SOBRE SER FELIZ

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Cheguei ao ponto em que ainda valorizo a vida, mas não acho que vale a pena viver a qualquer custo. Sentir-me vivo é mais importante que viver. Não viver é pior do que morrer. O resumo da vida está na independência dos passos, dos sentimentos e da razão.

Mais do que no auge da juventude, há em mim um desejo imenso de liberdade: trabalhar com o que gosto, não ter ídolo político nem guia espiritual, ser poeta sem academia, não fazer da família uma gaiola e ter amigos a perder de vista... de todas as tribos, classes, etnias, crenças, orientações e gêneros.

Sobretudo, quero manter meu canto para chamar de meu: o emaranhado indecifrável de árvores e sons de fauna, onde sou caipira, índio, naturista, e à noite sonho feliz, na casa pequenina dos fundos do quintal.

Descobri que ser feliz está bem antes da corrida para ter, vencer, chegar na frente... muito antes da missão tristonha de merecer um suposto céu... bem mais perto que a busca de uma cura milagrosa que até poderá vir, mas não será milagrosa nem surgirá da busca, porque a natureza é que decide, sem nenhuma influência de nossas agonias ostentadas em preces, louvores e outros desempenhos religiosos.

Aqui vou eu rumo à morte que, para mim, não será nenhum prêmio nem castigo. Só a certidão de que vivi duzentos anos; morra hoje, aos cinquenta e muitos, ou viva mais cinco; dez; trinta e poucos anos... afinal, cheguei ao ponto de, em qualquer ponto, estar pronto para o desembarque.