A LIBERDADE

Estava preso, amarrado sangrando pela boca, braços e cabeça, era mantido entre dois guardas que o segurava mantendo-o ajoelhado perante aquele se intitulara rei. Rei de alguns homens, sim de homens que se vendiam, em troca de sua própria vida.

Ele, já cansado de tantos maus tratos desmaia. Trazem água, jogam-lhe no rosto e apenas um pequeno vislumbre de consciência o reanima.

Tenta se levantar, porém obrigam-no a ficar de joelhos como se fosse para reverenciar ao rei.

As dores em todo o corpo incomodam, mas obrigam-no a permanecer naquela posição humilhante perante aquele que o mandara, prender, torturar, tentando obrigá-lo a renunciar suas crenças e convicções.

O direto de pensar, crer e fazer o que quisesse já não era livre, dever-se-ia somente pensar de acordo com a vontade do soberano.

Tentava em vão pensar e raciocinar procurando descobrir os reais motivos de tudo, quando ouviu a gargalhada em tom zombeteiro, daquele se intitulava rei.

Após estrondosa gargalhada, levanta-se da poltrona e dirigindo-se ao prisioneiro pergunta:

- O que você entende por liberdade?

Ele cansado tentou se levantar, para ficar numa posição mais digna, então responde:

- Em primeiro lugar, minha liberdade não se restringe pelo simples fato de eu estar amarrado, do jeito como me encontro. Mesmo assim do jeito que estou, posso ir mais longe do que você possa imaginar.

- Você não; senhor responde aquele que antes estava sentado na cadeira à sua frente.

- Para mim só existe um senhor, e, este senhor, com certeza não é você.

Ao ouvir aquelas palavras, aquele que se encontrava a sua frente, levanta-se e dirigindo-se ao prisioneiro agride-o violentamente ao mesmo tempo que fala:

- Saiba que tanto posso lhe dar a liberdade, como posso lhe tirar a vida.

Mais uma vez, o prisioneiro com toda a serenidade responde:

- Não, nem você nem ninguém pode fazer isto comigo, minha vida e liberdade dependem somente de Deus e não de um simples mortal como você.

- Deus? isto não passa de palavras inúteis, pois vivo e existo sem ele.

Respondeu aquele que se intitulara rei.

O prisioneiro olhou o seu algoz e sorriu.

- De que ris, por acaso te julgas imune a minha lei?

- Sua lei não existe para mim, ela serve apenas para aqueles que vivem e dependem de você.

Reponde o prisioneiro.

- Mas eu posso tanto jogá-lo em uma cela como possa mandar que o execute, tudo depende apenas de mim.

- Sim poderá fazer tudo o que dizes, porém nada disso irá me afetar, pois mesmo assim continuarei vivo.

- Como, por acaso te julgas imortal?

- Sim, eu sou.

- Explique-se imediatamente!

O prisioneiro cansado da ignorância daquele que se julgava soberano e dono dos homens e suas consciência. Ele sentindo melhor, após ter recuperado parte de suas forças, consegue se levantar e esboçando um sorriso diz:

- Reconheço o seu poder sobre os homens que vendem suas almas, procurando com isso salvar seu corpo da fome e das dores, além das angústias e incertezas. Eu, que estou livre de todas essas mazelas nada tenho a temer no que se refere a sua lei e justiça. Tudo isso para mim é nada, eu existo além do seu próprio tempo e reinado. Eu sou o seu contrário.

O rei levantou-se, embora nada entendendo, mas querendo mostrar o seu poder para seus subordinados, diz:

- Cale-se você nada diz que tenha lógica. Eu sou o rei, sou a lei e tudo o que quero, faço.

- Sim, fazes o que os homens que o segue permitem, eles não passam de um complexo fisiológico sem alma. São verdadeiros mortos vivos, venderam-se e não possuem a razão. Por isso, qualquer ser da sua espécie os domina, eu, no entanto estou além de você.

O rei sentou-se, pensou por alguns segundos e então falou:

- Afinal quem é você para vir falar tais palavras?

- Eu já o disse:

- Como?

Pergunta o rei já bastante furioso.

- Você aprisiona meu corpo, que se encontra sofrido, porém eu continuo livre e sem sofrimentos. Eu existo além de tudo. Nada pode me matar, sou a própria liberdade que embora esteja às vezes ofuscada e oprimida, jamais perece. Você é a ignorância que sempre será vencida quando eu me manifestar.

O prisioneiro tendo acabado de falar,desvencilha-se das cadeias que o prende, vira-se e sai da sala lentamente, sem que ninguém ousasse lhe barrar o caminho.

O rei cai pesadamente sobre a poltrona, vindo a falecer no mesmo momento em que o prisioneiro se afastava.

19/09/83

Vanderleis Maia
Enviado por Vanderleis Maia em 26/12/2007
Reeditado em 27/09/2010
Código do texto: T792737