SEMANA DE ARTE... MODERNA?

Demétrio Sena - Magé

Quando um movimento assumidamente marginal confronta o tradicionalismo em qualquer contexto e área da sociedade, há que se ter muito cuidado para que o seu possível sucesso não gere simplesmente uma inversão, e desta forma, o marginal não se torne tradicional e vice-versa. A Semana de Arte Moderna terá sido ilegítima e fraudulenta, se a sua intenção de fundo foi acabar com o clássico e convencional. Isto seria reprimir as artes e a literatura que reprimiam, por serem obrigatórias ou exclusivas da sociedade. Terá sido legítima, se a intenção foi reprimir a repressão; proibir a proibição; evocar voos, experimentações contínuas, mutações livres e miscigenações culturais.

Os artistas e os escritores ditos livres, que excluem e tiranizam os escritores e artistas convencionais, no fundo convencionam sua literatura e sua arte como obrigatórias e tomam posse dos mesmos gabinetes até então ocupados por aqueles contra quem lutaram porque eles ditavam (e ainda ditam, em muitos ambientes) as suas modalidades encaixotadas, medidas, obrigatórias... ou porque simplesmente protagonizavam de forma irrestrita e ampla, como todo ser humano deseja. Quando nos auto proclamamos livres, independentes como fazedores culturais, mas tentamos desqualificar os fazedores diferentes de nós, que também nos desqualificam por sermos nós os diferentes, o que fazemos é reproduzir tudo aquilo que deploramos neles. É como no caso das religiões que primeiro lutam para legitimar seus espaços e, uma vez vitoriosas, lutam para excluir, extinguir as outras religiões ou sufocar seus espaços.

Nos meios artísticos e literários ou culturais como um todo, não tem que haver os mocinhos e os vilões. Ou teremos criado o nosso barroquismo, nosso parnasianismo e a excêntrica academia dos não acadêmicos... e seremos a nova/já ultrapassada polícia das letras e artes que os "tradicionalistas tradicionais" sempre foram. Ou só teremos nos tornado os novos clássicos, convencionais e a mais hipócrita expressão da polêmica, da rebeldia ou da marginalidade sonsa, por termos nos inspirado exatamente nos alvos da nossa rebelião. E toda a investida contra a ditadura cultural deles terá obtido apenas a conquista da nossa ditadura... ou de uma bolha semelhante, para chamarmos de nossa.

Demétrio Sena
Enviado por Demétrio Sena em 07/06/2022
Código do texto: T7532655
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