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A Trajetória de uma Bibliotecária
 
Tão difícil é falar de nós mesmos, mas de tanto ouvir pessoas do meio falarem: escreva um livro sobre a sua vida! Escreva a sua vida! Um dia até que tentei, saí de mim mesma, me chamei de curumim e comecei a memorizar os seus primeiros passos pelo Vale do Cricaré em São Mateus, interior do Espírito Santo, num determinado momento da narrativa, peguei a curumim no colo, embalei em meus braços e chorei, chorei muito, nunca mais consegui ir além daquele ponto.
 
Por isso, hoje inspirada vou dar um salto, vou tentar a partir de o meu nome escrever a trajetória de uma bibliotecária: originalmente Beatriz Barbosa, cujas iniciais são as letras BB. Ao pronunciar o meu prenome como ‘Bi-atriz’, entende-se por atriz duas vezes, e atriz era o que eu mais queria ser, quando criança já brincava de teatro com os meus irmãos e vizinhos no fundo do quintal, o palco era uma velha mesa de madeira e a cortina ficava por conta dos velhos lençóis da minha mãe.
 
Gosto muito de brincar com o meu nome, quando estudei o inglês básico, também tratei de pronunciá-lo diferente: ‘To be star’ – ser estrela, e o que é ser estrela no mundo da encenação? Ah! É ser uma atriz de quinta grandeza! Mas é só brincadeira, é bom viver um pouco no mundo da imaginação. Agora, falando sério: Beatriz vem do latim e em espanhol significa: ‘la que hace feliz’, não sei se cumpro bem o seu propósito, porém sei que, com este nome sou muito feliz! Já o sobrenome Barbosa é tirado da quinta de Barbosa em Portugal, cuja terra é abundante em uma planta chamada barba – barboso: barba mais o sufixo “oso”.
 
Querem ver? É verdade parece que a presença da letra B é uma constante em minha trajetória. E a biblioteca? Onde é que a biblioteca, que também tem BB, entra nesta história? Ah! Adoro os livros sempre gostei muito de ler, a minha relação com eles sempre foi muito estreita, quando criança meus pais não tinham condições de comprar livros, os livros didáticos eram passados de primos para primos, de irmãos para irmãos... E quando adolescente o castigo, na escola, era ir para a biblioteca, mas como eu não levava muito jeito para a indisciplina, me esforçava para aprontar ‘alguma’ só para ficar com eles, os livros.
 
Quando fiz a ‘Escola Normal’, havia uma colega, amiga, Beth Bonomo, tinha que ter BB nas iniciais, que me emprestava seus livros literários, eu consegui ler bons livros, clássicos brasileiros como: Iracema, Ubirajara, Cinco Minutos, todos de José de Alencar, também li Machado de Assis, as poesias de Carlos Drummond de Andrade e até Jorge Amado. Mas, foi no início do curso para normalista, com 14 para 15 anos, ainda adolescente, que a minha relação se fez estreita com a biblioteca, eis que surge uma vaga na Biblioteca Pública de São Mateus, encasquetei que iria trabalhar lá, não consegui, porque além da pouca idade, o cargo era político, e essa era uma questão que eu não sabia lidar muito bem.
 
BB penso que essas iniciais me perseguem, e perseguem mesmo! Continuei estudando sempre, lendo muito, normalista, aos 17 anos, assumi uma vaga na escola “Amâncio Pereira” e outra no Jardim de Infância “Carmelina Rios”, com dificuldades comprei as apostilas que preparava para o concurso do Banco do Brasil. Venci este primeiro desafio! Passei no BB! Enquanto esperava ser chamada venci o segundo, passei em outro concurso para a Floresta Rio Doce, onde trabalhei dos 19 aos 20 anos, aos 20 comecei a trabalhar no Banco do Brasil na agência de São Mateus, de onde saí aposentada, por sinal precocemente, aos 42 anos.
 
Contudo os livros continuaram fazendo parte da minha vida, nesta época já os podia comprar, e ‘os compor tores’, vendedores de livros de porta em porta, não sei por que encontravam sempre o meu endereço... Formei um pequeno acervo, até que um dia comentei com o meu irmão: que eu já não suportava os vendedores de livros porque não sabia dize-los não, no que ele respondeu: “Beatriz quando estes aparecerem, chama-os na sua sala e diga assim: “olhe bem para esta estante, ainda que eu viva 100 anos, não conseguirei lê-los todos”. Mas que bobagem! Eles eram quase nada. Ficaram defasados! No entanto, nós também nos defasamos e estava na hora de parar de trabalhar e voltar a estudar, voltar a ter contato com esta coisa que me faz tão bem: os livros!
 
E de novo a presença do BB em minha trajetória. Depois de dois anos aposentada, cursando espanhol, enquanto minha filha caçula se preparava para o vestibular, eu pegava suas apostilas e começava a estudar... Fim de ano chegando, momento de fazer a inscrição para o concurso, e eis à dúvida: faria o que? Filosofia, Letras ou coisa parecida? Pensa daqui, analisa de lá e na hora ‘H’ o amor aos livros falou mais alto: Vou fazer Biblioteconomia! E a biblioteconomia veio, para me humanizar, para sistematizar a minha relação com a informação, preencher lacunas, reciclar e, sobretudo para me realizar.
 
Mas não parei por aí, em 2005 concluí o curso na Universidade Federal do Espírito Santo, no ano seguinte regressei a minha cidade natal, em 2007 prestei concurso público municipal para a única vaga de Bibliotecária, obtive o primeiro lugar, assumi em setembro de 2008 na Biblioteca Pública Municipal “Clementino Rocha”. A essa altura não preciso dizer mais nada, sou apaixonada e feliz com a nova profissão que escolhi e não poderia ser diferente, pois já nasci bibliotecária!
 
 
 
Beatriz Barbosa Pirola é mateense, funcionária aposentada do Banco do Brasil, Bacharel em Biblioteconomia pela Universidade Federal do Espírito Santo – UFES, Bibliotecária da Biblioteca Pública Municipal “Clementino Rocha”, Membro do Conselho Municipal de Cultura e Membro da Academia Mateense de Letras – AMALETRAS.