OS CONTRASTES SANTA-MARIENSES

Santa Maria da Vitória é uma aprazível cidade localizada na mesorregião do Extremo Oeste Baiano, à margem esquerda do Rio Corrente, afluente do São Francisco que, nos seus primórdios, já foi chamada Porto das Lavadeiras.

No final do século XVIII, por volta de 1782, o fidalgo português e padre egresso da Igreja Católica, André Affonso de Oliveira, desbravador do sertão baiano e pai do fundador da cidade, Cel. Joaquim Affonso de Oliveira, aportou nestas plagas, primeiramente, no Brejo do Espírito Santo, onde veio a falecer e lá foi sepultado.

Seu filho, por desavença política com a Província, por não ter conseguido elevar à categoria de vila seu povoado, desgostoso, mudou-se para a sede da Fazenda Porto, propriedade da família, localizada às margens do Rio Corrente, e a renominou Porto de Santa Maria.

Anos mais tarde, depois de ter ido a terras lusitanas, trouxe consigo uma imagem de Santa Virgem da Vitória, quando o lugarejo foi rebatizado Porto de Santa Maria da Vitória. Entretanto, em 1909, então vila, foi elevada à categoria de cidade e passou a chamar-se tão-somente Santa Maria.

Posteriormente, já no ano de 1943, por existirem outras cidades com a mesma denominação, cogitou-se renominá-la Correntânea ou Samaria. Seu povo, contudo, não aceitou as sugestões e voltou a acrescentar-lhe “da Vitória” ao nome da Santa, que permanece até nossos dias.

Em Santa Maria, como simplesmente chamamos, há um riacho periódico que desemboca no Rio Corrente, na sua margem esquerda, dividindo a cidade em dois setores: o que fica à direita, ou seja, virado para a nascente do rio, batizaram-no Rua de Cima, ao passo que Rua de Baixo fica situada na margem oposta do riacho.

Até aí, tudo seria absolutamente coerente não fosse um belo capricho da natureza ao dar para o relevo local características, por certo, singulares. A Rua de Cima está na parte baixa e, na parte alta, a Rua de Baixo. É certo que os nomes foram dados, tomando-se por referência o sentido do rio, no entanto, os menos atentos dificilmente percebem.

Comungando esta aparente incoerência histórica, existem outras que são hilariantes, principalmente os apelidos que têm alguns dos seus distintos filhos, naturais ou adotivos. Por exemplo, a um legítimo representante da raça negra, deram-lhe o nome de Zé Leite, enquanto alguém de cútis branca (como querem as antigas certidões de nascimento), chamam-no Pretinho. Um cidadão bem grisalho atende pelo generoso cognome de Nenezinho, quando – por outro lado – uma figura jovial admite que o chamem Véio. Da mesma forma que o primeiro, Mucinha (ou Mocinha) já não é mais tão mocinha.

Ainda seguindo esta linha de contradições, Em Paz (in memoriam) era a alcunha de um dos seus filhos que não costumava “levar desaforo pra casa”. Já Guerra e Guerrinha, esses não. Nem de longe os apelidos e as suas ações se coincidem. Detestam confusão.

Se algum “collorido” procurasse mesmo por marajás, na Cidade Riso, como também é conhecida Santa Maria, existiu um que assumia:

– Sou Zé Marajá. E daí? O que há de errado?

Só que a esposa desse Zé não é marani nem ele foi um marajá. Foi agropecuarista. Já foi vereador da cidade, quando não se recebia gordo vencimento e a concorrência era bem menor.

E Anjo? “Este não tem nada a ver com o ente celestial” – diriam muitos. Por esta razão, acrescentaram-lhe o adjetivo “Mau”.
Além dos aparentes contrastes, soma-se o fato de ser Santa Maria da Vitória uma cidade “internacionalizada”, dada a variedade de pessoas com nome de países, tais como: dona Argentina, Israel, Zaire, Quênia, Irã e Iraque.

Para completar este quadro de antíteses, o primeiro “morador” da Casa Paroquial, quando esta ainda estava em construção, na década de 60 do século passado, foi o Veio Cão, um mendigo.


NOVAIS NETO. Meu Lugar é Aqui no Centenário de Santa Maria da Vitória. Salvador: NN, 2009, p. 127.