Passeio na Roça

Em memória da minha avó Quitéria

Ao chegar a roça a tardinha encontrava minha avó de cócoras na soleira da porta a observar o serrote que ficava ao lado da casa depois do chiqueiro das criações.

- Bença minha vó!

- Deus te abençoe meu filho, Deus te abençoe.

- Os bichinhos hoje estão bem assustados, deve ser algum bicho maior do eles.

Ela estava falando dos mocós e preás que faziam um corre-corre no pé do cerrote.

Não comentou mais nada, mas nós dois sabíamos que não era nada daquilo, porém com a falta de chuva e as barrocas do lageiro secando e as cabras tavam dando pra vir beber água nas barrocas .

Quando eu me aproximava a primeira coisa que ela fazia era perguntar por minha mãe depois pelos filhos.

- Entre menino, Binha tá lá dentro fazendo o café.

A casa era de taipa e o chão de terra batido, mas tão limpinho que dava vontade de deitar ali mesmo, ao chegar a cozinha lá estava ela com um imenso sorriso no rosto bonito, que eu não cansava de admirar.

- Bença minha tia!

- Deus te abençoe, como vai o pessoal por lá?

- Tá disposto mesmo a me ajudar amanhã, na batida do feijão?

- Tia vem mais gente?

-. Num sei, eu chamei uns vizinhos pra nos dá uma mãozinha, depois nós ajudamos ele a baterem o deles né?

-. Mas me diga aí, o que é que tem acontecido de bom lá na rua?

-. Me fale do seu pai, ele tem bebido muito?

Há menino! Aquele lá é igualzinho ao seu avô, até parece que é mais velho que a cachaça.

Mas eu não queria falar deles, ali era um dos poucos lugares onde eu me sentia seguro e protejido das carraspanas do meu pai. E tinha mil coisas pra fazer como; armar arapucas pra pegar mocós, tomar banho na lagoa, tirar leite das cabras com ela, ajudar .i há vó a bater lo café no pilão, mas antes disso tudo tinha a quebra do milho e trazer pra dentro de casa, porque podia dá uma chuva de repente e perder tudo.sentei me num tamborete na cozinha e fique espiando ela que terminava de coar o café.

-. Você vai tomar banho? Daqui a pouco vai escurecer!

No fundo da casa tinha um cercadinho de pau a piqui com um purrão de água que ficava bem friazinha e era lá que todos tomavam banho. Quando saí de lá já estava escuro e a vó conversava com ela na sala, no centro uma mesa onde estava o café, um senhor café torrado com rapadura tão forte que parecia uma tintura, cuscuz feito no cuscuzeiro de barro, broa, batata doce e leite de cabra, isso sim era um manjar dos deuses.

Sempre achei que ela tinha um jeito todo especial de amar a tia Binha, talvez porque ela tenha sido a única a não debandar pra cidade deixando a sozinha na roça.

Mas eu sou suspeito pra dizer qualquer coisa, já ela era a mais nova da mais bonita das cinco irmãs e eu a adorava, além de ser a única que conversava comigo e me levava pra rua na garupa da égua Branquinha.

Mas nem bem descansei direito já tava na hora de ir dormir. A minha rede armada na sala a minha espera, ia demorar a pegar no sono pois ficava muito apreensivo nesses dias , com as tarefas do dia seguinte, sem contar com a espectativa de que o tio Gerson aparecesse, pois ele era vaqueiro numa fazenda vizinha.

Um dos meus sonhos era pegar um Cancão que ficava cantando. Um bosque pão lado do cerrote um pouco antes de chegar na casa.

Embora tivesse a certeza que logo o soltaria porque eu não entendia como era que o Cancão do padrinho Amarílio cantava tanto se estava preso.

Quando minha avó adoeceu foi nescessário leva lá pra cidade por esse tempo eu não estava de férias da escola e não ia com frequência na roça, então de repente ou quando dei por mim estava sentindo a falta dela e das coisas da roça e sente que nunca mais ia poder montar na égua Branquinha e ficar agarrado a cintura da minha tia favorita.

Depois que minha avó morreu, eu não sei como mas tinha a convicção que as pessoas que mais sentiram foram a tia Binha, a tia Maria e a minha mãe.

A família que já não era um exemplo de união desgarrou se de vez e cada um fechou se no seu mundo na verdade bem pequeno, mas repleto de mágoas egoísmo, uns pensando que tinham o rei na barriga, outros que eram donos do mundo.

Se minha querida avó estivesse viva eu perguntaria a ela o que ela achou da prole que trouxe ao mundo.

Embora a resposta alguns saibam , ela que sofreu a vida toda espero que Deus a tenha na paz Dele, já que não teve por aqui.

Fernando Alencar

24/12/2008

Fernando Alencar
Enviado por Fernando Alencar em 25/12/2021
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