O policial precisa de mandado de busca e apreensão para entrar em residências quando tiver drogas dentro da casa?

Entendo que somente deveriam punir os "pequenos" se punissem com exemplo os "grandes".(Rodrigo Foureaux)

O policial precisa de mandado de busca e apreensão para entrar em residências quando tiver drogas dentro da casa?

A resposta é NÃO!

Renato Brasileiro ensina que “Em todos esses crimes permanentes, em relação aos quais a prisão em flagrante é possível a qualquer momento, enquanto não cessar a permanência, a Constituição Federal autoriza a violação ao domicílio mesmo sem prévia autorização judicial (art. 5, inc. XI)”

E ainda relata que “Em se cuidando de tráfico ilícito de entorpecentes, delito de natureza permanente em algumas de suas modalidades (v.g., guardar, manter em depósito etc.), protrai o estado de flagrância, do que deriva a desnecessidade de mandado judicial em caso de flagrante delito.”

Cuidando-se de crime de natureza permanente, a prisão do traficante, em sua residência, durante o período noturno, não constitui prova ilícita, sendo desnecessário prévio mandado de busca e apreensão. (STF, HC 84772/MG)

Todavia, há entendimento de que “a garantia constitucional de inviolabilidade de domicílio está acima da prisão em flagrante. Isso porque a invasão da casa sem mandado vicia toda a ação dos policiais, contaminando também a prova. No caso, a prova passa a ser considerada ilícita segundo o ordenamento jurídico vigente.” (1)

No Distrito Federal, policiais receberam denúncia anônima de que determinada pessoa era traficante, e montaram uma campana para abordá-lo e tentar prendê-lo em flagrante.Todavia, quando da abordagem não havia drogas com o suspeito, e os policiais resolveram ingressar na casa da sogra do suspeito para dar buscas, sem mandado, sendo ali encontrada certa quantidade de droga.

Os desembargadores do TJDFT relataram que “Não há dúvida de que o tráfico de entorpecente se trata de crime permanente. No entanto, a colheita de prova acerca de sua ocorrência fica subordinada aos preceitos constitucionais que assegura, como regra, a inviolabilidade do domicílio”. (1)

Com a devida vênia, discordamos em muito da referida decisão. O direito não cria garantias para a salvaguarda de práticas ilícitas. O STF e STJ são pacíficos que o policial pode (deve) entrar em residências quando estiver ocorrendo crime permanente.

Suponhamos que fosse exigido, na situação supra, mandado de busca e apreensão, o tempo que a Polícia demoraria para conseguir o mandado poderia frustrar toda a diligências, uma vez que a droga certamente “escorreria pelo ralo.”

Pensamos que as decisões que devem prevalecer são as do STF e STJ, ainda que se entenda de forma diversa.

Dessa forma, é perfeitamente possível entrar em residências quando estiver ocorrendo crime permanente, como o tráfico de drogas em algumas de suas modalidades; seqüestro e cárcere privado; extorsão mediante sequestro, etc.

O complicado é quando o policial entra na “sorte”, fica dependendo de encontrar material ilícito, para a caracterização do crime permanente.

Na prática verifica-se que se for “pobre” pode ser que entre na residência na “sorte”; se for “rico”, dificilmente entrará na “sorte”.Estranho é que a lei é para o “rico” e para o “pobre”, logo não cabe interpretações diferenciadas. Ora, no "barraco mete o pé", na "mansão pede licença". No "barraco" é sem mandado, na mansão é com mandado. Que injustiça!

Como diz a Constituição “TODOS são iguais perante a lei...” Então porque entrar só na casa de alguns pobres?Será que na de alguns ricos não há drogas? Cremos que a resposta talvez seja a possibilidade de “impunidade”, que na casa do pobre, caso não haja nenhum ilícito, sem dúvidas, será muito maior.

Talvez haja essa diferenciação nesses casos, não em decorrência da condição socioeconômica, mas da própria falta de conhecimento, do desinteresse e comodidade em não representar contra aqueles que entraram de forma ilegal na residência.Além do receio de sofrer represálias.

É sempre bom ter provas, quando o adentramento na residência se der de forma autorizada pelos moradores, seja assinando um "termo de autorização" ou principalmente gravando.

Um dos alimentos do crime se chama impunidade, o que no Brasil não é nada incomum, principalmente se o réu for de família abastada, ou detiver influência política. Será que é porque contratam bons advogados ou porque são coisas do Brasil ...?

Nosso sistema deve ser garantista sim, sob pena de inobservar direitos e garantias individuais na imposição de penas privativas de liberdade, o que deve ser rechaçado por nossos tribunais. O problema é quando o modelo garantista do jurista italiano Luigi Ferrajoli, aplicado no Brasil, se torna um verdadeiro garantismo à brasileira.

Segue abaixo julgados relacionados ao assunto debatido:

EMENTA: TRÁFICO DE ENTORPECENTES. PRISÃO EM FLAGRANTE. PROVA ILÍCITA. 1. Cuidando-se de crime de natureza permanente, a prisão do traficante, em sua residência, durante o período noturno, não constitui prova ilícita. Desnecessidade de prévio mandado de busca e apreensão. 2. HC indeferido. (STF, HC 84772/MG, HABEAS CORPUS, Relatora: Ministra ELLEN GRACIE, Julgamento: 19/10/2004, Órgão Julgador: Segunda Turma, Publicação: DJ 12-11-2004 PP-00041 EMENT VOL-02172-02 PP-00336 RT v. 94, nº 832, 2005, p. 474-476).

CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS-CORPUS. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. CRIME PERMANENTE. FLAGRANTE. BUSCA E APREENSÃO. - Tratando-se de tráfico de entorpecentes, na modalidade "ter em depósito", delito de natureza permanente, no qual a consumação se prolonga no tempo e, conseqüentemente, persiste o estado de flagrância, admite-se, ainda que em período noturno, o ingresso da Polícia na casa em que está sendo praticado tal crime, com a conseqüente prisão dos agentes do delito e apreensão do material relativo à prática criminosa. - Habeas-corpus denegado.(STJ HC 21392 MG 2002/0035264-4, Relator: Ministro VICENTE LEAL, Data de Julgamento: 21/10/2002, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJ 18.11.2002 p. 296)

CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS-CORPUS. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. CRIME PERMANENTE. FLAGRANTE. BUSCA E APREENSÃO. - Tratando-se de tráfico de entorpecentes, na modalidade "ter em depósito", delito de natureza permanente, no qual a consumação se prolonga no tempo e, conseqüentemente, persiste o estado de flagrância, admite-se, ainda que em período noturno, o ingresso da Polícia na casa em que está sendo praticado tal crime, com a conseqüente prisão dos agentes do delito e apreensão do material relativo à prática criminosa. - Habeas-corpus denegado. (STH HC 21392 MG 2002/0035264-4, Relator: Ministro VICENTE LEAL, Data de Julgamento: 21/10/2002, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJ 18.11.2002 p. 296)

HABEAS CORPUS. DIREITO PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. SUPRESSÃO. EXCESSO DE PRAZO. INSTRUÇÃO CRIMINAL ENCERRADA. INVASÃO DE DOMICÍLIO. CRIME PERMANENTE. DESNECESSIDADE DE MANDADO DE BUSCA E APREENSÃO. CONSTRANGIMENTO INCARACTERIZADO.1. Não se conhece de pedido de habeas corpus, quando as matérias objeto da impetração não se constituíram em decisão da Corte de Justiça Estadual, pena de supressão de um dos graus de jurisdição (Constituição Federal, artigo 105, inciso I, alínea c).Constituição Federal105Ic2. "Encerrada a instrução criminal, fica superada a alegação de constrangimento por excesso de prazo." (Súmula do STJ, Enunciado nº 52).3. A Constituição Federal, assegurando a inviolabilidade do domicílio (artigo 5º, inciso XI), não o faz de modo absoluto, inserindo, no rol das exceções à garantia, o caso de flagrante delito.Constituição Federal4. Em se cuidando de tráfico ilícito de entorpecentes, delito de natureza permanente, protrai o estado de flagrância, a conseqüencializar a desnecessidade de mandado judicial em caso de flagrante delito.5. Ordem conhecida, em parte, e denegada, julgando prejudicada a alegação de excesso de prazo. (STJ HC 40056 SP 2004/0171301-0, Relator: Ministro HAMILTON CARVALHIDO, Data de Julgamento: 30/06/2005, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJ 05/09/2005 p. 493)

(1) http://www.conjur.com.br/2004-set-27/justica_considera_prova_ilicita_absolver_acusado