Breves considerações
                 sobre o beijo


                     O melhor beijo é o beijo 
                     em que a língua faz o beijo.

                                   Autor desconhecido


     Na madrugada de hoje ouvi, no meu radio de cabeceira, que um crime fora praticado, após o casal trocar apaixonados e demorados beijos: ela, morta de ciúme, depois de beijar repetidas várias vezes o amante, tirou-lhe a vida, perfurando-o com sua amolada tesoura de costureira.
     O amante, segundo as testemunhas que resolveram falar, teria exalado o último suspiro com a cabeça reclinada sobre os seios fartos daquela que, momentos antes, lhe ferira mortamente.

     Para não dar muito trabalho à Polícia, a homicida, segundo a notícia, teria comparecido espontâneamente à delegacia e confessado o delito. Com palavras mergulhadas em abundantes lágrimas, ao policial de plantão, teria declarado: "Doutor, matei por amor..."
    

          Falando ao ouvido do meu radinho de pilhas, assombrado, indaguei: que diabo, e se mata alguém por amor? Incríve  

                         ***

                              
     Ligando, em seguida, meu televisor, acompanhei, atento e atônito, uma entrevista em que um cidadão de meia idade condenava, com extrema impaciência, o beijo na boca.
     Lá pras tantas, disparou: "Não é higiênico. E é ainda mais sujo quando trocado entre estranhos."
     A entrevistadora, uma jovem mulher de lábios atraentes e provocantes, manteve-se, por alguns minutos, de olhos esbugalhados; perplexa. Mostrando, claramente,  que não acreditava no que acabara de ouvir.


                         ***

       Digo eu. Tirando os chamados ósculos protocolares - geralmente de uma falsidade sem tamanho - o beijo - não é novidade - é um salutar ato de amor; uma  manifestação concreta de ternura imensa.
     Tão salutar é o beijo, que, para Machado de Assis, ele deve ser sempre restituído. Frisando o Bruxo: "Quem não o fizer isso, pratica um ato imoral."


                                   ***

      Além de Machado, outros escritores e poetas aplaudiram o beijo. Deram-lhe até eloquentes e carinhosos títulos. Lembro alguns.
     Drummond criou o "beijo superluar", na sua crônica Boca de luar.
     Catulo da Paixão Cearense, autor de belíssimas canções de seresta, inventou o "beijo musicalizado".
     Humberto de Campos criou o "beijo pecador": "O beijo pecador que pôs, como uma brasa, na minha boca virgem, fez-me desmaiar."
     Olavo Bilac, num de seus belíssimos sonetos, criou o "beijo divino". - Sinto-te o ardor, e o creptar te escuto/ Beijo divino! e anseio delirante,/ Na perpétua saudade de uma minuto."
     E Castro Alves? Falou sobre o "beijo eterno"  - ..."quero um beijo sem fim que dure a vida inteira..." 


                              ***

      Uma historinha que li e já não me lembro quando e onde.
     Um cidadão norte-americano requereu o divórcio alegando como causa determinante para o rompimento do laço conjugal o fato de sua mulher cobrar-lhe cinco dólares por cada beijo!
     Inspirando-se, possivelmente, nesse episódio, o saudoso poeta e consagrado repentista baiano Pepino Longo publicou, há muitos anos, na imprensa da Boa Terra, esta quadrinha:

               "Cinco dólares por um beijo...
               Depende...não sou casmurro...
               Mas sendo beijo de esposa,
               Caramba! É caro pra burro!"

                              ***
         Esqueça-se o beijo de Judas.
     Beijar nunca fez, faz ou fará mal. 

         O primeiro beijo recebido ou dado na mulher querida, como diz aquele inteligente comercial do sutiã, jamais será esquecido. Ele pode ter sido o começo de tudo...
     Ora, já dizia Cazuza - não confundir com o escritor José de Alencar, que carregava esse nome como  apelido - mas Cazuza, o compositor, que o beijo é "o fósforo aceso na palha seca do amor."    Quem duvida?


Nota - Coincidência feliz: Ivone, minha mulher há mais de 43 anos, aniversaria no dia 13 de abril: o "Dia do beijo". 



                                  

 
Felipe Jucá
Enviado por Felipe Jucá em 30/11/2008
Reeditado em 27/10/2020
Código do texto: T1311174
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