VASO QUEBRADO

Mudamos as peças

Mas remedar a lógica do tabuleiro

Dará ao jogo o mesmo

Destino.

Trocamos o sonho

Ocorre que acordar

E ter de acordar! – dá numa trabalheira

Danada.

Pensamos que somos

E ser, no tempo de estar – e ficar,

É como apedrejar o mar

Pra provocar

Onda.

Gastamos o passado

Provamos que a colônia é um atraso

Atravessamos o futuro

Vasamos o presente

Inteiro.

O alerta que fica

É o medo de tudo

O medo do que não podemos

O medo de termos pra sempre

Aquilo que temos.

O sol empina ao meio-dia

A lua desafina ao meio-dia

Qualquer um mira o meio-dia

Ninguém desperta o meio-dia

Não há dia inteiro ao meio-dia.

A quem interessa

O desabafo de alguém?

Terapeutas não nos ouvem integralmente

Sequer os gravadores de som:

– o mundo acabará em eco.

Tire o sofá da sala e cubra o chão com jornais.

Desabilite a geladeira, TV e computador.

Descasque a casca de tinta da pele da parede.

Descole a porta do batente e pendure cabides.

Faça bibelôs de meias, luvas, botões e copinhos.

Idolatre a imagem por fora do porta-retratos.

Jogue guache no espelho, muitas cores, sem sentido.

Mude, mude, mude.

E veremos que a forma até reforma,

Mas a estrutura é vaso novo.