A NAVE DO TEMPO

Depois de mais de cinco horas, resolveu ir embora. Levantou-se e se dirigiu à porta de saída, evitando assim, ficar mais tempo naquela sala. Lugar que parecia, desde o começo, ser seu calvário. Já viajara a tantos lugares em tão pouco tempo e agora se sujeitara a esperar além do normal. A burocracia era um entrave à evolução.

Olhou a recepcionista que se encontrava à sua frente e, sem dizer nada, apenas se levantou e retirou-se, como se nada necessitasse falar. Era como se as palavras não precisassem ser faladas, apenas pensadas.

No momento em que ia sair, lembrou-se de que estava faltando algo. Retornou ao lugar em que estivera sentado e achou o que procurava. O objeto estava em cima do braço da poltrona. Ainda bem que se lembrara a tempo, pois seria muito embaraçoso se tivesse esquecido algo tão importante.

Por diversas vezes olhara suplicante a secretária, que se encontrava à sua frente, como se pedisse que alguém pudesse atendê-lo. Necessitava falar o que julgava ser interessante e necessário para diminuir de vez os problemas que afligiam a humanidade.

A secretária, no entanto, sorria com jeito doce e baixava os olhos de volta aos seus afazeres, que se resumiam em ler um pequeno livro que se encontrava aberto sobre a mesa.

Em frações de segundo, imaginou o problema que poderia ser ocasionado se o aparelho viesse cair em mãos de pessoas erradas ou que não soubessem manuseá-la.

Naquele momento, sabia que teria de tomar mais cuidado. Era necessário não cometer erros.

Olhou atentamente o objeto que estava colocado dentro do enorme tubo de papelão que se encontrava à sua frente, fechou a tampa e, colocando-o debaixo do braço novamente, se se dirigiu para a porta da saída.

Muitas oportunidades havia perdido a humanidade, por falta de atenção ao que ele queria falar. Os terrestres ainda teriam que esperar muito para chegar àquele estágio de evolução.

Aquela nave espacial portátil era algo que a humanidade ainda nem imaginara. Alguns milhares de anos seriam necessários para que pudessem criar algo semelhante.

Com ela, havia viajado em todas as direções do universo, as distâncias não existiam e o tempo passara a ser mera conjectura de ordem filosófica.

No entanto, estivera naquela sala de espera, tentando falar com o chefe da repartição por mais de cinco horas e nem ao menos inventaram uma mentira para poder mantê-lo contente e pudesse esperar por mais tempo. Coisas com que já se acostumara em sua estada na terra.

A secretária, durante aquele tempo, apenas lhe servira dois copos com água e um cafezinho meio frio e muito doce, o que tornara insuportável de ser ingerido por alguém que já conhecera quase todos os sabores e paladares do universo.

Em viagem que empreendera, descobrira o sentido de tudo e por qual motivo viera aquele aparelho às suas mãos. Tentou fazer com que as autoridades pudessem usufruir dele. Queria ofertar o conhecimento que obtivera em suas viagens. Os humanos poderiam copiar as boas experiências que eram usadas em outros mundos. Sabia que seria difícil, o homem não gosta da verdade. São raras as exceções.

Quando já estava para se retirar daquele ambiente que o recebera com menosprezo, lembrou-se das palavras do governante de um planeta que visitara. ”Será uma tarefa árdua e difícil, não espere elogios”. Em sua mente, vieram as lembranças de tudo que vira e não podia falar ou comparar com nada que havia na terra. Sentia-se como primitivo, habitando um mundo ainda num estágio de completa barbárie, quando comparado com outros mundos visitados por ele.

Soube, através do governante daquela raça, que ele viajara milhares de anos-luz, em segundos. Estes fatos poucas pessoas poderiam acreditar serem possíveis, em razão de apenas viverem dentro de conceitos preconcebidos de tempo e espaço.

Era um enviado, um escolhido que recebera os meios de ir e vir, viajando através do tempo e do espaço. No entanto, ficara mais de cinco horas esperando, sentado para falar com um chefe de repartição. Nesse mesmo tempo poderia ter visitado muitos recantos do universo. Durante aquele tempo aprendera a exercitar a paciência.

Lá fora, o sol estava quente e era natural naqueles dias de verão, quando a chuva se anunciava nos fins de tarde e de forma turbulenta.

Olhou o relógio e notou que já passava das cinco e meia, por isso deveria andar rápido, tinha que partir. Deveria seguir para um planeta que ficava, segundo os padrões humanos, fora da Via Láctea mais de 150 mil anos-luz.

Voltaria àquele lugar, onde a vida passara a ser uma referência para todo o sistema que girava e pulsava naqueles confins do universo.

Quando se lembrou do termo universo, passou por sua mente uma imagem invertida de tudo que podia ver. Sabia que o homem ainda não conseguia entender as noções de espaço/tempo e, tampouco, o que vinha a ser uni-verso. Tentara algumas vezes falar para conhecidos sobre o significado de tudo o que sabia, mas ninguém queria preocupar-se com nada que não fosse apenas seu próprio umbigo. Alguém até lhe dissera: Filosofia não enche barriga de ninguém.Quanta ignorância ! A humanidade terrestre está presa ao materialismo. O seu futuro é incerto.

Para o homem que está limitado e acostumado à mente concreta, é difícil entender o significado do que grotescamente conseguira colocar com suas palavras, tentando explicar o que ele entendia por uno e por seu contrário. O conceito do abstrato não encontrava respaldo nos homens.

Desceu os cinco degraus da escada e chegou à rua que estava bastante movimentada naquele momento. Nuvens negras apareciam e indicavam que deveria haver, em pouco tempo, forte chuva.

Enquanto andava, levava debaixo do braço o tubo de papelão. Sentia-se como se fosse um arquiteto. Vira diversas vezes essa pitoresca figura carregarem tubos, com seus projetos, num misto de orgulho e certa vaidade. Era como o policial que fazia questão de mostrar a arma que portava.

Enquanto andava, notou que cada vez mais as nuvens se adensavam e tornavam o tempo ainda mais escuro, o que o obrigou apressar o passo, pois não queria sair correndo pelas ruas, fugindo de águas que poderiam cair a qualquer momento.

Tinha que chegar a casa o mais rápido possível. Queria empreender nova viagem. Iria s encontrar-se com o ser que lhe havia confiado a nave.

Iria explicar as dificuldades que estava encontrando na terra e como estava sendo difícil vencer as barreiras da ignorância do preconceito e do próprio medo.

Talvez conseguisse, através da sabedoria do dirigente, palavras mais eficazes que pudessem ser mais convincentes perante os terrestres, que sempre o tratavam como se fosse um louco e sonhador. O que sempre falava chocava-se com as mentiras que haviam sido colocadas na sociedade durante muito tempo. Lembrou-se de que já fora vítima desta mesma falácia.

Quando chegou ao prédio onde morava, os primeiros pingos de chuva caíam, eram trazidos pelo forte vento que soprava do leste. Aquela poderia ser uma chuva forte, pois trazia os ventos do mar, carregados de umidade. As mudanças que estavam ocorrendo no planeta logo seriam sentidas por todos.

Entrou no elevador e quando chegou ao seu apartamento, apressou-se, pois o adiantado da hora exigia que preparasse a nave para mais uma viagem. Precisava de conselhos e sugestões de como deveria enfrentar a estupidez humana. Além de tudo sentia-se cansado e precisava revigorar seu corpo. Sempre que retornava, vinha revigorado.

Chegou à sala e depois de certificar-se de que tudo se encontrava trancado, abriu o canudo que media um metro e meio por 20 centímetros de diâmetro e retirou o aparelho que já possuía há algum tempo. Mas somente há pouco tempo descobrira o seu valor e para que realmente servia. No seu pensamento, sempre definia o aparelho como uma nave espacial portátil.

Lembrou-se da primeira vez que manuseara o aparelho. Achara parecido com um teodolito, porém com algumas diferenças, que julgou serem apenas em razão de alguma marca nova ou modelo.

Tirou o tripé do cilindro e montou as hastes da forma como sempre fazia. Após verificar todos os detalhes necessários, colocou o aparelho sobre o tripé, encaixando-o de forma suave. Parecia um teodolito e filmadora, com sete anéis que giravam em todas as direções. Cada posição ou combinação em que eram colocados os anéis, criava uma coordenada e direção que deveria ser trilhada.

Durante suas pesquisas, lembrou-se das palavras do mestre que lhe doara a máquina. Sabia que poderia criar milhares de combinações diferentes, porém apenas pouco mais de 10.000 caminhos poderiam ser usados.

Segundo o mestre, as outras combinações eram ainda apenas possibilidades que seriam abertas apenas no futuro. Eram caminhos que ainda não poderiam ser trilhados. Representavam perigo para quem não conseguisse transpor com consciência os portais dimensionais. Os locais existentes ainda não poderiam ser visitados, por isso estavam bloqueados. Mesmo que a posição nos anéis fosse colocada, quando a chave era acionada o círculo não aparecia. Então ele sabia que o caminho não poderia ser buscado.

O aparelho era fascinante e toda vez que o montava sentia-se como se fosse uma criança manuseando um brinquedo que nunca vira antes. Todas novas descobertas eram acrescentadas ao seu conhecimento que aumentava à medida que percorria os caminhos abertos no espaço.

Visitara planetas de quase todas as regiões do universo e sempre se maravilhava com as novas perspectivas que se abriam diante de si. Quando percorria um novo caminho, encontrava sempre novas formas de existência.

Suas viagens poderiam trazer grandes benefícios para toda a humanidade, no entanto não fora recebido pelo chefe do poder que nem se dignara saber qual seria o assunto.

Os humanos, ainda presos que estão aos seus valores, julgam ser os maiores sabedores das verdades, no entanto ainda não conseguem conjugar o primeiro verbo que deveria ser usado em todos os momentos: AMAR.

O principio que rege todos os universos e galáxias é dirigido por valores que seguem sempre a mesma direção em qualquer parte. Todos os seres conscientes procuram servir ao semelhante como se tratasse de parte de si mesmo. A competição é apenas uma lembrança de um passado distante no tempo.

Em todos os lugares encontrou respeito, amor e equilíbrio entre os reinos. Desde os mais primitivos, até os mais evoluídos tudo é perfeito e harmônico e visa sempre servir a todos com igualdade.

Baseados nestes princípios, o mestre solicitou que ele transmitisse aos homens da terra as vantagens de poder usufruir os benefícios da nave. Através dela poder-se-ia melhorar em todos os sentidos a vida dos seres vivos do planeta. As inovações poderiam trazer para os habitantes do planeta benefícios diversos.

Depois de tantos pensamentos que vinham à cabeça, acionou o dispositivo nas coordenadas que havia escolhido previamente para abrir o portal.

Após a chave ser acionada, surgia numa distância de mais ou menos três metros, uma luz de cor esverdeada como se fosse um verde leitoso em forma de círculo que tinha como finalidade servir de passagem para as viagens através do espaço.

Parecia ser uma projeção holográfica que se formava perto da máquina e que servia de nave. Ela poderia levar qualquer um a qualquer direção do espaço, sendo dirigido através das coordenadas que eram colocadas nos anéis que a compunham.

O tripé que servia de sustentação com suas hastes parecia ser de alumínio dourado com anéis luminosos que acendiam e brilhavam quando a chave era acionada e que formava o campo que servia de transporte para os viajantes.

Toda vez que via a projeção que se formava dentro da sala ficava imaginando quanto tempo teria sido necessária para que aquele povo desenvolvesse máquina tão magnífica.

Quando ia entrar no círculo verde e luminoso, ouviu uma batida na porta e mais que imediato desligou a máquina. Depois de desmontar todas as peças, colocou-as dentro do tubo e guardou-a mais que imediato dentro do maleiro do armário.

Com toda a rapidez que era necessária, abriu a porta para saber quem vinha interromper sua viagem.

Ao abrir a porta, encontrou a síndica, que viera receber a taxa de condomínio que, segundo ela, vencia naquele dia. Se fosse paga no outro dia, haveria multa.

Após pagar suas obrigações a sindica, esta se retirou. Lembrou-se de que necessitava tomar banho. O calor do dia o fizera transpirar e, quando chegara, esquecera-se deste detalhe.

Sabia, no entanto, que ao entrar no circulo de luz, todas as partes do seu corpo e mesmo aquilo que carregava consigo era bombardeado por milhões de raios invisíveis que eliminavam todo e qualquer tipo de vírus ou bactéria que pudesse transportar para outros mundos. Havia recebido essas explicações dos cientistas daquele mundo, por isso nunca se preocupava com contaminações.

Lembrou-se também de que, na maioria dos planetas que visitara, sempre encontrara climas diferentes, porém equilibrados, pois só viajava para planetas de evolução igual ou superior à Terra.

Sempre que queria viajar, ficava imaginando como poderiam os humanos alcançar distâncias fora do sistema solar, usando máquinas tão rudimentares como os foguetes que ainda se fabricam na terra.

Segundo seu mestre, o planeta Terra ainda passaria por todos os estágios que ele via em outros recantos do universo, porém ainda deveria demorar. A humanidade terrestre é que deve ser dona de seus próprios destinos.

Não pode haver ingerência e mesmo interferência que possam acarretar danos às culturas que se desenvolvem em outros mundos. Tudo deve seguir a evolução normal, para evitar que novamente os homens façam o que fizeram com as culturas pré-colombianas.

Os povos de outros planos apenas ajudam de forma indireta, porém não podem interferir com bruscas mudanças; o principio da liberdade e livre arbítrio deve ser respeitado em todos os lugares.

Quando visitara aquela repartição, tentando falar com o chefe do setor de medicina, tinha por objetivo ajudá-lo a solucionar problemas de saúde pública, através do conhecimento que poderia trazer para sanar as graves doenças que estavam surgindo. As doenças surgem em decorrência do desequilíbrio da sociedade como um todo.

Ficara, no entanto, parado, sentado, esperando que pudessem recebê-lo para oferecer seus préstimos com soluções para muitos problemas que afligiam a humanidade.

Com a interrupção que sofrera com a chegada da síndica, resolveu deixar a próxima viagem para o dia seguinte. O adiantado da hora e em razão do exaustivo dia sentia-se cansado, embora soubesse que poderia sanar tudo isso quando empreendesse viagem, porém, naquele dia, resolveu não viajar.

Deitou-se e passou a relembrar tudo que se passou nos últimos 36 meses, quando recebera de presente aquela máquina fantástica, que criava possibilidades quase infinitas.

Sabia que havia ainda milhares de lugares que ainda não poderia visitar, por estarem interditados em decorrência de abusos que seus habitantes haviam cometido. Mas, quando tudo fosse solucionado, o caminho seria novamente liberado.

Quando aparecia diante de si o campo de luz de cor esverdeada, estaria aberto o caminho que poderia ser seguido. Sempre trancava as portas do quarto para evitar o inconveniente de visitas inesperadas que pudessem descobrir o seu segredo.

O seu maior medo era com os aproveitadores, que poderiam usar a nave para praticar atos que pudessem quebrar a harmonia de todo o universo por onde navegasse.

Nas conversas que mantivera como o mestre, sabia da necessidade de manter segredo. Apenas se dirigira àquele gabinete para propor soluções que poderiam acabar com os maiores males da humanidade naquele momento.

Quando empreendia viagem, levava consigo o controle que poderia ser acionado de qualquer lugar em que estivesse. Logo que a viagem se efetuava, a máquina desligava-se automaticamente, por esta razão levava o controle consigo para ser acionado à distância, para religá-la e poder voltar novamente ao seu planeta.

Conhecera milhares de seres e animais, bem como vegetais que se espalhavam em todos os lugares visitados. Soube, através de informações, que em um planeta próximo da terra existiam gravações contando toda a história da Terra, nos últimos 800 mil anos.

Tudo estava gravado em cristais especiais, que serviam de memória de toda história do planeta. Cada cristal do tamanho de um dedo mindinho poderia arquivar a história da terra por mais de vinte mil anos.

Todos os planetas daquele recanto da galáxia tinham suas histórias arquivadas naquele planeta. Ele tinha como incumbência manter todos os conhecimentos que eram adquiridos e vivenciados para que fossem colocados dentro do próximo plano de evolução. Embora tudo isso fosse explicado, ele não conseguia entender com profundidade.

Todas as vezes que visitava o planeta-arquivo, dirigia-se aos anais da história da Terra e de todo o sistema solar do qual a mesma fazia parte. Manuseando dados da história da Terra, viu fatos que poderiam ser inimagináveis pelos terrestres.

Imaginou que sua própria história poderia estar ali gravada, porém ainda estava nos primeiros cristais e o bom-senso dizia que fosse seguida uma seqüência, para não haver choque entre o que ouvira na terra e a realidade que se passava. Não era aconselhável atropelar a história e mesmo a evolução.

E com todo este turbilhão de pensamentos adormeceu. Sonhou que fora roubado e que a máquina havia passado às mãos de marginais que a estavam usando para enriquecer de forma brutal.

Quando acordou, respirou aliviado, sabendo que o sonho não passara de um pesadelo que logo seria esquecido. Ele, como detentor daquele poder, não poderia permitir que a nave fosse parar em mãos erradas e pudesse prejudicar a humanidade ou mesmo os planetas que faziam parte das rotas que eram permitidas.

Levantou-se, foi ao banheiro para a costumeira prática de todos os dias e, após o café da manhã, saiu, pois tinha que andar por ruas apinhadas de gente. Queria encontrar alguém em quem pudesse confiar e ofertar sua amizade, para não se sentir tão só num planeta de mais de seis bilhões de pessoas.

Sabia que era difícil encontrar alguém com quem pudesse compartilhar seu segredo, porém sentia que precisava procurar alguém para poder conversar, mesmo que não pudesse falar das suas aventuras. Queria apenas encontrar uma pessoa que pudesse ser considerada amiga.

Todos os dias, no entanto, nada de novo acontecia em sua vida, que não fosse suas viagens que até pareciam fugas. Ia a lugares que a humanidade ainda nem mesmo conseguia entender e imaginar que pudesse existir.

Visitara paraísos, mas nunca ficara nestes lugares mais de 24 horas, pois era necessário a volta ao lugar de origem. Soube, através do dirigente do planeta de origem da nave, que ele fora escolhido por ser um deles que viera encarnar na Terra, para que pudesse alavancar o progresso espiritual da humanidade.

Agora, no entanto, sentia-se só, num mundo grande e maravilhoso, porém a ninguém podia confiar seu segredo. A humanidade se encontrava presa a seus valores e sua maior preocupação era o ganho. Poucas pessoas estavam preocupadas com os valores maiores que deveria ser à procura de todos.A verdade era apenas uma busca solitária de uns poucos.

Sentia-se como um exilado que não podia viver em seu verdadeiro lar. Assumira um compromisso com a evolução cósmica, por isso seguira rumo à terra, para ensinar e tentar reverter o que estava programado para transformação do planeta.Tinha que ajudar a humanidade no momento de grandes sofrimentos que já estavam próximos.Ainda não sabia tudo que lhe estava reservado.

Sabia que sua obrigação e que seu ato de livre arbítrio o tornara isolado do seu próprio povo, mesmo usando vestes diferentes daquelas a que estava acostumado. Seu sofrimento, muitas vezes, o fazia chorar por viver isolado, podendo apenas participar parcialmente do conhecimento cósmico.

Era aquele o preço que pagava por seu sacrifício. Sentia-se como um exilado do tempo, sujeito a viagens que o levava a lugares preferidos, porém ainda não poderia retornar em definitivo ao seu verdadeiro lar.

A solidão o tornara arredio, vivendo dias após dias, andando de um lado para outro, ajudando, quando possível, ensinando o que achava ser necessário, porém nunca poderia compartilhar o seu próprio lar com mais ninguém. Sabia que somente poderia confiar em seres do seu planeta ou outros de igual evolução.

E assim, sonhando com um mundo equilibrado, onde a humanidade aprendesse amar, sentou-se à mesa para o frugal almoço que, na maioria das vezes, se resumia a ingestão de frutas, seguidas de alguns cereais.

Dirigiu-se à biblioteca e, pegando um livro, abriu e passou a folhear despreocupadamente, enquanto aguardava que a chuva diminuísse para sair e ir ao encontro de seus “algozes”,

Sorriu de forma triste, esboçou sinais de cansaço, enquanto torcia para que o relógio girasse mais rápido, abreviando assim o tempo que ainda teria de esperar para, novamente, partir rumo ao seu verdadeiro mundo ou outros que fossem parecidos com ele.

Encontrava-se cansado da Terra, embora fosse um planeta de muitas probabilidades. Mas ainda era habitado por feras, que se intitulavam homens. Local onde ele se achava inserido, vestindo um corpo ainda forte e robusto que um dia seria abandonado. Então teria novamente sua liberdade para partir e voltar ao seu verdadeiro mudo.

Enquanto aguardava a mudança do clima que, naquele momento se tornava muito úmido, sentiu certa sonolência e do jeito em que se encontrava, sentado, adormeceu, acordando apenas às sete da noite, quando, novamente teria que viajar.

Enquanto se levantava, lembrou-se das várias noticias que ouvia através da imprensa e de relatos que surgiam de boca a boca, sobre a existência ou não de Ets. Muitas controvérsias sobre fatos reais, que ainda não poderiam ser comprovados pela ciência.

Não conseguia entender como tantos ainda pudessem imaginar que o planeta Terra seria a única morada de seres vivos. A igreja tinha tido sua parte de culpa neste grande engano. Temia que a crença sobre a existência de culturas fora da terra viesse destruir o poderio temporal e espiritual que tinha sobre as pobres almas humanas que se sujeitavam e acreditavam que poderiam ser salvas através de uma crença.

Os discos que surgiam em vários lugares tinha por objetivo mostrar sua presença na terra, para que os homens se acostumassem com a presença deles.

Ele sabia da existência de várias raças. Visitara centenas de planetas, conhecera várias culturas e outros pensamentos. Nunca precisara viajar nas naves, quando estas se encontravam na Terra. Seu transporte se limitava em entrar no círculo verde e transpor distâncias que, através das naves, não seriam conseguidas tão facilmente.

Só usava naves quando precisava deslocar-se por diversas regiões nos planetas que visitava.

As naves que apareciam na terra, criando toda a sorte de polêmica, eram procedentes de diversas regiões e planetas e tinham por objetivo ajudar a humanidade. Sabiam das transformações que seriam implementadas na superfície do planeta, bem como em todo o sistema solar.

Enquanto seus pensamentos deslizavam em todas as direções, lembrou–se dos objetivos da evolução.

Quando o telefone tocou, rapidamente se deslocou rumo à sala onde se encontrava o aparelho que tocava estridente.

Quando ia pegar o aparelho, este desligou. Parecia que o seu interlocutor havia desistido de falar e se comunicar consigo. Se tivesse um sistema de identificação de chamada, poderia saber quem lhe interrompera o curso de seus afazeres.

Por momentos esperou que o aparelho voltasse a tocar, mas nada acontecia; voltou ao quarto para tomar banho.Já passava das sete e trinta e logo teria que montar a nave para empreender viagem. Nos dois últimos dias ficara na Terra, não viajara para nenhum lugar.

Às vezes imaginava o que poderia acontecer, se um novo contato entre as raças viesse acontecer de uma forma brusca e sem planejamento. Lembrava-se dos povos da América, quando receberam os europeus de braços abertos, pensando que se tratava de deuses. Tudo surgido em decorrência de acontecimentos que haviam ficado esquecido no tempo.

Os europeus quase dizimaram os povos das Américas, sempre usando da mentira e com o apoio da Igreja, que se curvava diante da ambição e do brilho do ouro e da prata que lhe era ofertada para fechar os olhos.

Povos que viviam livres dentro de padrões adquiridos durante milênios, foram obrigados a se esconder para fugir dos invasores, tentando preservar sua cultura, diante da horda de invasores, comandada pela Igreja, que procurava salvar a todos, mesmo que para isso tivesse que expô-los ao sacrifício e à morte. A justificativa de salvar as almas dos povos indígenas era apenas um pretexto para dominação.

Agora a história era outra, porém sabia que o choque entre culturas poderia ocasionar outras rupturas evolucionais, inclusive acabando com a própria fé que se encontrava incrustada dentro dos padrões humanos. A interferência brusca e sem planejamento de civilizações mais evoluídas do espaço poderia provocar o caos na Terra. O povo estava acostumado a acreditar nos absurdos que lhe foram ditos pelos governantes em conluio com as igrejas. Ponderando sobre tudo isso, procurava sempre falar de forma suave. Usava a figura de mera conjectura ou hipótese, para que não ocasionasse desgastes em conceitos que deveriam ser abandonados. Porém tudo deveria transcorrer lentamente e de forma gradual para que não houvesse o caos. A prudência era o único caminho a ser seguido.

Passando pela cozinha, tomou uma xícara de café, foi para a sala, levando debaixo do braço o tubo que sempre mantinha escondido da visão de visitas curiosas. Sentou-se no sofá e passou a manusear o tubo. Tirou a tampa para, então, sacar de dentro dele a nave.

Quando ele entrava no círculo que se formava passava por uma verdadeira transformação. Seguia por diversos caminhos, rumo a lugares nunca imaginados..

O círculo descontaminava qualquer um que entrasse nele. Fora projetado também para isso. As diferentes dimensões e pressões eram ajustadas no momento que o viajante entrava no portal de transporte por isso o corpo nada sentia a não ser uma leve sensação de euforia, como se aquela luz esverdeada pudesse, além de ser vista, fosse sentida.

Enquanto os pensamentos iam e vinham de um lugar para outro, servia-se de comparações para entender a grande diferença existente entre a raça humana e tantas outras que habitam todos os recantos do universo. Já vira tantas raças e tantas diferenças que achava os humanos primitivos, que se julgavam civilizados.

Sorriu, quando se lembrou de fatos históricos que foram manipulados por interesses escusos, que procuravam manter o povo desinformado, para que se tornassem cativos e reféns de medos, crenças e superstições que, com o tempo, tomaram a cotação de lendas.

Quantos deuses, demônios, anjos e heróis foram criados, quando houve o contato de culturas diferentes. Agora, novamente, o grande projeto era de ajudar os humanos, porém sem interferências diretas. O sistema tinha por objetivo ajudar, porém usava-se de outros meios, evitando o contato direto para que o choque cultural, não criasse absurdos que pudessem, vir no futuro, ser cultuados ou mesmo odiados por falta de conhecimento.

Finalmente, acabou de montar a “NAVE”, escolheu a direção que sempre lhe ocasionava maior satisfação e, então ligou a chave. Em frações de segundo o grande circulo verde apareceu dentro da sala, criando uma aura de paz e tranqüilidade.

Com passos seguros e sem pressa, aproximou-se do circulo, entrou e partiu para mais uma viagem através do tempo.

VEM - 15/03/04

Vanderleis Maia
Enviado por Vanderleis Maia em 21/12/2005
Reeditado em 07/10/2010
Código do texto: T89080