(42)As Barraquinhas da Renascença (a Saga)

"Os Mirins do Rítmo", nosso Conjunto musical de irmãos durou dos meus 10, aos 15 anos de idade,talvez um pouquinho mais;Já meio cansado do som da gaita, insatisfeito com suas(e minhas) limitações, passei a cobiçar um Acordeon; Ouvia Mário Zan,um paulista descendente de Italianos, no Rádio. Achava lindo tudo que ele tocava.

Minha avó materna, Vó "Fela"(Maria Félix)veio passar uns dias conosco para alegria de todos. Um belo dia acordou cedo e me chamou pra ir com ela fazer uma visita a "Seu "Domingos, um compadre seu, no bairro Cachoeirinha,vizinho ao nosso;

Andar com Vó Fela era sempre bom porque ela contava histórias do Cedro, terra dela e de minha mãe e de nossas primeiras namoradinhas, das férias que passavamos lá; Dava notícia de tudo!

"Aquela? filha do Antônio chatinho? Pode desistir...já arranjou outro!..

Foi da porta da casa dela que conhecí Clara Nunes, pegando Água no Chafariz, aos 16 anos de idade, linda! "Vó.Quem é aquela morena bonita?...e ela, levantando os olhos da costura que fazia: Aquela, é filha de Mané Serrador, seresteiro,tocador de violão, companheiro de seu pai nas Serenatas;

Bom; cheguei com Vó Fela na casa de "Seu" Domingos; Dona Dica nos recebeu,ele estava no trabalho, e logo apareceram as três filhas; Uma delas Ruth foi logo buscar o presente que ganhara do pai: Um Acordeon vermelho, Scandalli, Italiano;(Influência do modismo das escolas de acordeon"Mário Mascarenhas",que se alastravam pelo Brasil feito "Coqueluche".

Ruth, quea inda não sabia tocar e tinha ouvido uma de nossas apresentações na Rádio Guaraní, colocou o instrumento no meu colo e disse em uníssono com minha avó: "Toca aí, meu filho"!

Na cabeça delas quem tocava um instrumento, tinha obrigação de tocar todos; Ah, vó...Eu não sei...É muito mais difícil que a gaita; Não esqueci mais aquela cena;

O acordeon novinho no meu colo e eu sem saber tocar uma nota,sequer. Então, pensei comigo:"Mas eu vou tocar...Vou ter um igual e vou tocar"!

Padre Pedro, o pároco de nossa igreja frequentava a casa dos operários e era muito festeiro. Disse a meu pai numa visita, que iria promover umas festas juninas durante um mês e gostaria de contar com a colaboração de "Seu' Constantino e "Os Mirins do Rítmo", para angariar fundos pra acabar de construir a Igreja...

Tudo "0 800", sem cachet, só de caridade mesmo...Meu pai concordou, claro e nós tambem gostamos da idéia;

O esquema era o seguinte; O Bairro era separado em duas partes pela Rua Jacuí a principal, do Final do Bonde Renascença. Os moradores da parte próxima á Igreja,classe média-média,casas próprias, defenderiam as côres da Barraca das Holandesas e os da parte das casas populares,geminadas, os operários, a Barraquinha das Bahianas... Quem oferecesse mais atrações e arrecadasse mais pra Igreja seria Campeão, moral, lógico!

Estreiamos num domingo á noite. Começava alí pelas 8 da noite e não acabava antes das 2hs da madrugada, isto diariamente de domingo a domingo; Como era época de férias escolares, não prejudicava em nada nossa vida escolar e podíamos dormir até mais tarde no dia seguinte.

Claro que com a presença de "Seu" Constancio e Os "Mirins do Rítmo" animando as noites, a Barraquinha das Bahianas, era mais concorrida, tinha mais frangos arrematados nos leilões e as tendas de canjica e quentão vendiam TUDO,toda noite!Foi a partir desta aceitação popular, que abrimos espaço para apresentações de "calouros".O primeiro corajoso, foi um neguinho chamado Victor ,não sei das quantas que tinha a lingua presa e cantava o bolero "Dez Anos",sucesso de Emilinha Borba.. e o Vitor caprichava: -"Afim, fi pafaram devamof.. fem eu ver teuf olhof...Fem olhar tua boca...Fem beijar teuf lábiof e afim...Foi tão grande a pena...Que fentiu a minha´lma .. Ao recordar que tú...Fofte meu primeiro amôr..."

E a galera delirava:"Emilnha"..."Emilinha"... e o Vitor , baixinho, só pra nós... Fi me facanear eu paro pôrra...

Apareceu Eduardo Araújo, que tambem cantava boleros, depois virou "roqueiro", em São Paulo.

Apareceu Hellen de Lima, em começo de carreira,que depois virou uma das "Cantoras do Rádio", na Nacional no Rio de Janeiro...até que, um belo dia Levada pela mão do compositor Jadir Ambrósio,Um negro alto e elegante, Diretor do Côro da Igreja,conhecidíssimo no bairro como o autor de "Buraco de Tatú", música estourada no Brasil inteiro..., apareceu com ele, moreninha linda que ví pegando água no chafariz perto da casa de minha Vó Fela, no Cedro; Clara Francisca, mais tarde cantora vencedora do concurso "Voz de ouro ABC"da Rádio Inconfidência,ela que, havia se mudado para B. Horizonte, era operária na mesma Fábrica de Tecidos que meu pai...e que depois de ter gravado um LP de boleros em Belo Horizonte, mudou-se para o Rio,por causa do concurso, foi a vencedora e produzida pelo expert em samba Adelzon Alves, tornou-se conhecida nacionalmente como "CLARA NUNES"...

Fiinal da temporada,Padre Pedro,satis feitíssimo com o resultado; Chamou meu pai e disse que sabia da dificuldade dele pra comprar um acordeon pros 'Mirins do Rítmo" e ofereceu-lhe,emprestados, os Treze contos de Réis pra compra do instrumento, pra ele pagar como e quando pudesse, contanto que a gente continuasse a animar as festas juninas que viriam a seguir; Tocamos mais uns 3 ou 4 anos na Barraquinha das Bahianastodo mês de Junho, gratuitamente e mesmo assim, meu pai economizou e conseguiu pagar os treze contos ao padre, uns dois anos depois; Claro que no ano seguinte eu já tocava o acordeon nas Barraquinhas e na "Orquestrado Brini" junto com meu pai, aos domingos no Clube Belo Horizonte, na Rua da Bahia!

Aecio Flávio
Enviado por Aecio Flávio em 29/12/2006
Reeditado em 23/10/2007
Código do texto: T331439