SAC: O FIM DA ANARQUIA DAS PRESTADORAS DE SERVIÇOS?

GIOVANI CLARK, PROFESSOR DA PUC MINAS E DIRETOR-PRESIDENTE DA FBDE

TAMIRES CRISTINA DA SILVA, MEMBRO E PESQUISADORA DA FBDE

Os brasileiros conquistaram, no ano de 2008, uma importante vitória em face dos excessos cometidos pelas empresas de prestação de serviços regulados pelo governo federal. Ou melhor, o Estado veio coibir as ilegalidades e evidenciar a incompetência de algumas empresas no mercado.

Conhecido, popularmente, como “Lei do Call Center”, o Decreto nº 6.523/2008, vigente desde 1º de dezembro do ano passado, regulamenta o Código de Defesa do Consumidor, com vistas a fixar normas gerais sobre o Serviço de Atendimento ao Consumidor (SAC) das empresas de telefonia, transporte aéreo, energia, planos de saúde, bancos, TV paga, seguros, etc.

O SAC é uma unidade central de recebimento de chamadas telefônicas, distribuídas, automaticamente, entre seus operadores, gravadas e registradas em banco de dados da empresa por meio de um sistema de monitoramento eletrônico. O objetivo primeiro desse sistema deveria ser, repita-se, deveria ser o conhecimento das demandas dos usuários e solucioná-las imediatamente.

Justamente nesse ponto, a solução das demandas, é que o setor privado explicita suas constantes práticas ilegais perante o consumidor. Antes da vigência do Decreto, o cidadão que telefonasse a um SAC, deparava-se com um enfadonho cardápio eletrônico que o afastava ou, mesmo, impedia-o de chegar à solução desejada, fosse para buscar informações, fazer reclamações ou requerer suspensão ou cancelamento de serviços adquiridos.

Os SAC’s, em regra, funcionam como estratégia publicitária dos prestadores de serviços para alimentar nos clientes( ou pretensos) a falsa idéia de liberdade contratual, tendo em vista que, após a celebração dos contratos, por vezes, os pactos só se desfazem via ação judicial, revelando uma afronta os princípios constitucionais de defesa do consumidor e dignidade humana.

A repressão a esses desmandos das empresas, possuidoras de lucros astronômicos, só foi possível após ato presidencial, já que as agências reguladoras, Procons e demais órgãos estatais eram complacentes com os abusos do poder econômico, sob o pretexto de insuficiência de recursos financeiros e humanos para a adequada aplicação da Lei.

O Decreto impõe, dentre outros comandos, que as ligações para os SAC’s sejam gratuitas; funcionem durante 24 horas por dia, todos os dias da semana; atendimento ágil e de qualidade; reclamações resolvidas em, até, 05 (cinco) dias úteis a contar daquelas e o cancelamento imediato do serviço. Alias, tais comandos são quase idênticos aos já existentes na legislação consumerista, diuturnamente violada pelo setor privado até então.

Agora, a mobilização social faz-se necessária (pressões populares, boicotes e ações judiciais), a fim de que o Decreto não se transforme, apenas, numa fantasia social, sem eficácia no mundo real. Somente o tempo poderá responder se será o fim da anarquia das prestadoras de serviços. Todavia, os resultados atuais não são nada animadores.

Obs. Artigo publicado no Jornal Hoje em Dia, Belo Horizonte, dia 27/03/2009, p. 05.