O que fazer? Sacrificar animais ou substituir por “Caldo Knorr”?

Volta e meia voltam-se ao assunto do sacrifício de animais. E sempre algum político engraçadinho aparece com um Projeto de Lei para proibir o sacrifício litúrgico, em pleno descumprimento ao dispositivo constitucional no Artigo 5º - VI – “é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e as suas liturgias”.

Oras, todos sabemos que o Candomblé é uma religião que tem em suas bases dois fundamentos somente: sacrifícios e oferendas. Sendo então o sacrifício, por força litúrgica e exegese plena regida e protegida pela própria Constituição, ou seja, a Lei Magna. Então, aparecem estultos políticos, como o vereador Marcel Moraes (PV) de Salvador-BA, que apresentou um absurdo projeto de Lei tentando substituir o sacrifício por plantas e folhas.

Primeiro, o sacrifício não é prática exclusiva das religiões de matriz africana; e segundo, todas as religiões animistas e matriciais trazem esta prática. Como no caso do judaísmo onde Deus (Jeová) exigia sacrifícios de animais para que a humanidade pudesse receber perdão dos seus pecados (Levítico 4:35; 5:10). Para começar, sacrifício de animal é um tema importante encontrado por todas as Escrituras. Quando Adão e Eva pecaram, animais foram mortos por Deus para providenciar vestimentas para eles (Gênesis 3:21). Caim e Abel trouxeram ofertas ao Senhor. A de Caim foi inaceitável porque ele trouxe frutas, enquanto que a de Abel foi aceitável porque ele trouxe “das primícias do seu rebanho e da gordura deste” (Gênesis 4:4-5). Depois que o dilúvio recuou, Noé sacrificou animais a Deus. Esse sacrifício de Noé foi de aroma agradável ao Senhor (Gênesis 8:20-21). Deus ordenou que Abraão sacrificasse seu filho Isaque (Gênesis 22:10-13), o que mostra que este tipo de sacrifício era comum na época. É claro que mais tarde foi condenado “Entre ti não se achará quem faça passar pelo fogo a seu filho ou a sua filha...” Deuteronômio 18:10. Entretanto, o Talmude judaico traz um relato de um sacrifício humano. Jefté (hebraico./aramaico. יפתח Yiftah / Yipthaχ). Os amonitas entraram em guerra contra os israelitas e não tinha nenhum homem com as qualificações de Jefté, homem valoroso e guerreiro e os anciões foram buscá-lo na terra de Tobe. Estrategicamente, para evitar derramamento de sangue, Jefté tentou negociações com reinos vizinhos, no que não obteve sucesso. Partiu para um segundo plano: um ataque sob a direção de Deus. Antes de partir para a guerra, ele fez um voto ao Senhor; caso ele retornasse para casa vitorioso, o primeiro ser que saísse pela porta de sua casa, ao seu encontro, seria oferecido em holocausto ao Senhor. Ele voltou vitorioso, mas quem saiu ao seu encontro foi sua filha única, cujo relato bíblico afirma que ela morreu, antes de conhecer (ter relações íntimas com) homem (Juízes 11:39).

O sistema de sacrifícios atinge seu ponto máximo com a nação de Israel. Deus ordenou que essa nação executasse inúmeros sacrifícios diferentes. De acordo com Levítico 1:1-4, um certo procedimento era para ser seguido. Primeiro, o animal tinha que ser perfeito. Segundo, a pessoa que estava oferecendo o animal tinha que se identificar com ele. Então, a pessoa oferecendo o animal tinha que infligir morte ao animal. Quando feito em fé, esse sacrifício providenciava perdão dos pecados. Um outro sacrifício chamado de dia de expiação, descrito em Levítico 16, demonstra perdão e a retirada do pecado. O grande sacerdote tinha que levar dois bodes como oferta pelo pecado. Um dos bodes era sacrificado como uma oferta pelo pecado do povo de Israel (Levítico 16:15), enquanto que o outro bode era para ser solto no deserto (Levítico 16:20-22). A oferta pelo pecado providenciava perdão, enquanto que o outro bode providenciava a retirada do pecado.

No livro do êxodo encontramos as determinações litúrgicas para os sacrifícios que são idênticas ao que se pratica no candomblé e outras formas de culto de matriz africana. Ou seja, como se pode, à luz da Bíblia contestar o sacrifício ordenado nesta mesma Bíblia, seja no Torá judaico ou mesmo na Bíblia cristã. "Se oferecer um animal do rebanho como sacrifício de comunhão ao Senhor, trará um macho ou uma fêmea sem defeito”. Levítico 3:6; “Ele os trará ao sacerdote, que apresentará primeiro a oferta de sacrifício pelo pecado. Ele destroncará o pescoço da ave, sem arrancar-lhe a cabeça totalmente”. Levítico 5:8; "Se, contudo, sua oferta for resultado de um voto ou for uma oferta voluntária, a carne do sacrifício será comida no dia em que for oferecida, e o que sobrar poderá ser comido no dia seguinte. Levítico 7:16; "A carne que tocar em qualquer coisa impura não será comida; será queimada no fogo. A carne do sacrifício, porém, poderá ser comida por quem estiver puro”. Levítico 7:19; "Arão trará o novilho como oferta por seu próprio pecado para fazer propiciação por si mesmo e por sua família, e ele o oferecerá como sacrifício pelo seu próprio pecado. Levítico 16:11; "O sacerdote os apresentará ao Senhor e oferecerá o sacrifício pelo pecado e o holocausto. Números 6:16; "Em seguida, à entrada da Tenda do Encontro, o nazireu rapará o cabelo que consagrou e o jogará no fogo que está embaixo do sacrifício da oferta de comunhão. Números 6:18.

No caso dos cristãos, de onde vêem os ataques mais contundentes, se utiliza do estratagema conclusivo da exegese do sacrifício vicário (substitutivo) de Jesus como razão definitiva para a não necessidade de sacrifícios animais. “Isto é o meu sangue, o sangue da [nova] aliança, derramado em favor de muitos, para remissão de pecados” (Matheus 26.28); "Mas quando este sacerdote (Jesus) acabou de oferecer, para sempre, um único sacrifício pelos pecados, assentou-se à direita de Deus." (Hebreus 10, v. 12).

Oras, não seria este um sacrifício humano? Pois, se Jesus, um ser humano é sacrificado em holocausto pelos pecados do mundo, pratica-se um sacrifício animal litúrgico, e neste caso o animal é um homem.

Tanto que, nas missas católicas a exegese mais latente da Eucaristia, é a da transconsubstanciação dos elementos. Ou seja, segundo as igrejas católicas, tanto romana, grega, russa, armênia ou suas afiliadas, o pão realmente se torna corpo- carne, e o vinho sangue de Cristo. Assim, em cada missa existe um novo sacrifício humano. "A minha carne é verdadeiramente uma comida e o meu sangue, verdadeiramente uma bebida. Quem come a minha carne e bebe o meu sangue permanece em mim e eu nele" (João 6,55-56); “Enquanto comiam, Jesus tomou o pão, deu graças, partiu-o e o deu aos seus discípulos, dizendo: Tomem e comam; isto é o meu corpo. Em seguida tomou o cálice, deu graças e o ofereceu aos discípulos, dizendo: Bebam dele todos vocês. Isto é o meu sangue da aliança, que é derramado em favor de muitos, para perdão de pecados” Mateus 26:26-28.

Ou seja, de acordo com estas informações, espero que jamais algum dos adeptos de religiões de matriz africana se sinta coagido diante de redargüições a cerca do sacrifício de animais. Mesmo porque, sabemos que a carne destes animais sacrificados liturgicamente é repartida entre os presentes e comida em alegria e festividade. E pelo que sei ninguém come bife de boi vivo, se mata o animal antes de retirar-lhes as partes e cortes. Assim, se a carne será comida pela comunidade, que importa o modo pelo qual o animal foi morto?