FILHOS DA NOSSA OMISSÃO

Ontem, ao andar pelas ruas do centro do Rio, fui abordado por um moleque de rua que, como um louco, me chamava de pai.

– Cale-se, moleque! Não te conheço. Nunca te vi! Nunca, ao menos, imaginei a tua existência – afastei-me dele.

Realmente seus atos eram de um louco desvairado – pude perceber.

Ele agarrou-se à minha roupa e continuou a gritar:

– Escute, moço, você é o meu pai, eu sou seu filho!

– Não sou casado. Nunca tive uma mulh... – hesitei em responder minha intimidade – nunca, ao menos, me preocupei em saber que alguém assim existia.

– Mas você é o meu pai, eu sou filho do mundo, filho de todos aqueles que não se preocupam comigo, e com tantos que vagam sem destino pelas ruas.

Poucos instantes depois um policial o levou pelo braço. Ainda bem, não mais tive que ouvir aquele estúpido me chamando de pai. Sou somente mais um elemento na sociedade.

E o moleque, sendo levado para uma instituição – que é o local ideal, ao meu ver – continuou a gritar:

– Este policial também é o meu pai... aquelas mulheres, são as minhas mães – o atrevido, como que a desafiar-me, continuou com aquela insistência maluca enquanto apontava para umas madames.

Cheguei em casa, tomei meu banho, jantei e fui assistir a TV. Depois, como de costume, iria dormir e sentir como a vida é boa para mim. Deveria esquecer aquele moleque. Não deveria mais me preocupar com um pequeno vândalo a me abordar e a me chamar de pai. AH, SE EU DEVO ME PREOCUPAR COM “LOUCOS” QUE VAGAM NAS RUAS?!

Carlos Alberto de Carvalho

Todos os meus trabalhos estão registrados na Biblioteca Nacional-RJ

carlos Carregoza
Enviado por carlos Carregoza em 29/09/2006
Código do texto: T252156