A Primeira greve da Companhia Paulista de Estradas de Ferro em Jundiaí em 1906

Em 1906 surgiu a primeira greve ferroviária, e isso na Companhia Paulista de Estradas de Ferro, na cidade de Jundiaí,SP, onde os ferroviários queriam depor uma dos engenheiros que era Inspetor Geral. O movimento irrompido às três horas da manhã, no dia 15 de maio de 1906 se espalharia em toda a ferrovia e durante seus quinze dias de duração se acabaria alastrando ao Estado inteiro, vindo a ser conhecido como a primeira greve de São Paulo, que teve inclusive, repercussão nacional, em função da importância que o transporte ferroviário tinha na ocasião dentro do País.

A greve começou, segundo jornais da época, quando a Liga Operária de Jundiaí assumiu posição contra a punição de um empregado da ferrovia, mas outros motivos apareceram depois. O motivo que serviu de pretexto foi a punição aplicada ao conferente Thomaz Degani, quando este havia sido transferido de Jundiaí pra Ribeirão Bonito por ter obtido em instância superior da administração da empresa uma licença que o chefe da estação de Jundiaí recusou dar. O motivo da licença era uma visita a parentes em Itatiba.

Assim, solidarizando-se com o empregado a Liga declarou greve na Companhia, incluindo a seguir, uma série de reivindicações, como extinção da obrigatoriedade de ingresso na Sociedade Assistencial dos Empregados ( Cooperativa) e a volta à jornada semanal de seis dias, e dez horas diárias, ou seja, a imposição de cinco dias semanais, com folga na segunda-feira, e oito horas diárias, pois esse dia e as horas reduzidas, também eram descontadas no salário semanal. Essas idéias e imposições foram feitas pelo engenheiro Francisco Paes Leme Monlevade, que havia recentemente assumido o cargo de Inspetor Geral.

As exigências dos grevistas era para a demissão do Inspetor Geral Francisco de Monlevade, devido às mudanças realizadas na administração , do diretor Burnier e do chefe da estação de Jundiaí,estes últimos responsáveis pela transferência do conferente. A Liga tinha cerca de 3500 filiados dos 3800 empregados da Cia. Paulista.

Não conseguindo o que queriam a greve foi anunciada com propósitos pacíficos e dessa forma perdurou por vários dias, Várias tentativas foram feitas para uma acordo, mas nada foi concluído. A ferrovia retrocedia apenas no caso da punição. Uma greve geral em solidariedade espalhou-se em diversas cidades, incluindo a capital durante o governo paulista de Jorge Tibiriçá e, até o governo federal de Rodrigues Alves se preocupou com a situação

Para patrulhar a cidade, veio então um grupo da cavalaria da Força Pública, sendo que o Exército e a Marinha foram mobilizados.

A violência iniciou talvez devido ao gesto extremo da Companhia em trazer homens ( só da Central do Brasil) para Jundiaí. Não se sabe ao certo se foram as sabotagens que iniciaram primeiro ou as arbitrariedades policiais. Assim, vários trens foram danificados, morrendo inclusive, um soldado que guardava o limpa-trilho de uma locomotiva que descarrilhou com vários vagões na linha de Jaú.

Trágico fim e a homenagem dos companheiros aos grevistas mortos

O conflito no dia 29 de maio ( grave iniciada no dia 15) foi trágico. Um grupo de cem a duzentos grevistas partiu em passeata pelo centro da cidade em direção das oficinas da Paulista, na rua São Bento. No entanto, desentenderam-se com soldados da Força Pública no Largo da Matriz, hoje praça Gov. Pedro de Toledo. Na ocasião um soldado foi ferido Pedro Evangelista de Araújo, que morreria dez minutos depois. Ao cair do cavalo, o animal livre foi a galope até onde estavam os demais cavalarianos da Força Pública. Estes vendo o animal chegar sem o cavaleiro, perceberam que algo de grave havia acontecido. Dirigiram-se então às pressas ao Largo da Matriz. Vendo seu companheiro ferido, entraram em choque com os ferroviários. Foi quando perderam a vida dois empregados grevistas da Companhia Paulista de Estradas de Ferro: Ernesto Gould e Manoel Dias. As sepulturas dos dois estão no Cemitério Municipal “Nossa Senhora do Desterro”, na quadra 09, próximos um do outro, têm a mesma forma de uma pirâmide de quatro faces, com uma estrela metálica no topo. Na base um medalhão em bronze, exibe , em relevo, a figura da Liberdade, segurando a tocha para baixo, e ao fundo, a fachada do prédio da oficina mecânica da Paulista.

Conseqüências da greve:

Os grevistas não conseguiram obter seus intentos com a greve, tanto que o engenheiro Inspetor Geral Monlevade que queria impor a obrigatoriedade de vincularem-se à Sociedade Assistencial (Cooperativa),

com contribuições mensais acabou sendo usado como modelo para a Previdência Social que surgiu em 1923, iniciado, de um movimento social pelos ferroviários jundiaienses da Paulista. Modelo utilizado até hoje, no País.

Embora tenha durado apenas quinze dias, não resta dúvida que a greve da Estada de Ferro Paulista foi importante, pois paralisou o Estado de São Paulo, e outros Estados, que por solidariedade também entraram na greve. A greve movimentou ferroviários, comerciantes, industriários, estudantes , e até o Exército, a Marinha de Guerra, além da polícia , sendo de uma importância social expressiva, já a que ferrovia era o meio de transporte mais importante da época. Tanto a indústria , o comercio, o correio, a lavoura sofreram com ela. Mas, foi além de tudo, um movimento de solidariedade, que os ferroviários mostraram ter entre si, respeitando seus colegas. Tanto, que dois deram sua vida pela causa que defenderam.

O Príncipe da Engenharia Brasileira

Monlevade 12 anos depois implantaria a eletrificação ferroviário no País, sendo que, por esse e outros motivos considerado o Príncipe da Engenharia Brasileira , terminaria como uma dos mais queridos administradores que a Cia. Paulista já tiveram. ( Sub-Estação Francisco de Monlevade em Louveira –SP). Quando morreu , em 1944, o seu simples caixão fabricado nas oficinas da Cia. Paulista, foi carregado por humildes ferroviários, alguns deles ex-grevistas do dia 15 de maio de 1906.

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= Fontes : Jornais da época: Estado de São Paulo, Comércio de São Paulo, Diário Popular.

= Comunicação apresentado pela autora, no IV Encontro Regional de História de São Paulo da ANPUH, Araraquara, 1978.

= Entrevistas com o jornalistas Geraldo Dias,jornalista Alfrânio Bardari e o diretor do Museu Histórico e Cultural de Jundiaí, Sr. Geraldo Tomanik em 1970.

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Regina Dragiça Kalman - Bacharel em Ciências Políticas e Sociais pela Escola de Sociologia Política de São Paulo e professora de História pela Faculdade de Filosofia , Ciências e Letras de Guaxupé, Especialização em História do Brasil.