O POBRE E O RICO

Às vezes me dá um pavor,

que, em vez de me assustar,

faz tudo virar dor,

como fosse-me matar;

uma tristeza revolta

com a gente deste mundo,

que pensa que quem é pobre

é ladrão e vagabundo.

Que pensa que quem não tem

emprego de patrão

não pode ter celular,

só viver de água e pão.

Que pensa que quem não tem

emprego nessa vida

é porque, de alguma forma,

não quer pegar na lida.

Pensa que as coisas são fáceis,

porque veio em berço d’ouro,

e que pobre nem tem parte

no montante do tesouro.

Digo, é desmerecedor

deste mundo e tem que ser

empregado trabalhador,

que além não é de merecer.

Quando vê pobre estudando,

faz alarde e fica louco,

se nem na nota do Enem

não marca nada, faz tão pouco.

Não que eu queira ser cruel,

mas fico assim imaginando,

você não vai ter melhor céu,

só melhor cova, por enquanto.

Melhor cova, mas também

vai ficar murcho e eu duvido

que não vá ainda feder

mais que qualquer mendigo.

É bem triste a todo mundo

que mesmo sendo você

o malfeitor e vagabundo,

o que todo mundo vê,

ainda se creia na impressão

que a rede Globo e as outras fazem

de que pobre é que é ladrão,

quando é você, que todos sabem,

que mete a mão em dinheiro,

que roubou terra do vizinho,

que matou gente sem piedade

pra cada vez ficar mais rico.

É você que faz o mundo

ser desgostoso e nojento,

você e teu mérito

sujo e miserento.

E ouça ainda o que eu digo,

você, trabalhador,

que, porque ganha um pouco mais,

pensa também que é melhor.

É bom prestar atenção,

que num mundo de reis e escravos,

uns são sempre só patrão

e os demais são só baralho

que fica na mão de uns poucos

aumentando a sua soberba.

E pra sempre será assim,

se não se criar consciência.

Se não se criar senso crítico,

se a gente de bem não governar.

O mundo não seria isso

se nos puséssemos a mudar.

Primeiro, tomando rédeas,

sem deixar-nos submeter,

indo à rua e à escola,

pra também aprender.

Pra mudar realidade

temos nós que conquistá-la,

tirar nossa bunda nobre

do sofá de nossa sala.

Fazer com que políticos

e homens que são de mal

escutem os nossos gritos,

desde o paço municipal

até aos latifundiários,

anunciando que não há mais

quietude em nossa garganta

nem porque voltar atrás!