SEXO CASUAL
 
 
Como de hábito, Sandro chegou ao seu local de trabalho no exato momento em que a noite terminava de asfixiar os últimos raios de sol – as luzes artificiais dos postes na rua em frente ao seu prédio substituíam a acolhedora claridade natural que ele tanto adorava.
 
Lá dentro, o ambiente estava cheio de pessoas silenciosas, cada uma no seu canto, sem a menor preocupação com a vida alheia. Sandro gostava de privacidade no trabalho, por isso considerava uma verdadeira dádiva poder passar a maior parte do seu expediente noturno em uma sala reservada que ficava bem longe da “área comum em que a maioria das pessoas ficava”.
 
O grande salão central nunca ficava vazio, mas mesmo assim Sandro sentia calafrios toda vez que passava por ele, ele não sabia explicar, mas tinha algo a ver com o formato arquitetônico daquela ala do prédio. Havia um *pé direito muito alto, ou melhor, absurdamente alto. Isso lhe causava uma sensação esquisita de encolhimento, sentia-se pequeno, desprotegido e a mercê daquele prédio.
 
Aquele local trazia para Sandro sentimentos antagônicos, pois ao mesmo tempo em que o fazia sentir calafrios, também lhe trazia ótimas lembranças. Foi ali que conheceu várias garotas ao longo dos anos, cada uma teve algo especial para lembrar, algumas não passaram de simples flertes, um olhar mais ousado, mas que acabou não dando em nada. Mas outras... Com outras a história tinha sido muito diferente, houve química, houve pele, desejo, tesão, loucura e sexo... Muito sexo...
 
Nada como o sinal dos tempos - pensava Sandro - se não vivesse numa grande metrópole, com uma quantidade cada vez maior de garotas dispostas a tudo: bebidas, drogas, festas e principalmente sexo sem compromisso; ele tinha certeza que nunca teria a oportunidade de ter se transformado em um verdadeiro Dom Juan. Ainda mais do jeito que era tímido no começo. Era muito travado, não tinha iniciativa. Mas hoje era um novo homem, experiente na arte da sedução. Um notável mestre da arte do sexo casual. Já tinha perdido as contas, mas tranquilamente já tinha transado com mais de cem mulheres somente no seu local de trabalho.
 
Contudo, havia uma coisa que incomodava Sandro cada vez mais: ele estava cansado de sexo casual. Queria algo mais, queria sentimento, queria carinho, queria se apaixonar.
 
Outro problema para Sandro conseguir realmente conhecer alguém, era o pouco tempo de convivência que tinha quando conhecia alguém, via muitas mulheres novas por semana, mas elas iam ao seu setor somente de passagem e continuavam seu caminho e nunca mais cruzavam com ele.
 
Os dias passaram... Somente na última semana ele havia transado três vezes na calada da noite com garotas que nunca tinha visto, sendo que com uma delas quase foi pego no flagra por um superior intrometido que apareceu na sua sala de supetão. Mas foi só o susto.
 
Isto só fez Sandro ficar ainda mais angustiado em busca do seu amor, pois imaginava que se fosse pego teria sido demitido, e onde mais teria tantas oportunidades de conhecer pessoas novas com aquela freqüência? Fez uma promessa para si mesmo, o dia que se apaixonasse não deixaria a chance escapar por entre seus dedos: ele iria fugir com a garota, até mesmo seqüestrá-la se fosse necessário.
 
Foi no meio de uma noite de primavera que ele viu Ana pela primeira vez. E foi como ele sempre sonhou. Fizeram sexo na mesma noite, no ambiente de trabalho, em cima de uma mesa. Mas desta vez foi diferente, pois ele conheceu a sublime sensação do sexo com amor. Ainda no calor da paixão, ele lhe propôs que fosse embora com ele. Ela permaneceu em silêncio e Sandro entendeu que ela havia ficado tão feliz que sequer conseguiu emitir uma palavra. Ele a levou para o conforto do seu lar e tiveram um relacionamento extremamente curto, mas muito feliz, até que ela acabou em um cemitério e ele em um sanatório.
 
Foram um dos casais mais famosos da época e só se separaram pelo preconceito da sociedade, que nunca aceitou quando a mídia divulgou exaustivamente o caso do jovem médico legista de São Paulo, que após ter transado com mais de cem cadáveres de mulheres no necrotério municipal durante suas autópsias, acabou seqüestrando e se apaixonando por uma bela jovem de família tradicional que havia morrido de overdose.


*Pé direito: Termo utilizado na construção para determinar a altura (do chão ao teto) de alguma edificação.

 
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