NO FÓRUM DE VILA VELHA EXISTEM POUCAS ALMAS

Nos autos do processo, existem vidas à contar. Vidas sofridas, de pessoas que procuram o Poder Judiciário para ter uma justa resposta para o seu problema. Existem mães que pedem pensão. Existem pais sem emprego, que não conseguem pagar as pensões. Pais que não dão amor. Filhos que não querem mais amor, pois desistiram de pedir. Alguns filhos, só querem um valor material, para preencher o vazio deixado pela falta de amor de um pai desnaturado.

Existem outras causas, quase todas com uma certa justiça para se alcançar, mais talvez nenhuma tão comovendo como as que envolvam uma família, principalmente uma criança.

Do outro lado do processo existem servidores, juízes, promotores, advogados públicos e privados. Alguns poucos preocupados com as pessoas, outros nem tanto, esperando apenas cada mês passar, para ter o seu salário no banco e o alívio de pagar as contas. Alguns servidores são fantasmas, outros são verdadeiros monstros, devoradores de alma. Para esses, não há vida nos papéis, por isso perdem os papeis e dizem para voltar amanhã. Afinal, é só mais um pedaço de papel.

No calor da cidade de Vila Velha é difícil acreditar que exista tanto frio dentro das pessoas. Dentro delas, é difícil acreditar que exista uma alma. Na rotina do dia-a-dia, o que sobra são caras amarradas, incapazes de dar uma boa tarde, de pedir desculpa pela demora, de fazer um esforço para subir um andar de escadas para levar uma petição ao cartório. Puta sacrifício!

Na falta de almas, o fórum fica frio, melancólico. De fora, não se sabe se ali é um lugar de fazer justiça ou um velório, onde cada pessoa, no decorrer do seu processo, morre aos poucos, angustiadas, insatisfeitas, impacientes, com sensações indescritíveis. Como podem essas pessoas que procuram a justiça serem injustiçadas?

No meio de tudo isso, existem os advogados, que mesmo com insistência, não conseguem que o processo termine em um prazo razoável e não podem garantir um resultado favorável, pois não são eles quem decidem. Alguns poucos, ainda acreditam em algo que chamam de justiça, outros procuram apenas o status social, por dentro de seus ternos, que são roupas incompatíveis com o clima. Mas no final, todos sofrem, em um ambiente frio que são os fóruns e os escritórios. Alguns simplesmente aprenderam a lidar com isso, outros se estressam todos os dias, outros já perderam a alma e para esses é bem mais fácil. Afinal, é bem mais fácil viver no meio dos iguais.

As 18:00 em ponto, a cortina dos cartórios se fecham, o espetáculo de horrores chega ao seu fim. Aliais, o horário de fechamento dos fóruns parece a única coisa pontual neste lugar. Cada pessoa, as com almas e as sem almas, seguem para o seu destino. As quem tem alma, sentem-se com o dever cumprindo e voltam felizes para a sua casa. As sem almas, esperam um outro dia, para roubarem mais almas, porque é assim que se alimentam os monstros: de almas alheias.