UM NEM TE CONTO DE ONDE MORO

Um amigo, de cidade longínqua não acreditou quando eu lhe disse que na minha cidade uma empresa de coletivos obteve permissão judicial para operar irregularmente: Sem a documentação necessária, com frota que não atende a demanda, ônibus avariados, horários não cumpridos e com o direito de não aceitar bilhete único. Essa empresa que tem a rejeição de todos os usuários, recentemente fora substituída por outra que vinha cumprindo bem os requisitos da lei, da ética e da ordem pública, graças aos esforços do atual prefeito.

Enfatizo ética e ordem pública, porque além de não cumprir os requisitos legais básicos, a empresa favorecida por um juiz interino provavelmente amigo do dono - não dos eventuais laranjas, mas do dono, que até há pouco detinha o poder público local - comete outros desmandos: Mantém motoristas desqualificados, truculentos e desrespeitosos, especialmente com a terceira idade; não orienta ou prepara seus despachantes para lidarem com tal situação; não disponibiliza pessoas bem educadas no atendimento ao telefone para reclamações. Tem na web uma página com o único propósito de publicidade: Nenhum espaço para comentário, e-mail, "fale conosco", informações de algum interesse dos usuários. Tudo gera revolta, protesto e grandes possibilidades de uma reação popular imprevisível.

O prefeito recente, que foi eleito por uma população inconformada com a ditadura política municipal que reinou até então, tenta reverter o caos em esferas superiores e imparciais. Na cidade não adianta recorrer, porque os gestores políticos anteriores ainda mandam, de alguma forma, nas figuras estratégicas plantadas por eles nas instituições de justiça e nas entidades similares cuja função sempre foi meramente decorativa.

Se tais figuras não só do judiciário, mas também do legislativo de minha cidade não forem expulsas de uma vez por todas, pela mobilização de todos, nenhum prefeito bem intencionado, no entanto só, conseguirá vencer os vícios que regem tudo por aqui. E o meu amigo longínquo ficará mais abismado ainda, quando souber em breve que na minha cidade a arma dos assaltantes e homicidas não é mais o revólver; é a liminar... Os traficantes de drogas e as milícias trabalham com alvará, por força judicial... E a corrupção é um direito inalienável dos três poderes locais.

E se a exemplo do meu amigo, você de outra cidade não acredita no que lê, tudo bem pra mim. Por isso mesmo, classifiquei este relato como um conto... Na verdade, um nem te conto sobre a cidade onde vivo, e que ainda serve para preservar minha integridade física.

Demétrio Sena
Enviado por Demétrio Sena em 04/02/2012
Código do texto: T3479774
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