HUMANIDADE E DOÇURA

Filio-me à vertente de que a possessão amorosa é um espécime do egocentrismo, manifestando-se através do egoísmo e das frustrações, o qual produz atos deploráveis e por vezes até agressivos entre os enamorados. Por esta razão, o estudo dedicado e a pesquisa sobre a poética e o lirismo me permitem chegar à conclusão que o poema tem de ser um exemplar pejado de confraternidade – que é o exercício espiritual de amar o semelhante – mesmo que o desejo (e as setas de cupido) leve-nos ao amor com a libido em alta dose e torne confuso este entendimento para se chegar a uma conduta coerente. E é esta confraternidade que vivifica e dimensiona a relação humana de convivência. A poesia é a sua voz altissonante, naturalmente codificada e prenhe de humanidades, como temos exemplarmente no jovem poeta Castro Alves (que morre aos 24 anos), tanto na chamada "lira antiescravagista" como em sua poética do “eu e tu”, que retrata os inocentes e pueris jogos do amar, segundo os costumes de meados do século XIX. A poética, em seu invólucro formal – sua indumentária de apresentação pública – nunca é tátil, palpável, porque palavra alojada nas nuvens, no etéreo. Todavia, é o mais alto convite ao exercício do amar como proposta sensitiva. Boca sequiosa que exprime e expõe o coração da máquina de dizer o viver com a doçura e os zelosos cuidados urdidos pela condição humana, quando pretende a felicidade como bem de ocasião. Esta donzela esquiva que não permite apossamentos perenes...

– Do livro O CAPITAL DAS HORAS, 2014.

http://www.recantodasletras.com.br/artigos/4737405