Assim Como São as Lágrimas

By C.J.Maciel

Algumas pessoas falam de dois amores: o real e o ideal. É. Pode ser até que eles existam, mas, acredito que estes não são dois, são um; reflexos de um e de outro que, de maneira mágica e inimaginária, se completam. Nós é que somos egoístas e queremos enxergar tudo a nossa maneira: a maneira individualista de ser. A paisagem da vida é tão bela e simples que é por isso que pode ser chamada de completa, porque ela simplesmente é. Agente é que adjetiva, substantiva, recorta, retira e acrescenta. Seria bem mais fácil se apenas aceitássemos as coisas como elas são. Mas, fazemos o contrário: queremos dar as coisas a nossa cara, a nossa marca, só para ter o ilusório prazer de poder chamar tudo que temos de “meu”. Nada temos; nada somos. Isso é tão verdade que até o que sentimos não é nosso, é do outro, porque é ele que provoca, incita; é participante ativo, protagonista de nossa história que insistimos em construir sozinhos. É engraçado isso. Aprendemos que temos as coisas, que possuímos, e, mais tarde, a vida vem e nos ensina que precisamos aprender a ter desprendimentos. Talvez seja por isso que sofremos: não queremos aprender a desprender. Ao contrário, damos tantos nós em tudo que nós nos notificamos. É tanto assim que em tudo em nossa vida há notas, observações, recortes, grifos, substituições, resignificações e, no final, nada disso nos pertence, é tudo emprestado. Um empréstimo que tem juros altos dados pelo dono de tudo: o aprendizado. Nascemos com ele, crescemos com ele. É algo que, se tentarmos nos desprender, se tentarmos sutilmente fazer isso, dá nódoas! Dá nódoas! Nódoas de fugas, de sofrimentos, de amarguras, e porque não falar de nódoas de felicidades? Não importa! Todas são marcas que jamais saem. Se tentarmos apreender ao invés de desprender, se tentarmos fazer disso uma tentativa de nos lavarmos com o medo, com a não admissão; se negarmos o não enfrentamento, se não arriscarmos, apenas aumentaremos a mancha. Só as lágrimas conseguem atenuar estes momentos. Mas é só isso que fazem: atenuam! Sim, porque essas manchas não saem... Tudo pode apenas ser atenuado momentaneamente - como já é o verbo atenuar, assim como são as lágrimas. Por isso, aposte, simplesmente aposte sem querer ganhar. Aposte pelo simples fato de querer apostar na vida; aposte em viver sem esperar algo em troca. Esqueça o real e o ideal, principalmente se o assunto for o amor, porque este é como são as paisagens: plural e singular ao mesmo tempo. E não importa se for amor romântico ou de puro tesão, se for amor singular ou plural. O que importa mesmo é que Amor são misturas que, num todo, se faz uma, assim como é a vida e é assim que precisamos ser: plural e singular. Precisamos aprender a ser o todo com completo desprendimento: sem receios, com apostas, com choros, com nódoas, com lágrimas, com recortes de felicidades, mesmo que este Todo seja apenas configurado por momentos atenuantes de sorriso desprendido. Esqueçamos o aprendizado infantil de ter e ser por consequência e aprendamos a ter e ser por e com desprendimento. Acredito que, quando aprendermos isso, e só quando aprendermos isso, nossas mãos alcançarão o inalcançável e nossos pés cansados, descansarão e aprenderão a nos guiar por paisagens completas e deslumbrantes. Eles até poderão nos levar a percorrer caminhos antigos, a refazer histórias, só para vermos o que não vimos porque estávamos ocupados demais e preocupados demais em não aceitarmos momentos, pessoas, sentimentos: vivências. Quando aprendermos que a vida é desprendida, aprenderemos a aprender e a ensinar que o importante de tudo é simplesmente ter, pelo prazer de ter e ser pelo prazer de ser, mesmo que isso signifique dizer que teremos e seremos momentaneamente, assim como são as lágrimas.

Carlos Maciel CJMaciel
Enviado por Carlos Maciel CJMaciel em 30/08/2009
Reeditado em 30/08/2009
Código do texto: T1782784
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