isca-a com o risco”.

Esta primeira estrofe resulta da superposição de dois quartetos em que dois aspectos são tratados em cada uma de suas partes. O primeiro quarteto apresenta os elementos da comparação para o ato de “catar”, onde escolher palavras e separar a sujeira e o que é impróprio entre os grãos.

Na segunda parte, a segunda estrofe, o poema expõe uma das conseqüências ou um dos resultados possíveis desse ato de catar feijão; o risco que se corre, pois pode ficar no fundo algo que, como o feijão, não bóia e que, estranho, é um perigo: “um grão qualquer, pedra ou indigesto, /um grão imastigável, de quebrar dente” (v.11 e 12).

Isto para esse real catar feijão na água do alguidar. Entretanto para catar palavra o efeito é outro bem contrário: “a pedra dá à frase seu grão mais vivo:” (v.14). Como se verifica, o processo composicional estabelecido se mantém. Apenas que desta feita a implícita comparação se dá de forma direta.

A pedra para o “catar palavra” não é indigesta, mas sim renovadora. Melhor dizendo, o indigesto em “catar palavras”, qual seja o que rompe o tradicional (o habitual) não causa problemas, ao contrário, instaura o novo, criativamente considerado, “a pedra dá à frase seu grão mais vivo: / obstrui a leitura fluviante, flutual.” (v.14 e 15).

Ainda nesta estrofe segue a estrutura de dois quartetos com seus referenciais se complementando. O primeiro quarteto estabelece o estranho como impuro que corrompe a essência do feijão, seja pedra ou um grão oco. No segundo quarteto ainda dentro desta mesma imagem os últimos três versos concluem magistralmente o poema ao afirmar que o estranho, o novo “dá a frase o seu grão mais vivo”; interrompe as leituras tediosas “obstrui a leitura fluviante, fluvial,”, e exclama à excitação e convida ao risco,” açula a atenção, isca-a com o risco.”

Há outras referencias a serem discutidas com relação às opções feitas pelo poeta, devido à gênese do texto, um metapoema, a compreensão dos elementos fica mais evidente quando apresentadas com os recursos empregados e a finalidade de tal elemento. Foi interessante comparar as oitavas de Lusíadas com a proposta do poeta, trouxe clareza para a opção desta forma.

ps. *Os Lusíadas contém em sua composição decassilábicos heróicos e sáficos.

A sonoridade do poema e a força dele estão gravadas nos seus núcleos semânticos; neste texto especificamente o autor pretende o deslocamento mediante a comparação alternada e difusa destas duas práticas, a pauta rítmica está limitada as aliterações, assonâncias e pausas de tal forma que não crie uma musicalidade acima da dimensão do texto.

A proposição lógico-argumentativo exige um tempo reflexivo para a captura do “que deveria suceder”, conforme o poeta argumenta; a precisão de versos mais áridos, com vias mais estreitas, acomodam melhor as pretensões do poeta.

Esta consideração vai atravessar todo o poema com um propósito didático de reiteração.

Quanto às rimas, a polêmica; considero, particularmente, que o modelo de abordagem para o tratamento das homofonias totais e parciais, atualmente não comportam os elementos mais objetivos para pontuar as diversas e complexas relações sobre o tema.

A lingüística dispõe de modelos que ampliam de maneira relevante as observações, os movimentos trovadores no Brasil já avançam neste sentido. Não poderia ser de outra forma, as dimensões do país, sua diversidade, a variedade de expressões livres da língua alterando até mesmo a classificação de algumas palavras admitindo dupla acentuação, a silabada.

Para desvendar os diversos caminhos que este texto propõe não bastará teoria literária, o poeta exige tino e intuição...

CATAR FEIJÂO

1.

Catar feijão se limita com escrever:

joga-se os grãos na água do alguidar

e as palavras na da folha de papel;

e depois, joga-se fora o que boiar.

Certo, toda palavra boiará no papel,

água congelada, por chumbo seu verbo:

pois para catar feijão, soprar nele,

e jogar fora o leve e oco, palha e eco.

2.

Ora, nesse catar feijão, entra um risco:

o de entre os grãos pesados entre

um grão qualquer, pedra ou indigesto,

um grão imastigável, de quebrar dente.

Certo não, quanto ao catar palavras:

a pedra dá à frase seu grão mais vivo:

obstrui a leitura fluviante, flutual,

açula a atenção, isca-a com o risco.

João Cabral de Melo Neto.

É uma sugestão de leitura dentre tantas possíveis e serve para constatar que o texto poético projeta-se para além da linha denotativa e busca no leitor um referencial individual

Gostaria de acrescentar um breve comentário sobre a definição de estrofes. O poema é comunicação conotativa e denotativa, as estrofes subdividem o tema estabelecendo um curso denotativo para o conteúdo relacionado, o verso é a unidade expressiva que a constitui.

A ordenação das estrofes segue um curso, detém um propósito que deve cumprir-se ao último verso da última estrofe.

Aplicando esta conceituação notamos claramente que o primeiro quarteto da primeira estrofe, apesar das conotações diretas, é claramente denotativo. Explico: estabelece objetivamente, descrevendo a atividade de catar feijões com alusões diretas a seleção de palavras para compor o poema.

A separação de grãos ruins é denotativa, comunicação direta então, a comparação com a seleção de palavras e a conexão com a aplicação dos recursos estilísticos é conotativa. Porém, a primeira estrofe segue um propósito de estabelecer uma imagem que será questionada pela segunda parte do poema.

A “escolha” de grãos e a tarefa de catar feijões são a “base” de onde as comparações são extraídas, esta é a principal evidencia nesta oitava. Nesta etapa o Logus se dá por semelhanças.

As figuras aplicadas nesta etapa do poema são utilizadas para estabelecer as relações comuns entre as duas práticas.

A segunda estrofe aborda os percalços, as dificuldades das duas atividades; quando as diferenças estabelecem as relações entre as unidades trabalhadas pelo poeta.

O poeta reconhece os “riscos” das duas atividades e começa a estabelecer as diferenças; se na primeira parte a comparação se relacionava pela proximidade, nesta segunda oitava ela é claramente construída sobre as distancias e diferenças.

O limite extremo é a oposição, construída em suas duas subdivisões; o primeiro quarteto trata o risco do “grão imastigável” e mesmo “a pedra” e no segundo quarteto ele catalisa no corpo estranho “o grão mais vivo” que interrompe uma leitura fácil, fustiga “açula a atenção” e premia a leitura “isca-a com o risco”.

Assim o poeta cumpriu sua tarefa dentro da forma proposta, comunicou dentro de um nível que apenas a poesia comporta, com precisão extremamente sofisticada, caracterizou o labor poético numa comparação em dois movimentos, semelhanças e diferenças, buscando apontar para diletantes da poesia, como se cumpre as escolhas do poeta.

O que está posto no poema é substancial, pede uma reflexão em relação ao período que foi publicado, e questiona a cena literária e suas influencias.

A crítica da época sentia ainda o torpor da onda modernista e confundia-se na vertigem das inúmeras novidades presentes na cena literária mundial. Havia uma onda concreta ganhando força no mundo inteiro, mas o tino do poeta intuía o esvaziamento desta proposta.

Feijão é grão, é palavra; a base da nossa dieta “cultural” em toda sua diversidade de cor, em cada região dos pais. A palavra é grão, alimenta e sustenta nossas realizações.

O grão nos torna possível, a palavra nos torna real; e na diversidade de grãos e palavras, o poeta nos dá a sua maior lição: os grãos imastigáveis ou pedras, talvez seja o seu grão mais vivo, ou seja, o abstrato, o silencio e as livres aplicações sintáticas e semânticas, “comunicam”, uma observação de um homem de inteligência e disciplina impar, mesmo quando a cena se apresentava sem curso.

Ao relacionar o que bóia e o que vai ao fundo Cabral atenta para a superfície do texto e a sua estrutura profunda, evidenciando, ao menos, duas dimensões no poema. Propõe uma discussão de forma, conteúdo, escola e época.

Esta é uma questão marcante no poema, tem uma presença tão evidente, que deve ser relacionada ao registro da prática literária no período em que este livro foi lançado. Era uma época de efervescência e volatilidade, uma moda sucedia a outra e a corrente sucedida deixava poucos vestígios.

Cabral quando trata do “fundo” do poema, aborda a motivação do poeta, comunicar de forma direta e deixar lacunas para que o leitor se reconheça no curso da leitura. O fundo do alguidar detém os bons grãos e também a pedra, nas raízes profundas do poema captura-se a motivação do autor; que se estende até uma relação bilateral entre culturas colonizadas, submetidas a uma influencia “metropolitana”.

Os grãos bons justificam o poema, porém a pedra excede, se na “escolha” ela é a sujeira, no poema ela é o estranho, que interrompe a leitura vaga, o elemento que muda o curso da leitura e transforma o denotativo em conotativo.

Exemplo: a palavra “chumbo” na primeira estrofe, inicialmente provoca estranhamento, até que haja um arranjo mental que acomode conotativamente a palavra no curso da leitura, aí se dá a transição comparante e comparado.

O que bóia, dentro desta perspectiva, são a palha e o grão oco; são os elementos cuja densidade não os prende a raiz do texto. Embora façam parte do poema, são referenciais denotativos, não proporcionam as flexões que a poesia necessita.

As palavras palha, oco e eco representam ao mesmo tempo corpos estranhos no poema e dentre os grãos, que devem ser observado, pois são as imponderabilidades representativas no texto, o eco propõe reiteração e homofonia apontando para um estrato fônico tedioso, monocórdio.

O poema é grandioso, e ainda pertinente quanto à forma de tratar poesia, Cabral não dava crédito ao curso emocional, elaborava cada verso com todos os termos e efeitos devidamente pesados, é este escrúpulo que torna relevante o seu trabalho até os nossos dias, onde tantas outras modas se criaram e feneceram.

Aqui encerro a minha participação efetiva na análise deste texto, porém, caso haja alguma observação ou objeto a considerar, retorno para comentar na medida do meu relacionamento com a matéria.

Deixei de considerar a métrica, pois considero que este tema seria mais bem tratado por Recantistas que trabalham dentro de formas fixas da poesia clássica; igualmente considerei as lacunas e superficialidades em alguns aspectos como forma de integrar pela via das adesões e comentários.

Entendo que a retração inicialmente seja um obstáculo epistemológico que teremos que superar, porém reitero a minha intenção de partilhar minhas dúvidas, meus excessos em retribuição ao tanto que tenho recebido aqui.

Um agradecimento especialíssimo a Nilza Azzi, que de forma efetiva participa e estimula iniciativas deste porte. Ainda cabe destacar Alexandre Tambelli que sempre nos socorre apresentando vias quando ainda não havia um rumo determinado para seguir; Paulo Camelo que num post pequeno, deu um empurrão na minha preguiça.

Destaco de forma mais relevante o volume de leituras que o tópico conseguiu até o presente momento, e agradeço aos leitores.