TROVAS


Se de lembrança se vive
na vida de não ser nada,
desse amor que nunca tive
sinto uma saudade danada!

A minh’ alma apaixonada,
da saudade prisioneira,
busca ouvir e escuta nada
dos sonhos da vida inteira.

Navego a velocidade
do vento em louca procela
nos mares dessa saudade,
marulhando o nome dela.

Falando coisas bonitas,
saudade se diz de paz.
E vai tramando vinditas
nas visitas que me faz.

Restou do amor a esperança,
da esperança uma saudade,
da saudade uma lembrança,
da lembrança uma vontade...

O sentido da saudade
pude agora perceber:
saudade é não ter vontade
da vontade de esquecer.

A mesma mesa de bar,
o mesmo copo de vinho...
Quando a saudade acabar,
nunca mais bebo sozinho!

À noite, quando adormeço,
e sonho não sei com quê,
vem a saudade e me esqueço
de me esquecer de você.

Na admissão da verdade
deixei de ser sonhador:
exonerei a saudade
demitindo-me do amor.

A saudade, em minha idade,
é uma saudade danada
pois tudo me dá saudade:
sou só saudade e mais nada!

O seu olhar, que maldade!,
de meu olhar se perdeu
e no mar mato a saudade
do verde que me esqueceu.

Fui entender a saudade,
depois que pensei bastante:
saudade é minha metade
quando está de mim distante.

Colada a mim, pela rua,
sombria sombra caminha.
Saudade tendo da tua,
nem parece ser a minha!

A lua, de nuvens nua,
cultua o céu à vontade
e clareia em nossa rua
os passeios da saudade. 

Amplidão dos extremados,
dos mares as fantasias
são portos ultrapassados
dos vates nas travessias.

A poesia me faz forte
quando me vem a desdita.
Ao sentir do amor a morte,
ela logo o ressuscita.

Sou poeta e pecador,
da matéria a criatura
que peca e morre de dor
porque tem a alma pura.

Vivendo sonhos sonhados,
compulsando alegorias,
aos amores figurados
oferto as minhas poesias.

Pelo amor que estou perdendo
e sinto perto do fim,
pouco a pouco vai morrendo
o poeta que há em mim.

Odir, de passagem
13.07.08