DELÍRIOS BANAIS DE UMA NOITE SOMBRIA

submersa em si, deixou-se observar frente a espelho seu belo tronco carcomido pelo tempo repousando sob os lábios seus, indefinido silêncio de modo a chatear-se com enfadonha análise. Sem palavras para continuar inderrogável discurso de defesa, repousa os olhos que teve ganho e perde-se nas loucuras da elucubração digna de sua performance mundana. Apanha sob criado pés e pernas, após repouso do corpo em indefinido descanso, sem mesmo ela saber de qual esforço pressupunha oneroso desgaste. Não era de imaginar que diante afável semblante, aturdida pela infeliz experiência noturna, transparece ainda que recalcada pelo preconceito seu, a mais pura cor desta jovial flor obscura. Após horas dedicadas a incrédulo trabalho, porém satisfeita com salário rentável a luxuria que presta-se necessário, torna a reviver emoções de quando criança.

sua melhor época já havia passado, dizia ela a quase todos como era de costume. Adiantava a qualquer conversa prolongada que havia começado jovem, logo após tornar-se mocinha, quando então infeliz galego a resgatou para vida. Ainda acalentada pela ingenuidade, prematura de tudo até mesmo de idade, foi logo realizar os desejos de um importante homem dos negócios. De soslaio observou pelo espelho da penteadeira, tratar-se de um careca barrigudo, dentes ralos e amarelados pelo fumo, recendendo a cachaça de lá de baixo, recebendo-a em seu quarto com atrevido sorriso do desejo.

--- venha cá minha cabritinha --- dissera o moribundo submerso pelo efeito da cachaça --- venha cá minha cabritinha.

dinheiro desde então passou a fazer parte de sua vida de tal forma que forçou-a com o tempo a esquecer-se de sua origem cabocla. Seu maior trauma configurou ser o tempo de sua vivencia, dissera uma única vez. Passou tempo suficiente em meio a fumaça ressequida dos cabarés que embranqueciam a penumbra dos ambientes internos, arraigados de puro malte. Passou a fazer parte dos lugares enrijecida por uma só lembrança a de sua mãe orientando-a.

--- menina, tome juízo nesta vida, pois, não terá uma segunda para endireitar.

toda beleza que reverberava dela não a fez única, tornando-a no máximo diferente das outras, lutando dia após dia contra seu inestimável inimigo, o tempo a traia com inevitável golpe. O tempo, seu fiel inimigo confesso, não ajudou quando quis lhe atribuir à beleza da experiência em troca de visceral aparência. Toma-a de assalto seu eficaz material de trabalho. Diante pele ressequida, murcha, identifica que se alastra por todo seu corpo uma quantia considerável de marcas que atordoam suas jovens lembranças. Por vezes levou no rosto bofetadas que diziam ser de amor, travestidas de pura prepotência de uma masculinidade ainda calcada em tempos remotos. Daquela imagem de uma mulher de fibra ainda restam-se as somas dos ossos dependurados por irrisória maquiagem humana.

já não custa-lhe mais o cansaço de uma vida toda dedicada ao trabalho cujo suor desgastou rosto frente a fome de vingança que a dominava. Vê-se que seu tempo passou, mas ainda reclusa as suas atividades não prestou-se tempo para sucumbir as retaliações de rotineira análise. Procura por fibra da qual dispunha muito quando menina, mas não encontra. Talvez perdeu-se em sua procura ou procure por algo errado, de modo a chegar ao ponto de não lembrar-se mais o que procurava. Esforçou-se, mas esqueceu até mesmo de quem se tratava. A vida a levou pelas mãos.

“foram tantos os velórios que hoje fico pensando, o que seria de nós sem este sublime encontro?”

Jack Solares
Enviado por Jack Solares em 25/01/2016
Reeditado em 21/02/2017
Código do texto: T5522850
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