Tombamento integral do PRÉDIO DA EX-FÁBRICA DE TECELAGEM JAPY em Jundiaí/SP

I – CONSIDERAÇÕES GERAIS:

1) A fase industrial de São Paulo no início da República, principalmente com a indústria têxtil, começou a mudar a economia do País. Assim diversas indústrias foram implantas no Estado de São Paulo, a partir da capital, sendo que Jundiaí teve diversas empresas inauguradas neste período. A Vila Arens foi palco dessa fase industrial devido ao seu local privilegiado próximo à Estação Ferroviária Santos-Jundiaí, que ligava a cidade tanto com Santos, como com a Cia. Paulista de Estradas de Ferro, que a ligavam com o interior paulista.

2) Ainda no período do império, foi inaugurada a Fábrica de Tecelagem São Bento, pelo Barão de Jundiaí, que foi visitada inclusive duas vezes pelo imperador D. Pedro II. O prédio, no entanto foi demolido em fevereiro de 2008, deixando uma marca profunda na memória patrimonial da cidade.

3) Por iniciativa do próprio Barão de Jundiaí e seu filho Conde do Parnaíba, foi facilitada a vinda de imigrantes europeus, principalmente italianos para ocuparem terras compradas no Núcleo Colonial Barão de Jundiaí, hoje Bairro da Colônia, e outros como o Traviu, Santa Clara e Jarinu. (1)

4) Durante os primeiros anos da República, diversos empreendimentos de indústrias têxteis foram feitos na Vila Arens,entre eles a Fábrica de Tecelagem Japy, Argos Industrial, a Fábrica Milani, entre outros. Entre estes, a Fábrica de Tecelagem Japy mantém suas características originais.

II – UM POUCO DA HISTÓRIA DA FÁBRICA DE TECELAGEM JAPY:

1) O prédio da ex- Fábrica de Tecelagem Japy, situada à Senador Antônio Lacerda Franco, Vila Arens, Jundiaí, por ter sido fundada em 1913, fazer parte da história da época industrial de Jundiaí e da História do País das décadas de 20 a 50, com uma área aproximada de 21 mil metros quadrados.

2) A referida fábrica, inicialmente iniciou fazendo sacos de estopa.

3) Passou a ser uma das fábricas de tecidos de Jundiaí, numa época de industrialização municipal, estadual e nacional.

4) O prédio de mais de 24 mil metros quadrados fazia parte de uma gleba de mais de 80 mil metros quadrados que iniciava na Estação Ferroviária, da São Paulo Railway Company, e ia até a Fábrica de Tecidos São Bento, conforme registro de matrícula nº 9.376- Livro 2- Registro Geral do 2º Cartório de Registro de Imóveis de Jundiaí.

5) A indústria FÁBRICA JAPY S/A foi fundada em 1914, pelo do Senador Antônio de Lacerda Franco, com sede na cidade de São Paulo,( transcrito sob o nº 5.438 em 13/11/1914), que a manteve funcionando até a década de 30, empregando homens e

mulheres, que vinham a pé para o trabalho, pois não havia transporte coletivo na ocasião.

6) Hoje a indústria localiza-se na Rua Lacerda Franco 77/175, e se estende até a Rua Barão do Rio Branco, Vila Arens, Jundiaí/SP.

7) Mais tarde, em 27/07/1948, a empresa foi adquirida pela empresa JJ. Abdalla S/A, um empreendedor que tinha outras empresas e uma grande influência econômica na região e no Estado de São Paulo, conforme registro 9.376 do 2º Cartório de Registro de Imóveis de Jundiaí.

8) Por muitos anos a empresa continuou como indústria de tecidos empregando muitos operários e operárias.

9) A empresa JJ. Abdalla S/A teve muito problemas devido à dívidas com a Receita Federal e com lutas na Justiça do Trabalho, movido por operários e operárias insatisfeitos com os salários pequenos e os atrasos do pagamento.

10) Consta na matrícula 9.376 de 27/11/1977 no 2º Cartório de Registro de Imóveis de Jundiaí, investigações sobre hipotecas , baseados no artigo 2º do Decreto-Lei nº 502 de 17/03/1969, averbações sobre documentos públicos e particulares envolvendo José João Abdalla, Antônio João Abdalla, Nicolau João Abdalla, Amélia João Abdalla e Pessoas Jurídicas de diversos bens do J.J. Abdalla, entre as quais a Fábrica Japy S/A e lotes na Vila Progresso, envolvendo os bens, bloqueio e venda de bens.

11) Conforme ( R.37/9.376) do 2º Registro de Imóveis de Jundiaí, houve contrato de locação uma área de 21.170,00 m2 pela Indústria José João Abdalla S.A à Distribuidora de Comestíveis Disco S.A. em 17/11/1980. Diversos processos na Justiça do Trabalho ocorreram e a propriedade foi sendo vendida e leiloada, inclusive para a Receita Federal. A execução fiscal nº 123.676/061 movido pela Fazenda Nacional contra a Cia. Brasileira de Produção e

Empreendimentos Cibrafe ( microfilme na mesmo cartório sob nº 54.074 em 09/05/1984), cancelando a penhora. (2)

12) Conforme matrícula 94.907, Livro 2 do 2º Cartório de Registro de Imóveis de Jundiaí ( R-3-Conferência de Bens) consta que no dia 29/05/2003 , conforme Junta Comercial do Estado de São Paulo, sob n] 74.880/03-2 de 17/04/03 os proprietários Irmãos Russi Ltda e Nivoloni @ Cia. Ltda. transmitiram o imóvel à N.R. Empreendimentos e Administração Ltda., inscrita no CNPJ sob nº 02912.778/001/00 na cidade de Jundiaí/SP à Rua Lacerda Franco, nº 175, Vila Arens. (3)

13) A luta dos trabalhadores foi imensa, sendo que tem muitos processos que correram em vista disso na chamada JUNTA, sendo que, acabou por influenciar a formação do Sindicato dos Têxteis, liderados por uma mulher operária, a Sra. Hilda Latance.

14) Por conta dessa luta foi fundado o Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Fiação e Tecelagem em Geral, de Malharias e Meias ..., ainda liderados pela mesma mulher, ou seja, a Presidente Hilda Latance. (4)

III – ESTUDO FEITO PELA SECRETARIA MUNICIPAL DO PLANEJAMENTO E MEIO AMBIENTE DE JUNDIAÍ:

1) Por iniciativa da Secretaria Municipal do Planejamento e Meio Ambiente de Jundiaí, foi feito um estudo iniciado em 2004, terminado em 2006 de alguns bens imóveis da cidade com o intuito de fazer um Inventário Preliminar.

2) Para isso foi contratada uma equipe entre os quais o da Arquiteta, e Doutora Maria Luiza Dutra, especializada em restaura e a sua empresa Maria Luiza Dutra @ Associados – Arquitetura e Restauro S/C Ltda. que elaborou as fichas dos bens patrimoniais).

3) Entre a equipe, também Profª Maria Ângela Borges Salvadori, mestre em História e doutora em Educação, (FE/USP), que fez a coordenação da série ‘Memórias” da SMPMA de Jundiaí

4) Breve descrição feita pela Arq. Maria Luiza Dutra :

Uso original: fábrica

Uso atual: desocupada

Período de construção: primeira década do século XX

Pavimento: um pavimento isolado.

Chaminé : de tijolo maciço.

Estrutura : alvenaria auto-portante de tijolos de barro maciço

Cobertura: tipo ‘sheid’ com telhas francesas

Vedação: tijolos de barro maciço

Vãos, Esquadras externas: janelas com caixilho de ferro e vidro e básculas centrais, frontão central com óculos e vidros coloridos.

Revestimentos externos: tijolos aparentes e parte do soco de blocos irregulares de granito com junta desencontrada.

Calçada: com tijolos , pouca ornamentação, platibanda com pilares e cinalha.(5)

IV – A IMPORTÂNCIA DA PRESERVAÇÃO HISTÓRICO E CULTURAL:

1) A Fábrica de Tecidos Japy está inserido dentro de uma fase histórica de grande importância para a cidade, para o Estado e para a Nação, pois pertenceu à primeira fase industrial do País.

2) Continuou funcionando sempre com tecidos e empregou muitos operários e operárias, sendo também testemunha de lutas de classe vastamente comprovados em documentos e processos na Justiça do Trabalho, sendo inclusive responsável pela fundação de um Sindicato próprio, liderado na época pela primeira mulher sindicalista de classe, d. Hilda Latance.

3) Existe um real interesse pela comunidade e por diversos segmentos da Sociedade Civil em preservar o prédio na sua totalidade, assim como seu entorno, visto ser um ponto de referência do bairro, tanto pela sua localização como pela sua arquitetura e pela sua própria história nacional.

4) Conforme afirmação de um representante do IPHAN-SP, o arquiteto Mario Bondi, podemos ver que a sociedade civil tem sua força na preservação de um bem, como suas palavras publicadas não Jornal Bom Dia:

No artigo “ Olhar Municipal define valor Histórico e Cultural” ( in Jornal Bom Dia de Jundiaí 2/5/2008 ) o Arq. do IPHAN Mauro Bondi diz:” Não há no Brasil estudos suficientes da era industrial, portanto fica difícil definir o que será preservado”. E Bondi ainda, afirma: “ Quem estabelece o que tem valor cultural e histórico é a sociedade. Posso olhar e achar bonito e outro, não”. (6)

5) Comentário sobre a afirmação acima:

A afirmação do Arq. Mauro Bondi nos mostra a fragilidade dos critérios subjetivos usados para decidir o tombamento, a conservação ou não de um bem patrimonial, não deixando para os futuros pesquisadores a análise que lhe ainda lhe falta, e assim comprometendo as pesquisas que poderão ser feitas. No entanto, ao definir a não preservação de um patrimônio arquitetônico, deixará uma lacuna no passado e no futuro.

No entanto, em sua afirmação dizendo que: quem estabelece o valor cultural e histórico é a sociedade, no caso específico da Fábrica de Tecelagem Japy, a sociedade se manifesta pela preservação total do prédio e seu entorno, embora os empreendedores vejam de outra forma. Portanto, o melhor é preservar o bem patrimonial, para que, no futuro haja a possibilidade de pesquisas relacionadas com a fase industrial, pois, no momento, conforme, o próprio Bondi afirma, há pouco estudo sobre o assunto, bem como, criar um espaço onde haja prestação de serviço a população e ao mesmo tempo perpetuando o passado. Por estas questões é que lutamos pela preservação e conservação há mais de sete anos.

IV- DISCUSSÃO COM A SOCIEDADE:

Recentemente o COMDEMA – Conselho Municipal de Defesa do Meio Ambiente de Jundiaí/SP realizou reunião ordinária , no dia 09/02/2011, onde um dos temas foi a discussão sobre o novo Plano Diretor de 2011, em fase de elaboração, que assim, abre o espaço para o debate à comunidade, conforme artigo assinado por Rafael Alcadipani no Jornal de Jundiaí, p.02 de 15/02/2011. Durante a reunião foi solicitado, em plenário, o apoio pela preservação integral da Fábrica do Japy e todo seu entorno, e na ocasião também foram mostradas fotos pela fotógrafa Regina Kalman com registro de bens patrimoniais já demolidos e outros prestes a terem o mesmo destino. Conforme o autor do artigo : “ ... Dá uma nostalgia muito grande ao ver como era nossa cidade e uma revolta em constatar no que ela está se transformando...” (7)

V – CONCLUSÃO:

Existe um claro interesse da Sociedade Civil em preservar o prédio da ex- fábrica de tecelagem Japy e seu entorno, integralmente, conforme um abaixo- assinado que está sendo passado, que por sinal, já foram incluídos ao pedido inicial deste, diversos documentos e declarações de institutos, associações e de sindicatos que estão apoiando a preservação integral do prédio em questão, demonstrando que o fato é de interesse da população, seja dos moradores da Vila Arens como representantes da comunidade em geral.

Trata-se de um bem patrimonial histórico e cultural de grande repercussão na cidade, tememos que os empreendedores imobiliários já fizeram a depredação de diversos outros bens patrimoniais em Jundiaí, entre eles da própria Vila Arens, como da demolição integral da ex- fábrica de tecelagem São Bento, construída no fim do século XIX e que funcionou até a metade do século XX, foi demolida durante os dias de carnaval, com rapidez impressionante, foi uma perda irreparável para a história do Brasil, lamentada por todos em nosso Município.

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Texto de Regina D.Kalman – Prof. de História e Artes, Historiógrafa, Especialista em História do Brasil, jornalista, bel. em Sociologia e Direito, Especialista em Restauração de Bens Culturais Móveis. (Artigo de Jundiaí, 26/02/2010).

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(1) Fase industrial in www.ecco.com.br

(2) in 2º Cartório de Registro de Imóveis de Jundiaí, Matrícula nº 9376 de 27/11/1977 . Livro 2

(3) in 2º Cartório de Registro de Imóveis de Jundiaí, Matrícula 94.907, Livro 2 de 29/05/2003

(4) in Inventário de Proteção do Patrimônio Artístico e Cultural de Jundiaí – IPPAC, Secretaria Municipal de Planejamento e Meio Ambiente da Prefeitura Municipal de Jundiaí, Versão de 2007, pg. 31 e 32.

(5) in www.jusbrasil.com.br

(6) PRADO, Susana . “ Olhar municipal define valor histórico e cultural’ in Jornal Bom Dia , Seção Dia-a-Dia, de 02/05/2008.

(7) ALCADIPANI, Rafael . ‘ Plano Diretor 2011’ in Jornal de Jundiaí, Seção Opinião de 15/02/2011, p.02

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VI- BIBLIOGRAFIA CONSULTADA:

CIPOLATO, Aldo. Jundiaí na História, Jundiaí, Ed. Japy: 1994.

KALMAN, Regina D. ‘Fábrica de Tecelagem Japy’, in www.recantodasletras.com.br: 2011.

KALMAN, Regina D.- ‘Agonia do Patrimônio Cultural de Jundiaí’, in www.escrita.com.br:2011.

KALMAN, Regina D. – ‘Em defesa da Ex-Fábrica de Tecelagem Japy em Jundiaí/SP’ in www.escrita.com.br: 2011

LOUREIRO,Filipe Pereira. Nos Fios de uma trama tecida. São Paulo,Ed. LTCE: 2007.

LOUREIRO, Filipe Pereira.’ Balanço das transformações da indústria têxtil paulistanas décadas pós-depressão ( 1929-1950)’.in www. bbs.edu.br:2007.

MAZZUIA, Mário. Jundiaí através de Documentos, Campinas, Ed. Palmeiras Ltda.: 1976

MAZZUIA, Mario. Jundiaí e sua História, Jundiaí, Editado pela Prefeitura Municipal de Jundiaí:1979.

SALVATONI, Maria Ângela Borges. Lugares Jundiaí, Série Memórias, Jundiaí, Secretaria Municipal de Planejamento e Meio Ambiente da Prefeitura Municipal de Jundiaí,Vol. 2 : 1999.

TOMANIK, Geraldo Barbosa. Jundiaí Cronologia Histórica, Jundiaí, Ed. Litearte: 1992.

TOMANIK , Geraldo Barbosa . As Fotos, os Traços e a História , Jundiaí, Ed. Literarte: 2005.