Nós só temos essa vida para vivermos...

O Jardineiro foi exilado para uma terra distante no futuro, a nostalgia foi sua companheira por muito tempo naquele longínquo lugar, fotografias eram a únicas coisas que tinha do seu lar, pois mesmo que quisesse era impossível voltar.

Na pressa da sua fuga ele havia perdido momentos preciosos com as pessoas que ele amava muito,era impossível reaver esses momentos.

A terra de Futura era uma copia envelhecida do seu mundo e por mais que tentasse viver ali, a saudade da terra de Pretérita lhe atormentava, os sorrisos eram diferentes a felicidade era mais felicidade na sua querida Pretérita.

A principio ele pensou ser apenas bobagem da sua cabeça, e lutou com todas as suas forças para fazer de Futura seu lar. Quando estava prestes a aceitar a realidade de Futura, ele percebeu a coisa mais dura e cruel daquela terra, as copias envelhecidas das pessoas que amava desapareciam, iam embora sem dizer pelo menos adeus.

O Jardineiro abriu seu velho baú, pegou sua empoeirada câmera fotográfica e fotografou toda a terra de Futura, fotografou as cópias de sorrisos envelhecidos, os vendedores de pássaros que passavam frequentemente na sua rua, fotografou a sua casa azul desbotada e seu jardim, assim poderia ter essas coisas para sempre em sua lembrança.

Naquela tarde sentou-se no seu banco favorito, pessoas passavam a sua frente, mas ele parecia só, com sua tristeza, por quê Pretérita talvez já não existisse mais e a terra de Futura era um mundo que não se podia confiar, pois mudava rapidamente, nem mesmo as coisas rotineiras da natureza era as mesmas nessa terra.E naquele banco envelhecido tão parecido com o da sua terra, enquanto olhava uma de suas fotografias, que ele viu no seu jardim uma pequena flor desmaecida e maltratada, correu para sua casa - terei um novo passatempo, pensou – ele se compadeceu dela e durante um mês inteiro, dia e noite cuidou da pequena flor até o momento que ela abriu os olhos vagarosamente e fitou o jardineiro :

- Olá!

- Olá! Qual o seu nome? – perguntou ele.

- Eu sou um Amor-perfeito!

- Pois muito bem Amor-perfeito, precisa descansar você ainda está muito debilitada!

- Onde eu estou?... Ahhhh! Estou com tanto sono...

- Você está na terra de Futura!

- Metade do caminho... talvez... eu... mude...

-Durma você precisa descansar!

E Amor-Perfeito adormeceu. Jardineiro pôs água nas suas raízes mais uma vez e a fotografou, sabia como as coisas mudavam rapidamente em Futura, queria ter uma lembrança de Amor-Perfeito.

A cidade de Futura continuou aquela noite sua marcha ininterrupta de mudanças, a nova manhã chegou para Jardineiro com o perfume de mil rosas que tomava conta de sua casa chegando até seu quarto, a voz doce como de um anjo tocava seus ouvidos, ele abriu a porta e lá estava Amor-Perfeito desabrochada, seus cabelos eram vermelhos como o carmesim, pele branca como lençóis alvejados, coberta apenas por suas sépalas, ela cantava e sua voz doce enchia todo o ambiente, ele olhou bem dentro de seus olhos de mel e disse:

- Bom dia Amor-Perfeito!

- Bom dia meu salvador! – respondeu Amor-Perfeito.

- Como você amanheceu hoje?

- Muito bem! O dia mais importante de uma flor e o dia de seu desabrochar.

- Então temos que comemorar!

- Não tenho tempo... E além do mais não sei ainda teu nome! – disse ela sorridentemente.

- Além de salvador, também me chamam de Jardineiro – ambos sorriram.

O dia foi maravilhoso para Jardineiro como eram os dias em Pretérita e foi assim nos dias seguintes, a sensação de estar na sua terra pairava no ar, ele percebeu que a nostalgia que congelava seu coração estava degelando. Ele sabia que Amor-Perfeito era a responsável por sua felicidade.

Amor-perfeito contava-lhe seus sonhos de como queria peregrinar por todo o mundo e conhecer outras terras, ele não entendia como uma flor que nunca tinha saído do seu canteiro ate o dia do seu desabrochar podia ter tantos anseios. As noites ficaram mais divertidas, Jardineiro ensinava Amor-perfeito a tocar alaúde e ambos cantavam ate adormecerem.

Havia-se passado um ano desde que Amor-perfeito tinha desabrochado e a tristeza havia desaparecido do cotidiano do jardineiro, ele a amava.

- Amor-perfeito você é feliz vivendo comigo?

- Eu acho impossível alguém ser feliz vivendo em Futura meu Salvador!

- Eu descobri a felicidade quando você chegou aqui... eu...

O sorriso de Amor-perfeito enchia toda a sala

- Eu te amo Amor-perfeito...

O sorriso se desfez...

- Eu preciso partir meu Salvador...

- Eu disse algo que não devia?

- Meu Salvador... – a voz dela era doce e meiga - estou numa jornada, apenas estava adiando esse momento.

- Mas você nasceu no meu jardim...

- Eu já fui uma semente, você não imagina por onde o vento me trouxe na minha jornada antes de nascer no teu jardim.

- mas...

- Ah! meu salvador... – ela o abraçou – seria muito fácil se eu não tivesse a obrigação de uma flor, eu viveria a teu lado pra sempre, mas eu sou o que sou e não posso mudar isso,desde de sempre as flores percorrem sua jornada pela estrada da Realidade ate a terra da Eternidade,eu não posso ficar...

O dia da partida de Amor-perfeito havia chegado, o mundo começava a pintar-se de cinza novamente para o Jardineiro e mais uma vez ele vivia de uma lembrança, a lembrança do acenar de mãos de seu amor no portão da estrada da Realidade.

Amor perfeito não existia mais em Futura, seu lar agora seria a terra feliz de Eternidade.

Ele voltou a viver com suas fotografias, sentava no mesmo banco envelhecido todas as tardes a ver os vendedores de pássaros.

No quinto dia da partida de amor perfeito ele viu dois bem-te-vis pousando no chafariz da praça e do seu banco ficou a escutar a conversa dos dois:

- Sabe bem-te-viiii?

- Sei bem-te-vi

- Esse ano bem-ti-vi

a safra foi boa bem-ti-vi

no caminho da realidade bem-ti-vi

- Flores bobas bem-ti-vi

- Muito bobas bem-ti-vi

Jardineiro se aproximou dos pássaros:

- Do que vocês dois estão falando?

- Podemos contar pra ele bem-ti-vi

- Não vejo porque não bem-ti-vi

- Ele não deve morar a muito tempo aqui bem-ti-vi

- Não mesmo bem-ti-vi

Os dois pássaros voltaram-se para o jardineiro

- Estamos falando da colheita ,bem-ti-vi

- Da colheita que fazemos no caminho da realidade bem-ti-vi

- Mas vocês não foram vendidos pelos vendedores? Onde estão os donos de vocês?

- Bem-te-vi! bem-te-vi! bem-te-vi! bem-te-vi! – Grande alvoroço fizeram os pássaros – Você não entende bem-te-vi!

- Os homens que acompanha bem-te-vis, não são vendedores bem-te-vis, mas bem-te-vis são guias deles, em troca bem-te-vis recebem sementes, e durante a jornada bem-te-vis contam historias pra sementes e plantam sementes bem-te-vis.

- E que historias vocês contam?

- Bem-te-vi fala pra ela seguir sua jornada pra terra de Eternidade bem-te-vi

- Pelo caminho da realidade bem-te-vi, ai bem-te-vis colhem as flores

- A terra de Eternidade não existe bem-te-vi!

Ao ver a fúria no rosto do jardineiro os dois voaram rapidamente, e ele correu com todas as forças de suas pernas para o portão da estrada da realidade, a placa da estrada proibia a passagem de humanos, ele atravessou o portal o ar do outro lado parecia mais e mais pesados a medida que ele avançava estrada a dentro,a lama da estrada parecia criar vida e prender seus pés,ao longe ele avistou amor-perfeito caída ao chão,continuou lutando e a cinco metros dela ele caiu e começou a se arrastar na sua direção, já perto estendeu o braço e entrelaçou seus dedos aos dedos de Amor perfeito .Ela abriu os olhos vagarosamente:

- Oi meu salvador... – falou com a voz fraca

- Os passaros...

- Você... não deveria ter vindo... a estrada é mortal para... os humanos ...

- Eu pensei que chegaria a tempo...

- Minha jornada... é uma mentira... eu ouvi os pássaros... tripudiavam de... mim... a terra da Eternidade não exis...te – e dizendo esta ultima sílaba fechou os olhos para sempre.

Jardineiro com os olhos eclipsados morria aos poucos, as lembranças do ano que viveu acompanhado por Amor-perfeito vinham a sua mente,só então percebeu que os bem-te-vis estavam errados, a terra de Eternidade existia e ele havia vivido um curto período de trezentos e sessenta e cinco dias naquela terra.

Morgan Luther,noite de 16 de setembro de 2011.