Lembranças não são saudades!

Já vão quarenta anos, e não esquecerei aquele dezenove de outubro e nem o que vivi em horas de encantamento, Sempre repito que: “Se o presente souber como estou feliz agora, não me perturbará com saudades do passado”, e assim esclareço uma vez que as pessoas confundem lembranças com saudades. São distintas; saudades quando temos vontade de voltar ao tempo, lembranças quando algo nos vem à mente, mas sem o desejo de que novamente aconteça. E, em todas as lembranças que tive não consigo me explicar como aconteceu!

Era manhã, por volta das oito horas e eu passeava na Praça Mauá, no Rio de Janeiro, e lá ainda funcionava a estação rodoviária da cidade. Havia uma lanchonete onde serviam chocolate na xicrinha, naquele dia eu estava de folga. Com meus vinte e um anos, vaidoso caprichava em meu visual, me sentia um rapaz lindo. O chocolate rendia tempo, o saboreava e deixava transparecer a minha satisfação em degustá-lo. Ela se aproximou com ar de tristonha, era uma bela jovem, uma das mais bonitas com quem então tinha tido algum bate-papo. Eu me considerava um pão; hoje sou pão dormido que virou torrada requentada. Insinuei-me a moda daquele tempo, e nada de chamar de “gostosa” uma mulher bonita.

Iniciamos uma conversação, e confesso com vontade de com os meus olhares invadir aquele corpo escultural. Mas o respeito, para quem passei a conhecer pouco antes, só me permitia um rápido olhar para a cintura de medidas tão exatas, e que pouco depois eu abraçaria. Ela me disse que naquele dia tinha vontade de estar longe do Rio, em outra cidade igualmente maravilhosa. Embarcamos então em um ônibus com direção à Petrópolis, distante poucos quilômetros e uma hora que também se fazia viajar as vistas, agradecendo a Deus o verde das folhas e o colorida das penas dos pássaros vistos pela janela, principalmente quando a velocidade diminuía na subida da serra. Completava esse romantismo as minhas mãos nas mãos daquela jovem. Beijei seu rosto.

Em Petrópolis fomos ao Museu Imperial enquanto não vinha a vontade de almoçar. Já aos ao meio-dia, motivados pelo frio e molhados na neblina entramos em um restaurante e pedimos dois Minestrones, uma sopa mundialmente famosa guarnecida com queijo ralado e torradas. Dois copos de vinho, a conta e um pedido: “Vamos voltar?” Concordei, e descemos a Serra de Petrópolis e meio a uma neblina, Tal era o meu encantamento, que esqueci de perguntar-lhe o nome, o endereço, ou mesmo roubar-lhe um beijo na boca. Fim de linha, pés no chão de onde partimos. Ela me declara: “Você é uma das coisas mais bela que me aconteceu”, e de imediato tira da bolsa uma aliança, a repõe no dedo e complementa: “Meu marido me espera, vou fazer as pazes com ele”. Para mim também foi bom!

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Seu Pedro é o jornalista Pedro Diedrichs, 61 anos, editor do jornal Vanguarda, de Guanambi – Bahia... Entende que a felicidade não está na satisfação sexual, mas na satisfação da alma e nos momentos de encantamento. Só Deus, que certamente a ele fez de anjo, reatou um laço desatado!.