O Grande Tarô de Waite

É possível que pensemos duas vezes antes de cometermos a mesma burrada? A mesma burrada...que irônico!

21:41. Yakisoba vegetariano. A hélice do ventilador movimenta-se forte. Faz calor. Sempre faz, na real. Digo, aproximando-me da Física. Estou no Hell de Janeiro. Isso talvez seja mais descritivo. Uma mesa bagunçada, livros, muitos livros, baralhos, copos, café, algum tipo de molho que não possui nome, apenas sabor. Discuto com Freud:

Tudo que inquieta, me evoca. O meu Espírito tem disso. É com certa dose de pessimismo que nos enamoramos das flores que murcham em buquês que os amantes costumam dar às pessoas amadas. Isso me é horrendo, tomar da vida de uma flor para expressar o seu Amor - quão cruel pode ser a vida, não?

Bom, não é de Amor que eu quero tratar. Deixo isso para quem quiser se debruçar sobre o tema. Sugiro a leitura de Nelson Rodrigues antes, ou Canção de Amor, de Gibran Khalil Gibran.

O leão lança-se sobre o cervo, e eu me lanço sobre o faustoso benefício da dúvida. Acerca de quê? Calma. Caaaaaaalma.

Vocês, que talvez já tenham escutado uma ópera silenciosa, se afogado na mediocridade de uma alegoria sanativa do drama, ou se insulado nos imperceptíveis traços de um pincel, desculpem-me a sinceridade, ou melhor, não me desculpem por nada, perderam horas de leitura, pois nada compreenderam, senão voltaram os olhos a um amontoado parafusento de palavras.

Eu digo que isto tudo não significa nada. Uma leitura sagaz compreenderá que a resposta mais perspicaz, pode se tratar do silêncio: tudo diz nada dizendo. Quem rege a dupla negação?

Bom, assim pensamos estar pensando. O que é o pensamento? Seria algo apavorante, um bicho papão que não nos deixa dormir? Seria o sintoma de nossa esquizofrenia mais brutal? Somente nós, seres humanos, pensamos. Essa proposição te parece sensata? Óbvio! O que torna essa proposição óbvia? Há lugar para o óbvio na existência?

E se o pensamento, em outros corpos, se transfigurasse em modos diferentes de se servir desse significante, tais como um olhar sem pestanejar por alguns minutos, um buscar-coçar pela pulga que incomoda o corpo, um abanar de cauda mais frenético, um ronronar apaziguador? Quem pensa que pensamos, senão nós, exatamente aqueles que afirmam que somente nós pensamos?

Além do mais, não seria ousado da nossa parte pensar que pensamos sem ao menos pensarmos no que vem a ser o pensamento?

Vidas somam-se, e, enquanto se somam, somem. Já não são mais as mesmas. A isto chamamos de convívio.

Imagino que você, com a sua tentativa de me dar uma atenção mais aguçada, vez ou outra se veja pensando naquela pessoa. O que isto significa? Depende. Há quem pense na pessoa amada. O que seria uma pessoa amada? Eu amo as pessoas que compõem aquilo que designo como círculo de amizade, assim como aquelas que compõem aquilo que designo como círculo familiar, círculo dos conhecidos, círculo do trabalho, etc. Tá, mas todas essas pessoas não compõem, de certa forma, o mesmo círculo, ou, mais apropriado, o mesmo conjunto? Se todos esses círculos comportam tais elementos (as pessoas, os animais, as plantas - por que não amaria uma planta? Talvez por ela não ser recíproca, consideraria o Espírito mais mesquinho), tratam-se de conjuntos. Tá, então o meu Amor resume-se num conjunto de conjuntos - e eu não diferencio pelos conjuntos, senão pelo conjunto.

Do auge do meu abuso linguístico, digo que essas criaturas me são criaturas de estimação, aquelas pelas quais guardo algum tipo de estima. Assim as considero.

Talvez se arranje na cabeça de muita gente como se eu fosse algum tipo de zoófila, ou fitófila, recalcada.

Imagino, diz o senhor Freud, penteando a barba com os seus dedos grossos, que de tão grossos, creio eu, jamais se depararam com a sensação do uso aparatoso, ou não, de um anel. De certo, deve estar prestando atenção muito mais na barba do que em mim, me lançando um olhar de soslaio vez ou outra, em prol de uma encenação de importância, considerando o que eu dizia, tão somente mediante um gancho linguístico, não?

Sim, diz, quase assobiando, o senhor Freud.

Para algumas pessoas pode soar jocoso, ou até mesmo ofensivo, pois se consideram diferentes - na acepção sepulcral e mórbida de um diferencialismo, da afirmação do binômio eu-outro como algo em si, dado, a-histórico, e independente da cultura, das relações sociais- de animais, plantas, e de outras pessoas. Que são diferentes, disso não discordo. Discordo do fato de se ter que afirmar essa diferença full time. Me embrulha o estômago, e o cozinha em fogo baixo num auditório do master chef. Talvez isso se deva aos sábados compartilhados ao som de risos que desabrochavam à mais serena fotossíntese com as cenas de Monty Python. Talvez eu devesse chorar agora, e dizer que sinto saudades. Saudade não se trata somente de falta. Chorar não é sinônimo de fraqueza.

No fim das contas, dessas voltas todas que dei, talvez eu ainda aprenda a dizer, sem muito masturbar o intelecto, ou parafusear a cabeça dos outros, que ainda penso em ti.

E talvez você leia.

Freud ri.

Termina a sessão. Um tédio. Tudo o que eu disse, será tão eficiente quanto cream cracker no momento da fome, ou um Gato de Schrödinger. Talvez mate a fome. Talvez o gato esteja vivo. Na tentativa de sanar a minha dúvida, talvez eu o mate, e a dúvida permanecerá.

Dedicado àquela pessoa que se deita - ou tenta- antes de 20:30h, que gosta de chá, e Futurama.

Inaê Diana Ashokasundari Shravya
Enviado por Inaê Diana Ashokasundari Shravya em 08/02/2017
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