CONFISSÃO DE UM ANJO (A consequência do pecado de um anjo da guarda)

Claudeci Ferreira de Andrade

Acompanhei, ao departamento pedagógico da subsecretaria, o professor-tutor Ci. Vi Ci quando entrou para entregar um levantamento do número de alunos, de salas e a capacidade das mesmas, para o reordenamento de rede escolar. Ele procurou pela senhora Li, coordenadora do grupo de técnicos auxiliares das escolas dessa regional (dupla pedagógica, tutores), para receber as boas-vindas como um servo bom e fiel, mas a cara dela estava para poucos amigos. Ele, por sua vez, estava apreensivo, pois não sabia se tinha realizado a tarefa como deveria. Afinal, recebera ordem truncada, não fora um documento escrito (ofício). Contudo, sentou-se à mesa que a ilustre estava atendendo e quebrou o gelo.

— Bom dia! Aqui estão as informações.

— Onde estão os Gestores das escolas de sua responsabilidade?

– perguntou Li corpo a corpo.

Ele respondeu exatamente o que ela esperava ouvir, pois não havia nenhum Gestor ali.

— Foram convocados e até assinaram meu relatório de visitas, aqui está (eram três folhas abordando o objetivo das visitas do tutor), se não compareceram, é porque julgaram não ser tão importante assim!

Vi Ci pôr à mesa três folhas de relatório devidamente assinadas, porque a coordenadora nem sequer estendeu a mão para pegá-las. Assim, depois de um minuto de embaraçoso silêncio, Li concorda:

— Então, vamos fazer o que dá para fazer já que eles não vieram.

Percebi que ela não estava disposta; pareceu-me estressada. Mas, organizou seus formulários e começou o interrogatório, parecia uma delegada, criando armadilhas para pegar o culpado.

— Quais as medidas das salas? Por onde começa a numeração das salas? Quantas salas são? Que escola é essa? Quais turmas funcionam na sala nº. 1 nos três turnos? Blá blá blá...?

De vez em quanto, entre um telefonema e outro, ela voltava à mesa para mais um raud. Senti-me na obrigação de abrir a contagem para salvar quem estava na “lona”, porém vi Ci, desta vez, levantar-se cambaleando para o golpe final.

— Você não me pediu quais turmas funcionam em tais e tais salas, nos três turnos, mas posso telefonar para as escolas e providenciar essas informações que deseja, agora.

Foi aí que ela esbofou, como um soco fatal, usando palavras numa organização não muito didática:

— Eu estou cheia desses tutores e, se depender de mim, não vou escolher você para o próximo ano (2004).

Eu não sabia verdadeiramente o que se passava na mente dela, porque o anjo seu era outro, contudo era uma “competição” desleal. Assim, justifiquei-me e roubei aquelas folhas de relatório.

Durante o recesso de final de ano, vi Ci, por várias vezes, falando ao Pai, pedindo que eu o ajudasse na escolha: continuar na função de tutor ou voltar à regência em sala de aula. Impossível, não fui autorizado ajudá-lo! Cometi um pecado, por isso o Pai não me promoveu, agora sou o anjo dela.