A MENSAGEM CRISTÃ DA ESTAÇÃO PRIMEIRA

Demétrio Sena, Magé – RJ.

Definitivamente, a ignorância tomou conta de uma grande parcela, talvez maioria do povo brasileiro. Essa ignorância foi chocada na falsa religiosidade, que distorce como nunca o próprio livro que diz ter como regra de vida e fé. O cristianismo do século XXI sofreu uma derrocada vertiginosa e praticamente voltou à idade média. Hoje, o cristão comum voltou a ser intolerante; raivoso; inquisidor; mandão; do tipo que apedreja e quer converter na marra; por força e violência. Mas ainda existem os cristãos incomuns (aos quais dedico admiração e respeito). Esses ainda primam pelo amor, pela tolerância, o respeito às diferenças. Ainda perdoam, pedem perdão e sabem conviver em paz, exatamente como seu Messias, o verdadeiro, ensinou.

Afora isso, as mentes cristãs comuns deram um nó que ninguém desfaz. E põem tudo na conta do próprio Jesus Cristo, cuja tristeza deve ser tamanha, quando ele vê que os seus supostos seguidores estão negociando a fé... praticando a intolerância, o preconceito, a perseguição e o apedrejamento público de quem não aceita suas imposições. Imposições que a própria Bíblia condena, pois institui o livre arbítrio. Apedrejamento que o próprio Jesus deplora, como no caso de Maria Madalena, quando ele desafiou a multidão raivosa, louca para punir, ao escrever no chão: Aquele que não tem pecado, que atire a primeira pedra.

Em tempos de macro hipocrisia, imagino que Jesus Cristo não teria Sido feliz no desafio. Ao terminar a frase, milhares de pedras seriam atiradas, e a multidão, tão religiosa quanto aquela, mas muito menos piedosa e sincera gritaria sentenciando: ‘Eu não tenho pecado! Eu também não! Nem eu! Muito menos eu!’... E assim, Cristo e Maria Madalena seriam apedrejados juntos. Mais do que naquele tempo, os religiosos deste século são a multidão raivosa; que julga e condena; que não tolera ser desobedecida; vai às últimas consequências em suas demonstrações de poder, não importa que atrocidades cometam ou apoiem. Pior ainda; especificamente no Brasil, o chamado povo santo está sendo regido por um demônio político asqueroso, sem escrúpulos, que descobriu nesse povo a fome de poder. O desejo de comandar. O egoísmo. A hipocrisia necessária para fazer o mal em nome do bem; praticar o ódio com máscara de amor. Arrogância com ares de humildade.

A hipocrisia... o ódio por quem pensa e é diferente... o pavor de ser flagrado pela mensagem mais cristã do que todas as suas pregações vivenciais, e o amor maléfico pelo atual presidente brasileiro... tudo isso foi o que fez o povo cristão brasileiro espumar de raiva com o carnaval apresentado pela Escola de Samba Estação Primeira da Mangueira na Marquês de Sapucaí este ano. O enredo e o samba falam do amor de Jesus Cristo pelos mais pobres; os desassistidos; os desprovidos de poder. Sugerem que se Jesus nascesse hoje, seria numa uma favela, onde o acolheriam com amor e respeito. Falam de Jesus na pele do negro e do índio... no corpo da mulher... e as esculturas que representaram isso foram deturpadas deliberadamente pelos santos modernos. Santos que odiaram a mensagem pela igualdade; pelo amor ao próximo; contra o preconceito e a intolerância que hoje reinam.

Mas, o que os religiosos brasileiros mais odiaram foi o trecho que diz: Favela, pega a visão;/não existe futuro sem partilha/nem Messias de arma na mão”. Primeiro, porque eles não querem saber de partilha; querem ser os donos de tudo. Segundo, porque apoiam o projeto de armamento da população. Terceiro, porque aí o samba mexeu com o presidente; o “Messias” que substituiu aquele; o da Bíblia; o Jesus. Ah, não! Ofendam seus pais, filhos, cônjuges, amigos, irmãos e o próprio Espírito Santo, mas não mexam com o Bolsonaro! Com ele, não! Ele nunca está errado! Só fala umas besteirinhas de nada e que têm um grande propósito! Veio salvar a “humanidade brasileira”! Não pode ser contrariado! É sacrilégio mexer com ele!

Leia o samba da Mangueira com imparcialidade, senso crítico e sem temor das ameaças do inferno. Você verá que a mensagem é de amor, igualdade, cidadania... muito mais cristã do que a postura dos cristãos contemporâneos comuns que ora fazem deste país uma praça de guerra sem fim. Leiam logo, antes que um cristão (comum) providencie na escuridão da noite, protegido pelo anonimato, a censura desta postagem.

A VERDADE VOS FARÁ LIVRES

Senhor, tenha piedade

Olhai para a terra

Veja quanta maldade

Senhor, tenha piedade

Olhai para a terra

Veja quanta maldade

Mangueira

Samba, teu samba é uma reza

Pela força que ele tem

Mangueira

Vão te inventar mil pecados

Mas eu estou do seu lado

E do lado do samba também

Eu sou da Estação Primeira de Nazaré

Rosto negro, sangue índio, corpo de mulher

Moleque pelintra no buraco quente

Meu nome é Jesus da Gente

Nasci de peito aberto, de punho cerrado

Meu pai carpinteiro, desempregado

Minha mãe é Maria das Dores Brasil

Enxugo o suor de quem desce e sobe ladeira

Me encontro no amor que não encontra fronteira

Procura por mim nas fileiras contra a opressão

E no olhar da porta-bandeira pro seu pavilhão

E no olhar da porta-bandeira pro seu pavilhão

Eu tô que tô dependurado

Em cordéis e corcovados

Mas será que todo povo entendeu o meu recado?

Porque, de novo, cravejaram o meu corpo

Os profetas da intolerância

Sem saber que a esperança

Brilha mais na escuridão

Favela, pega a visão

Não tem futuro sem partilha

Nem messias de arma na mão

Favela, pega a visão

Eu faço fé na minha gente

Que é semente do seu chão

Do céu deu pra ouvir

O desabafo sincopado da cidade

Quarei tambor, da cruz fiz esplendor

E ressurgi pro cordão da liberdade

Mangueira

Samba, teu samba é uma reza

Pela força que ele tem

Mangueira

Vão te inventar mil pecados

Mas eu estou do seu lado

E do lado do samba também

Demétrio Sena
Enviado por Demétrio Sena em 26/02/2020
Reeditado em 26/02/2020
Código do texto: T6874654
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