A LEI 12.587 DE 2012 PÕE O TRANSPORTE PÚBLICO DE SÃO PAULO EM XEQUE.

A Lei 12.587 de 2012 põe transporte público de São Paulo em xeque.

Todos os dias o cidadão paulistano lida com a vida de forma cansativa, enfadonha e corajosa. Não obstante o próprio obstáculo natural de sua concepção humana e social enfrenta outros que vão nascendo em seu caminho. De fato que a evolução da cidade de São Paulo foi deveras estarrecedora. Um big bang de população com o êxodo claustrofóbico dos estados nordestinos e norte, a priori, mas em seguida acompanhada pelo alcance de italianos, persas, judeus e afins.

É lógico que não podemos culpar o ente estatal por tanto, mas agora, adentrando à presente crítica que, busca mais proteger por meio de uma crítica social-política do que plenamente jurídica, para o enfrentar o tamanho caos na sociedade paulistana veio a União, o Estado e a Prefeitura criando leis atrás de leis para vencer o trânsito, a aglomeração, bem como diversos outros problemas relacionados a má-estrutura urbana, por exemplo, como a clandestinidade de venda de produtos ilegais e violação da tributação.

Nesse sentido, podemos dar como exemplo às dores de cabeça que os paulistanos, na ultima semana de 05/03/2012 à 16/03/2012, sofreram, onde os mesmos tiveram o abastecimento de combustível reduzido. Porém, o pináculo do presente trabalho é expor a nova lei da União (Lei 12.587/2012) que procedeu com a obrigação dos Municípios de adequarem-se as suas novas regras, inclusive, dando-lhes a competência de se instituir o pedágio municipal sobre os veículos automotores de seus cidadãos. Saibamos que o intento é consideravelmente complicado por diversas questões, mas acima de todas, pelo intento de se fazer com que a população migre para o transporte público que, no fim, é uma verdadeira violação dos direitos dos cidadãos desta cidade que tem tudo para ser a melhor do mundo (tendo em vista sermos, atualmente, a quinta economia do planeta), mas que em função de falta de estrutura causa muitos problemas aos legisladores, aos administradores e ao judiciário por desnecessidade, quando tudo poderia ser resolvido com atitude e investimento.

O transporte público de São Paulo, histórico em problemas e caos aos cidadãos, faz-se pensar, por exemplo, no seguinte:

“Promotoria da justiça de defesa da Cidadania de São Paulo, por outro lado, em 1996, ajuizou ação civil pública da CPTM – Companhia Paulista de Trens Metropolitanos devido aos péssimos e perigos serviços prestados por suas composições. Assim, em decorrência de atrasos crônicos de trens, sua superlotação provocando o fenômeno dos pingentes e ‘surfistas’ sobre seus tetos e, consequentemente, vários acidentes fatais, propôs-se demanda visando à melhoria daqueles serviços. Além disso, e como a liminar pedida não foi concedida pelo juízo competente, no sentido de impor-se multa diária ao poder concedente, as irregularidades continuaram, levando os usuários-consumidores, revoltados, a incendiarem diversas composições. Como resultado disso, foi interrompido o trafego para varias regiões da Grande São Paulo, propiciando, desta feita, à Promotoria de Justiça do Consumidor da Capital o ajuizamento de outra ação coletiva, agora visando à exigência de subsídios da parte do poder Público com relação ao que a população vem gastando com lotações e outras formas alternativas palas quais deve deslocar-se de suas moradias para os locais de trabalho”. (Código de Defesa do Consumidor – Comentado pelos autores do anteprojeto/ADA PELLEGRINI. – Interpretação de JOSÉ GERALDO BRITO FILOMENO – Nota 8 dos artigos. 4º e 5º do CDC - 7ª Ed. – Rio de Janeiro – Editora Forense Universitária. 2001.)

Certa feita (com recalcada dose de ironia) lembrar-nos-emos das leis da física ensinada no ensino médio, e, deste modo, perceber que o caro senhor Isaac Newton estava equivocado ao dizer que “dois corpos não ocupam o mesmo espaço ao mesmo tempo”. Dissera isso o referido autor e físico-matemático por não ter um dia sequer usufruído do transporte público paulistano.

Inicialmente, é lógico que o ente estatal há de conjurar para a sua defesa que a sua prestação está adequada ao principio da eficiência alegando que “o sentido de eficiência remete ao resultado: é eficiente aquilo que funciona” (RIZZATO. Nunes. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. 5ª Ed. Editora Saraiva – São Paulo – 2010.). Mas se apoiarmos isso, poderíamos levar os cidadãos em bagageiros, porta-malas e seus afins. De fato, que eficiência analisada exclusivamente fará com que se pense que está tudo nos devidos lugares. Todavia, a norma do CDC advém da Lei Maior desde sua essência, bem como sua forma, e nisso, haver-se-á a necessidade de trazer ao mesmo os institutos pleiteados e protegidos pela Carta Magna, a saber, o supra principio – O Principio da Dignidade da Pessoa Humana.

O artigo 1º, III da Constituição Nacional atribuiu aos seus cidadãos perpetua benesse da dignidade que é bem jurídico inalienável, imprescritível e de proteção peremptória por todos. Porém, é certa a incógnita de o que é e quando se pode dizer que houve ou há, tanto um sentido jurídico de referido principio, bem como, quando se pode entender que o mesmo fora violado? De majestoso entendimento expôs assim que “é difícil a fixação semântica do sentido de dignidade, isso não implica que ela possa ser violada, como dito, ela é a primeira garantia das pessoas e a ultima instancia de guarida dos direitos fundamentais. Ainda que não seja definida, é visível sua violação quando ocorre.” (RIZZATO. Nunes. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. 5ª Ed. Editora Saraiva – São Paulo – 2010.).

Portanto, ainda que o serviço seja eficiente, se se ofende o principio da dignidade da pessoa humana, deverá, responder por sua violação, cessando-o ou no mais, indenizando o consumidor agredido. Como exemplo, podemos conjurar um fato hipotético da seguinte maneira: “X” é consumidor de “Y” que lhe fornece abastecimento de água (serviço essencial, tal como o transporte público), de maneira adequada, contínua, segura e eficiente. Entretanto, certa feita “Y” se equivoca com seu banco de dados e crê que “X” esteja em débito consigo, inobstante, “X” que desconhece da dívida, tendo em vista sua inexistência, vai até uma loja de automóveis para adquirir um para si e depara-se com a impossibilidade de financiá-lo por ter seu nome na lista de inadimplentes da praça mercantil, ou seja, o comum chamado “nome sujo”. Por conseguinte, tem sua honra violada, levando-se o vinculo notório a sua dignidade, nascendo, por isso, a “Y” a obrigação de primeiro: cessar o dano retirando o nome do consumidor “X” da lista de inadimplentes e; segundo: indenizar.

O mesmo, no uso de analogia, pode-se trazer ao transporte público paulistano que enclausura seus consumidores e cidadãos como “sardinhas” em seus coletivos, levando-os ao constrangimento diante da sociedade em função de tamanha e delicada situação que o consumidor não tem a possibilidade de reverter, bem como, certas ocasiões leva-os ao constrangimento, inclusive, de cunho sexual, aglomerando homens e mulheres de todos os tipos e ideologias diversas, de maneira inadequada dentro do coletivo. No que tange a impossibilidade de reverter à situação, é bem aí que nos deparamos, por exemplo, com o portentoso trânsito paulistano. No dia a dia, pessoas que se dedicam a melhorar de vida vão à conquista de seus ideais, sonhos e posses, e, quando adquiridas, e logicamente, tem a possibilidade de adquirir um automóvel, assim ao fazem para escapar da vexatória situação do transporte coletivo, só que daqui para frente, enfrentarão mais uma tributação (como se não fosse suficiente as já existentes) em virtude disso.

Nisso, ainda podemos nos lembrar do salário mínimo nacional que alcançou no presente ano o valor de R$ 622,00 (seiscentos e vinte e dois reais) que, de acordo com sua interpretação teleológica e gramatical do artigo 7º, IV da Constituição Federal, deve, portanto, atender todas as necessidades do trabalhador e de sua família como moradia, alimento, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, previdência social e lógico o transporte. Porém, pense da seguinte maneira, agora na figura do consumidor paulistano e o referido artigo Constitucional: O consumidor que dispõe de R$ 3,00 (três reais) por passagem, ou seja, no mínimo R$ 6,00 (seis reais) por dia, que trabalhando seis dias por semana gastará R$ 36,00 (trinta e seis reais) por semana e nesse seguimento a quantia de R$ 144,00 (cento e quarenta e quatro reais) por mês, terá a possibilidade de ver cumprido na sua vida o instituto do artigo em menção? Jamais, tendo em vista, alçar mais de 20% (vinte por cento) do salário mínimo nacional, dando-nos por empirismo uma verdadeira enfermidade social para vivenciar.

Além da violação do principio da dignidade da pessoa humana e do artigo 7º, IV da CF, existem outros mais bem expostos nos artigos 37 da CF e no artigo 22 do CDC, que impõe ao prestador de serviço (nesse caso indiferentemente se é o ente estatal direta ou indiretamente, mas sim a sua responsabilidade) o dever de, excluindo desde já a eficiência já explanada, continuidade nos serviços essenciais, segurança e adequação.

Por adequação e segurança podemos trazer o seguinte entendimento:

“Partindo desse conceito, um produto ou serviço é defeituoso quando não corresponde à legitima expectativa do consumidor a respeito de sua utilização ou fruição, vale dizer, quando a desconformidade do produto ou serviço compromete a sua prestabilidade ou servibilidade. Nesta hipótese, podemos aludir a um vício ou defeito de adequação do produto ou serviço.

Por outro lado, um produto ou serviço é defeituoso, da mesma sorte, quando sua utilização ou fruição é capaz de adicionar riscos à segurança do consumidor ou terceiros. Nesta hipótese, podemos aludir a um vício ou defeito de segurança do produto ou serviço.”(Código de Defesa do Consumidor – Comentado pelos autores do anteprojeto/ADA PELLEGRINI. – Interpretação de JOSÉ GERALDO BRITO FILOMENO – Nota 2 do artigo11 do CDC - 7ª Ed. – Rio de Janeiro – Editora Forense Universitária. 2001.).

A adequação é bem discutível, porém, sobre a segurança não há o que se falar no histórico de lesões corporais, idosos acidentados, crianças machucadas e assim por diante. Infelizmente essa é a rotina do cidadão que trabalha, paga impostos e busca melhorar a vida própria e favorece com a contribuição de mais de um trilhão de reais. Na grande maioria as lesões são leves, como freadas bruscas dos motoristas da prestadora de serviço que recebem a missão “impossível” de cumprir determinados prazos e numero de viagens durante o dia, mas certas vezes os acidentes alçam maior contundência, de maneira fatal e irremediável.

De fato que hão de expurgar suas responsabilidades as autoridades públicas competentes sobre a tutela de funcionalidade, continuidade, adequação e eficiência, mas nenhum direito constitucional deve ser ignorado, razão pela qual devamos entender que “aqui também vale, assim como para a iniciativa privada, e aliás com muito mais razão porque se trata do serviço público, a assertiva que qualidade não é apenas a adequação do produto ou serviço às normas que regem sua fabricação ou prestação, mas também e principalmente a satisfação de seus destinatários, que tem sem sombra de duvida o direito subjetivo público de exigir o seu efetivo cumprimento com qualidade, presteza, segurança, adequação, pontualidade etc.” (Código de Defesa do Consumidor – Comentado pelos autores do anteprojeto/ADA PELLEGRINI. – Interpretação de JOSÉ GERALDO BRITO FILOMENO – Nota 8 dos artigos. 4º e 5º do CDC - 7ª Ed. – Rio de Janeiro – Editora Forense Universitária. 2001.).

De pronto, notória é a insatisfação com diversas manifestações, mesmo que aleatórias, como, por exemplo, pichações nos próprios coletivos (deixando claro que não apoiamos esses atos criminosos), contra essas exorbitantes agressões aos consumidores, cidadãos e detentores do poder constituinte (o poder emana do povo, art. 1º, Parágrafo único da CF), mas é justo que coloquemos nas mãos do poder público um pouco de fé, vez que a lei supra (Lei. 12.587 de 03 de janeiro de 2012) consiga mudar essa situação vergonhosa, que conforme o artigo 28 de seu texto entra em vigo em 100 (cem) dias após a data de sua publicação, e impôs aos entes da União (Municípios) a obrigação de se adequarem ao texto legal no prazo de 03 (três) anos sob pena de corte de verbas para a mobilidade urbana.

Contamos, todos nós cidadãos paulistanos, que a lei produza os efeitos além de sua publicação e se torne realidade, melhorando as condições desta cidade maravilhosa e fabulosa, antes que os consumidores, em função dos atrasos, das aglomerações desumanas e insegurança leve a maiores fatalidades, como no caso da CPTM e os seus “surfistas”. São Paulo merece o melhor e esperamos que tenha e que tanto os cidadãos, como o Ministério Público manifeste-se a ponto de mudar essa situação dando real efeito à lei, pois como exposto antes, uma lei meramente escrita (assim como a jurisprudência supra exposta sobre a Ação Civil Pública) sem a sanção devida não alçará voo maior do que uma pedra no vento. Coisa que por ausência de punição – por exemplo, multa diária – não alterou o estado dos cidadãos.

Nesse sentido:

“- Esqueceste-te novamente, meu amigo, que à lei não importa que uma classe qualquer da cidade passe excepcionalmente bem, mas procura que isso aconteça à totalidade dos cidadãos, harmonizando-os pela persuasão ou pela coação.” (PLATÃO. A República. São Paulo. Editora Martin Claret. 7ª Reimpressão. 2009. Tradução: Pietro Nassetti.).

E ainda mais:

“Com efeito, a lei é a ordem, e a boa lei deve ser necessariamente aquela que resulta em boa ordem.”(ARISTÓTELES. Política. São Paulo. Editora Martin Claret. 3ª Reimpressão. 2010. Tradução: Pedro Constantin Tolens.).

Pois:

“O direito dos mais miseráveis dos homens, o direito do mendigo, do escravo, do criminoso, não é menos sagrado, perante a justiça, que o mais alto dos poderes.”( BARBOSA. Rui. Oração aos moços. São Paulo. Editora Martin Claret. 2007.).

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Autor:

Estudante de Direito da Unip, Ygor Pierry Piemonte Ditão. Estagiário pela OAB/SP.