A CARTOMANTE

Depois que o namorado da Ritinha terminou o namoro com ela, esta ficou muito contrariada. Sua contrariedade era maior, em virtude de não ter sido ela que tivesse terminado o namoro.

Alex, seu irmão, quando soube do acontecido, veio falar com a irmã, acompanhado da namorada que, ao saber do acontecido com a Ritinha, propôs:

- Rita, fiquei sabendo que há uma mulher em São Domingos que põe cartas e, segundo dizem, ela acerta tudo. Vamos visitá-la para saber sobre nosso futuro?

Às vezes a curiosidade torna-se mais importante que o bom-senso e, sendo assim, os três resolveram deslocar-se até a cidade para consultar a cartomante que foi tão bem recomendada.

Nenhum dos três sabia o endereço da mulher. Mas a cidade era pequena e, como diz o ditado, “quem tem boca vai a Roma”, resolveram arriscar e ir até o vilarejo para consultar a tal mulher.

Alex, depois de dirigir por mais de meia hora por uma estrada de terra, esburacada e com muita poeira chegou a São Domingos.

A cidade fica no estado do Pará, às margens da Rodovia Transamazônica.

Em virtude da distância e aproveitando a oportunidade do dia de sábado, resolveram que todos fariam uma consulta com a mulher.

Alex, por ser homem, seria o primeiro a ser atendido. O problema continuava a ser descobrir o local onde a mulher morava, já que não tinham o endereço dela. Como não sabiam, iriam perguntar aos moradores locais que, decerto, saberiam informar-lhes o local onde a cartomante morava.

Logo que passaram pelo posto de combustível que ficava na entrada da cidade, na rodovia Transamazônica, pararam um transeunte que vinha em sentido contrário, pedalando a bicicleta.

Alex, com toda a educação, falou:

-Bom dia, o senhor sabe onde mora uma mulher que põe cartas?

O morador da cidade, acostumado com perguntas de pessoas que não conheciam a cidade e querendo ajudar os visitantes, informou-lhes da seguinte forma:

- Você vai seguindo por esta rua até chegar num pé de manga; quando chegar lá, vira á esquerda e segue até encontrar a pensão da dona Maricota. Na pensão pergunte lá que todo mundo sabe.

A informação pareceu dar uma injeção de ânimo ao trio que, após a ouvirem , sorriram.

Foram seguindo, olhando atentamente para não se perderem e cada um dos três guardava com detalhes as recomendações do homem que havia sido interpelado no caminho.

Ao chegarem à mangueira, notaram que esta se encontrava repleta de frutos, mas que ainda se encontravam verdes. Ainda era o mês junho.

Seguindo as instruções recebidas, viraram à esquerda e foram seguindo até chegar à pensão da Maricota. A casa antiga parecia que nunca tinha sido pintada, estava bastante estragada. Bem perto do telhado uma tabuleta indicava o local.

Aconteceu, no entanto, que a porta da pensão naquela hora do dia encontrava-se fechada e não havia ninguém para informar o endereço da mulher que eles procuravam.

Ainda era bem cedo.

Nos fins de semana alguns moradores costumam dormir um pouco mais.

Se fosse domingo, haveria mais gente na rua. A missa dominical obrigava muitos a se levantarem cedo. A vida no interior é diferente das grandes cidades.

Meio desanimados e frustrados, tentavam encontrar alguém que lhes complementasse a informação que haviam recebido anteriormente.

Alex ligou o carro e saiu do local, dirigindo bem devagar, tentando encontrar alguém que pudesse dar-lhe a informação de que precisava.

Quando já pensava em desistir, viu, sentado na calçada, numa casa bem mais à frente, um senhor de idade, que soltava suas baforadas de fumaça do cigarro de palha que acabara de acender. Na calçada alta, os pés do ancião balançavam, enquanto ele ouvia o rádio de pilha que se encontrava a seu lado.

Aproximaram-se devagar para não levantar poeira. Nenhuma rua da cidade tinha asfalto. Parou o carro e, após sair do veículo, dirigiu-se ao ancião e perguntou:

- Bom dia, moço, o senhor sabe onde mora uma mulher que põe cartas?

- Claro! Respondeu o homem. Siga em frente e logo que passar aquela casa de cor amarela, tem outra casa de cor azul, desbotada. É lá que ela mora.

Todos se olharam e sorriram e foram andando rumo à casa.

Chegaram ao endereço indicado e notaram que nenhum movimento havia.

O Alex bateu palmas. Não havia campainha. Este costume é comum nas cidades do interior.

Surgiu uma mulher morena, baixa, cabelos corridos, bastante obesa. Ao ver os jovens em frente a sua casa, perguntou:

- O que vocês desejam?

- Rita, que parecia naquele momento mais interessada em saber sobre o seu destino, foi logo perguntando:

- É a senhora que põe cartas?

- Sim, respondeu ela, por favor, entrem.

Ao entrarem, notaram que havia uma mesa velha no canto da sala com alguns papéis espalhados sobre ela. A casa tinha poucos móveis na sala.

Entraram e ficaram em pé, esperando que a cartomante convidasse o primeiro para a consulta. Mas ela continuava em pé, sem falar nada. Então Rita perguntou:

-É aqui mesmo que a senhora põe as cartas?

-Claro! Você trouxe as cartas?

Naquele momento os jovens ficaram encabulados. Não sabiam que tinham que levar o baralho para que a cartomante fizesse a consulta. Imaginava que ela tivesse as próprias cartas, por isso Rita perguntou mais uma vez:

-A senhora não tem as cartas aqui?

-Não, minha filha, você tem que trazer. Afinal não existe carta pronta. Você tem que escrever. Eu apenas ponho as cartas.

-Escrever? Como, a senhora não tem o baralho pronto?

-Baralho, que história é esta? Eu apenas coloco as cartas no correio.

Ao ouvirem a última frase, começaram a rir e, mesmo sem jeito, foram pedindo desculpas pelo engano e saíram da casa.

Quando o carro foi ligado, Alex acelerou o mais que pôde. Não queria que alguém soubesse do grande mico que haviam pago.

A mulher que punha cartas era apenas uma agente dos correios do pequeno povoado. Talvez houvesse até uma cartomante na cidade, porém os enganos e os erros os haviam levado àquela casa. Restava somente desistirem e irem embora para não correrem o risco de serem descobertos.

Somente dias depois tiveram coragem de contar aos pais o fiasco do ocorrido.

Dois anos depois, quando uma amiga de Rita convidou-a a visitar uma cartomante para saber sobre o seu futuro, esta perguntou:

-Em que cidade ela mora?

-É aqui mesmo, por quê?

Rita não queria que a amiga soubesse do mico que pagara, então disse:

- Não é por nada, somente por curiosidade.

E segundos depois começou uma sonora gargalhada.

A amiga, sem nada entender, apenas sorriu.

27/08/06-VEM

Vanderleis Maia
Enviado por Vanderleis Maia em 20/09/2006
Reeditado em 11/04/2009
Código do texto: T244604