O ANJO DO AMOR

Um anjo de luz pediu ao Criador que passasse um tempo entre os homens para entender porque a criação estava se perdendo. As pessoas estavam amargas, infelizes e viviam tristes.

O Criador consentiu, mas impôs uma condição: pediu ao anjo de luz que viesse em forma de amor e que ele, o anjo, se instalasse no coração do maior número possível de pessoas.

O anjo de luz, que era anjo porque fôra criado pelo amor do Criador, tudo sabia de amor, por isso era pura luz. E foi em forma de luz que veio à Terra para cumprir sua missão. Aqui se transformou em amor e procurou as pessoas para cumprir sua missão.

Encontrou um homem duro. Era duro com os filhos, com a mulher e com seus semelhantes. A luz do amor entrou em seu peito e encontrou um obstáculo: seu coração era de pedra. Bateu três vezes e não foi ouvido. A pedra sólida do coração tinha gravada uma série de palavras que o anjo do amor não conhecia: maus tratos, injustiça e perfeccionismo. O amor não conseguiu achar uma única fresta para penetrar no coração daquele homem.

Como a missão devia ser cumprida, o anjo do amor ficou por perto. Quando o homem sentiu-se sozinho, porque todos o haviam abandonado, o anjo do amor encontrou uma forma de penetrar no coração do homem.

Um cãozinho vira-latas, abandonado e com fome, surgiu diante do homem e lhe latiu amistosamente, abanando o rabinho. O homem do coração de pedra não viu ameaça no animal. O homem recolheu o cão, deu-lhe comida e um bom banho. O cão e o homem tornaram-se inseparáveis desde então. A cada latido amigo, cada vez que o cãozinho abanava o rabo alegremente, mais o homem se enternecia e a pedra do seu coração, misteriosamente, passou a se desmanchar e irradiar uma intensa luz.

As pessoas sentiram-se atraídas pela energia dessa estranha luz. A mulher e os filhos voltaram a viver com o homem. Ele estava diferente. Novos e antigos amigos surgiram e o homem passou a ser feliz. Com ele as pessoas à sua volta.

O anjo do amor continuou sua missão.

Encontrou um outro homem. Diante de si o anjo do amor encontrou um coração com milhares de portas abertas.

O anjo resolveu ali se instalar. Ao lado de cada porta, dois guardiões bem vestidos convidavam-no a entrar. Um era o egoísmo, o outro a ingratidão.

Escolheu uma porta e entrou. Percebeu que havia caído em uma armadilha. Uma força poderosa sugava sua luz para o interior do coração, enquanto todas as mil portas se fechavam ao mesmo tempo atrás de si, impedindo a sua saída.

No fundo deste coração o anjo do amor encontrou muitos prisioneiros que, como ele, estavam ali amofinados: alguns eram a lealdade, outros o reconhecimento e, em maior número, a ternura.

O anjo do amor libertou e recuperou os prisioneiros que se achavam acorrentados e mal alimentados. Como era um anjo pode abrir as mil portas e libertar os prisioneiros. Mas eram tantos os prisioneiros que mesmo mil portas não eram suficientes para dar vazão a todos eles. E, do coração do homem, saiam levas de lealdade, procissões de reconhecimento e fileiras de ternura.

A cada um o anjo do amor doava um pouco da sua luz para que eles saíssem mais fortalecidos. E, como por encanto, as portas foram retiradas pelos prisioneiros e levadas para fora daquele coração. As portas nunca mais foram encontradas.

O anjo do amor foi buscando outros corações: encontrou um coração magoado, amargurado. Mas, com a proximidade da energia do anjo do amor, este logo recuperou a sua alegria e as mágoas e as amarguras saíram depressa daquele coração.

Encontrou um coração ciumento, que também aprisionava o sentimento da possessividade. Tão logo o amor libertou a possessividade que nele se instalou, o coração compreendeu que enquanto tivesse o amor dentro de si não havia necessidade de aprisionar o ciúme, a possessividade e mais nada. Não havia espaço para guardar outro sentimento que não fosse o próprio amor.

Um pouco mais adiante encontrou um coração distraído. Viu que esse coração não possuía portas. Muitos sentimentos entravam e saiam como bem entendiam. Nesse coração o amor não encontrou dificuldades para entrar e se instalar. Mas, também não teve dificuldades para sair.

Finalmente, quando estava próximo de concluir a sua missão, o anjo do amor encontrou um coração traidor. Também ali encontrou um coração com portas abertas. Mas, desta vez, os guardiões eram a sedução e a desconfiança.

A sedução recebeu o anjo do amor com perfumes e pétalas de rosa. Mensagens escritas de boas vindas. Palavras de carinho, roupas provocantes, corpo alucinante, sorriso inebriante, carícias sensuais.

A desconfiança, pelo contrário, fez milhões de perguntas. Revistou o anjo do amor para ver se não carregava algum tipo de ameaça. Ainda não confiando, conduziu o anjo do amor pelo único corredor que todas as mil portas abertas davam acesso.

Convidado a entrar, o amor percebeu que as mil portas logo se fecharam atrás de si com um som ensurdecedor.

Antes que o anjo do amor percebesse a armadilha em que tinha caído, pularam sobre ele todos os sentimentos que o amor havia desalojado dos outros corações: os maus tratos olhavam para ele furiosos; as injustiças escarneciam do pobre anjo do amor. O perfeccionismo sorria zombeteiro por ter sido o anjo do amor tão imperfeito por ter caído naquela armadilha. Ao mesmo tempo, o egoísmo tentava arrancar partes da luz que emanava do anjo do amor mantendo-as guardadas em uma caixa de aço. A ingratidão estendeu suas mãos com unhas compridas e pegajosas. Mágoas e amarguras brandiam e estalavam ameaçadoramente seus chicotes. O ódio, vestido de negro, faiscou seus olhos de felicidade quando o anjo do amor passou acorrentado.

O anjo do amor notou que naquele coração traidor havia outras prisões onde além da lealdade, do reconhecimento e da ternura, também estavam encarcerados o perdão, a esperança e o esquecimento.

Arrastados por estes sinistros sentimentos, o anjo do amor foi conduzido ao centro do coração, onde foi finalmente apresentado à vingança, que, de punhal na mão, olhava satisfeita para o valioso prisioneiro.

Neste momento, interveio o Criador. O anjo do amor se transformou novamente em anjo de luz e pôde, assim, abandonar o coração traídor que, com o abandono do amor e habitado por tão negros sentimentos, jazia prisioneiro da vingança.

O anjo de luz perguntou ao Criador porque Ele, o Criador, havia criado sentimentos tão vis. O Criador respondeu que no coração traidor havia reunido todos os sentimentos ruins que poderiam desviar o homem das energias do amor. Havia criado o coração traidor para advertir os homens.

Os homens sempre seriam atraídos pela sedução que ficava à porta do coração traidor. Tào logo fossem seduzidos e convidados a entrar, seriam importunados pela desconfiança. Momentaneamente seduzidos, teriam seus corações tomados pelo coração distraído, que é permeável a todos os sentimentos passageiros. E assim, aprisionados, o coração traidor os faria sofrer, até que permitissem que a vingança vencesse, transformando-os em novos corações traidores.

Se na busca do amor os homens caíssem nas garras do coração traidor, só encontrariam saída se derrotassem os desejos da vingança. Ela nunca poderia ser instalada em seus corações.

Se, pelo contrário, fossem apunhalados pela vingança, a possibilidade do amor se instalar estaria definitivamente morta. A menos que fossem salvos pelo Criador!

O anjo do amor, quando chega, chega em forma de luz e sempre encontra um jeito de instalar-se em qualquer coração. Vai-se, porém, quando é aprisionado por um coração traidor, porque os sentimentos negativos que ali moram acorrentam o amor, apunhalando-o ou mantendo-o em prisão eterna.

12.11.06

Paulo Sergio Medeiros Carneiro
Enviado por Paulo Sergio Medeiros Carneiro em 13/11/2006
Reeditado em 13/11/2006
Código do texto: T289716
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