Uma Noite na Floresta

Estava perdido, achava-se isolado de todos os conhecidos e somente a densa floresta era sua companheira. Cercado, via apenas as espessas folhagens que lhe roubavam até os mínimos raios do sol.

Perdera o sentido de orientação e encontrava-se extremamente confuso naquela floresta quente e úmida.

Não se lembrava de como chegara até ali, sentia-se como uma criança, procurando algo que não sabia o quê.

Quis chorar, porém não o fizera com medo que o som dos soluços pudesse atrair alguma fera. Por isso ficara quieto, tentando descobrir os meios de sair dali.

A noite se aproximava rápido, talvez em virtude de estar no meio da mata densa que impedia os raios do sol de iluminá-la.Sentia uma aragem que expulsava o calor quente e úmido do dia.

Passar a noite naquele ambiente desconhecido causava-lhe pavor. Por várias vezes tentou se lembrar do caminho que o levaria de volta, porém sentia-se confuso,o raciocínio fugia-lhe constantemente.

Lembrou-se de que saíra cedo para a sua caça e quando se dera conta havia-se perdido. Perdera completamente o sentido de direção.

Alguns pássaros ainda voavam por entre as folhagens, enquanto outros se aninhavam à espera da noite que se aproximava rapidamente. Isto para ele talvez fosse uma eternidade.

A brisa noturna trouxe o odor característico da unidade das folhas já em decomposição. Pequenos animais noturnos corriam céleres sobre as folhagens.

Estava armado,como sempre fazia quando ia à caça. Com aquela arma se julgava protegido de animais e feras, porém não escondia o seu medo.

Procurou uma árvore em que pudesse subir para se orientar ou mesmo ver qualquer indício de luz que o orientasse na volta a sua casa.

Na infrutífera procura, ouviu o som de um réptil rastejando. Talvez uma serpente sobre as folhagens, o que lhe provoca ainda mais medo e terror.

Com o medo, começou a imaginar mil perigos e passou a sofrer. Lembrou-se de que outros já haviam-se perdido na floresta, porém haviam retornado. O medo lhe fustigava o raciocínio, expulsando toda sua coragem e confiança.

Ao longe, ouviu o agourento pio da coruja, então soube que a noite chegava.

Os pássaros já haviam-se acomodado para passar a noite, apenas alguns retardatários ainda procuravam seu lar, que decerto iriam encontrar. Enquanto ele, suprema criação de Deus, estava perdido, confuso com medo, sem saber o que fazer para chegar a sua residência.

Pegou a lanterna que se achava dentro do embornal e tentou acendê-la, então constatou que ela estava sem pilhas e um misto de angústia e raiva, maldisse aquele descuido.

A imprevidência pregara-lhe uma peça. Pegou um cigarro e, ao acendê-lo, lembrou-se de que deveria acender uma fogueira para não ficar à noite no escuro. A coruja continuava seu lamuriento canto e lhe trazia mais medo.

Juntou algumas folhas que julgava secas e com um pedaço de papel que retirara do embornal, tentou várias vezes acender o fogo, até acabar com os fósforos. Conseguiu apenas o ardor nos olhos devido à fumaça das folhas úmidas.

Lembrou-se do lar, lugar de onde viera e então esta lembrança trouxe-lhe a sensação de fome e sede.

Pensou em gritar, mas raciocinou que não adiantaria. Aguçou os ouvidos, tentando ouvir qualquer som ou grito de alguém que porventura pudesse estar procurando-o. Nada, somente a coruja, os grilos e algum animal que corria no meio da mata sobre as folhas.

A lei da sobrevivência dirigia os destinos dos homens e os instintos dos animais.

Distante, ouvia-se o ladrar de um cão, mas não poderia orientar-se, pois chegava fraco e a densa mata o impedia de encontrar o caminho.

A noite era como breu, na lua nova não há claridade, o brilho das estrelas era ofuscadas pela mata espessa.

Tentou imaginar as horas, torcendo para que o novo dia clareasse o mais rápido possível, embora soubesse que ainda era muito cedo, pois escurecera completamente há. menos de duas hora. A sua angústia da noite apenas começara.

Pensou em rezar e pedir a Deus que lhe ajudasse. Lembrou-se de que há. muito não rezava e já nem sabia como começar, somente os sons de palavras desconexas eram ouvidos na escuridão da noite.

A mente confusa procurava encontrar meios de sair da situação em que se encontrava e, por mais que pensasse, nada, a não ser a angústia e medo.

Encostou-se em uma árvore como que procurando proteção e sentando-se, esticou as pernas lentamente .

Colocou o embornal sob a cabeça e, pegando a arma que levava, esperou o dia. Sabia que a espera seria longa e o cansaço talvez viesse a dominá-lo.Após momentos naquela posição, as pernas ficaram dormentes, obrigando-o levantar-se de novo.

Os sons,ruídos,chiados aumentavam de intensidade,levando-o a crer que eram enormes feras que estavam prontas a lançar-se sobre ele. Embora sua visão houvesse se acostumado com a escuridão da noite, estava ainda muito a desejar em relação aos animais noturnos que se movimentavam livremente.

O vento noturno esfriava cada vez mais. A pele estava enrugada, mas não sabia se era pelo frio ou por medo. Sentou-se novamente, pois não poderia continuar durante toda a noite naquela posição. Levantou-se e resolveu que deveria procurar um jeito confortável para passar a noite.

Tentou andar pela floresta, apalpando as árvores mas desistiu. Viu que seria inútil tentar sair daquela situação . O melhor a fazer seria tentar dormir, mesmo que o medo lhe ocasionasse tantos sofrimentos.

Ao lembrar-se de alguns momentos de sua vida e jurou para si mesmo que jamais iria sair novamente para caçar e muito menos entraria na floresta.Fez promessas,pediu perdão pelos pecados e depois começou a chorar.

Choro abafado como que se evitasse que alguém descobrisse seu medo, sua angústia e arrependimento. Após algum tempo, com um nó na garganta e os olhos ardendo, parou de chorar e limpou os olhos com as costas das mãos para evitar maiores problemas,pois as mãos estavam sujas . Deitou-se e, colocando o embornal como travesseiro, adormeceu.

Sonhou que enormes serpentes haviam-lhe mordido, quando tentava andar pela mata. Acordou assustado, com esperança de ver a claridade do dia. Viu que a noite ainda estava escura, nenhuma claridade. Acomodou-se novamente no travesseiro improvisado e adormeceu, só acordando com o alvoroço dos pássaros que já se preparavam para um novo dia.

Sorriu e, olhando para o alto, agradeceu a Deus, pelo fim de seus sofrimentos. Conseguira passar a noite e ver o raiar do dia sem que nada de ruim tivesse acontecido.

Acabara de passar a noite na floresta, o dia despontava, trazendo-lhe esperanças de novos rumos em busca do seu lar.

Já não sentia medo e, levantando-se da cadeira onde estivera sentado toda noite, esticou os braços e, levando as mãos ao alto, disse:

-Obrigado Senhor, por me concederes a razão para que, dominando a emoção, eu conseguisse romper a densa floresta que me envolvia e tolhia minha visão das coisas do mundo. Obrigado ainda por permitires que eu vencesse o espesso véu da escuridão e pudesse tornar a ver a luz que emana de si.Agradeço-Lhe, ainda, por minhas angústias e sofrimentos, pois sem elas eu jamais poderia saber o que é alegria.

Depois daquelas palavras, num misto de júbilo, alçou vôo rumo ao infinito, morada dos espíritos libertos do cárcere da carne.

14/11/83

Vanderleis Maia
Enviado por Vanderleis Maia em 10/02/2006
Reeditado em 05/03/2009
Código do texto: T110005