PECADOS...POR AMOR

PECADOS...POR AMOR

IV

Enquanto tudo decorre com normalidade no mundo da família Adérito, com uma Zulmira empenhada para que tudo esteja bem, uma noiva expectante e um avô, indiferente a essas coisas, Leandro estará entregue ao seu próprio destino, perturbado pela proximidade de Leonilde. Tumultuado pelo seu próprio destino, o que fazer, pergunta-se. O avanço do tempo, ao invés de o clarificar, turva-lhe a razão e a sua sorte poderá estar entregue à emoção, mais que à razão. Seja como for, algo irá acontecer ainda que nem ele próprio o saiba. Os dias vindouros, encarregar-se-ão de lhe retirar o repousante sono ou de lhe abrir a janela para a luz. Por outro lado, Leonilde, congemina estratégias para dentre elas escolher a que a fará vencedora. A cabeça fervilha-lhe e a equação de cada uma delas é ponderada. A noite seria o cenário escolhido para no seu sossego, a reflexão lhe permitir ter mais confiança na escolha. Aqui ou ali, a reflexão seria entrecortada por o piar nocturno de corujas que, segundo a superstição, pressagiariam a morte de familiar próximo ou outra não menos funesta e que lhe fariam lembrar as estórias contadas pela avó materna, Noémia de seu nome e que durante a sua tenra idade fora sua educadora. Cada pio da coruja, independentemente dela se esforçar por não o tomar em consideração ainda lhe faziam recordar as estórias que a avó lhe contava.

A uma semana da data marcada para o casamento, adensam-se as dúvidas em Leandro. Decidir entre a ingratidão para com Célia e o verdadeiro amor ou pelo menos, o mais desejado, o de Leonilde, não é coisa fácil para si. Leandro, tem pautado a sua vida por conduta social apreciável e integridade ética. A sua consciência trá-lo manietado e apenas algo menos provável irá decidir o que fazer. Por outro lado, Leonilde viveu num impasse até à última noite em que um sonho lhe desenhou o caminho a seguir. Crente de que os sonhos se devam concretizar, porque eles, segundo a sua fé, vêm do fundo da alma e dão respostas a dúvidas, desejos ou anseios, não devem ser ignorados. Partindo desta fé e agarrando-se a ela, ficaria decidido o que iria fazer para tentar num último esforço conquistar Leandro. Quando despertou do último sono, um largo sorriso a invadiria de felicidade pelo conteúdo do sonho tido e na verdade todas as suas iniciativas futuras seriam centradas no seu enredo. Para primeira resposta ao sonho, decidiria escreve-lo de imediato, logo que acordou, e sobre ele lançar o seu primeiro esgar de felicidade. Além do sonhado, ela transportaria para o papel um cenário pintado de acordo com os seus maiores desejos. E será sobre o que ficara escrito que as suas “avançadas” iriam sujeitar-se e determinar o curso da investida para reconquistar Leandro. A primeira iniciativa seria avisar Leandro de que iria fazer algo de substancial para o reaver e mais não acrescentaria para não o perturbar mais do que aquilo a que supostamente já o perturbará. Não adiantaria datas nem o modo como irá acontecer, mas tão-só reafirmar que algo irá acontecer. A comunicação aconteceria via e-mail e a resposta de Leandro pouco demoraria a surgir, cheia de interrogações, dúvidas e ansiedade. Leonilde pretendeu com esta medida transferir para ele a decisão final e testá-lo na força do amor que ele sempre anunciou.

A estratégia ardilosamente pensada, está em marcha, e para ela, tornou-se irreversível. Debaixo de claro anonimato e apenas pública para as pessoas indispensáveis para levar até ao fim o “programa” definido, mereceria cuidada atenção e alguns gastos, coisa insignificante para si, em virtude da avultada indemnização recebida por morte do marido.

Na sequência do pensado, contrataria um casal de uma agência de casamentos para levar em mão um bilhete, cujo texto é um teste e um desfio por Leonilde elaborado, o qual seria entregue a Leandro no próprio dia do casamento, no espaço de tempo em que aguardava a chegada de Célia, a noiva. Num momento de discrição e na pele de convidados, abeirar-se-iam de Leandro como que para o cumprimentar e desejar felicidades e entregaram-lhe o bilhete, o qual dizia: Meu querido Leandro. Eis que chegou o momento da maior decisão da tua vida. Não me refiro ao casamento que te espera, mas à oportunidade de amares para sempre quem sempre quiseste. Se no final da leitura deste simples bilhete o teu coração balançar para Célia, segue esse caminho, porque não tenho dúvidas de que a amas, mas se as tuas dúvidas são maiores que as certezas, eu aguardo-te vestida de noiva, sentada no banco traseiro do carro preto que está estacionado na rua que dá acesso à igreja. Sou, a Leonilde que sonhaste para ti.

Escusado será dizer que Leandro ficou absolutamente surpreso e atónito com a proposta. Embaraçado, olhou os falsos convidados e estes, com um claro sinal de olhos indicou-lhes o caminho certo para chegar ao carro. Confiante de que o amor deve superar a razão, discretamente dirigir-se-ia para a noiva que sempre desejou. Os falsos convidados também se afastariam momentos depois com grande discrição e no seu próprio carro com ponto de encontro previamente acordado.

Momentos depois chegaria o cortejo da noiva e quando se esperava que Leandro estaria a aguardá-la, o espanto instalou-se por não se saber da sua presença. Não sobraram rastos do seu desaparecimento nem da presença e fuga do falso casal de convidados. O mistério instalar-se-ia e se alguns alvitravam que ele se arrependeu, outros, nem vaticínio emitiam. A verdade, é que Leonilde nunca foi um nome alvitrado como presença provável no desaparecimento de Leandro. Do que saberia mais tarde é que Célia ficaria para todo o sempre solteira e que a avó pouco tempo mais viveria. Não se sabe ao certo se este episódio teria ou não acelerado a sua morte, mas o facto é que pouco mais de dois meses duraria. Quanto a Leandro e Leonilde, triunfaria o verdadeiro amor, aquele que valorizou o afecto à consciência…

FIM