176 - UMA TARDE NO MINEIRÃO...
 
Ou uma baita confusão

                                     






                                          
                                                               
   

Foto do Estádio Governador Magalhães Pinto - “O Mineirão” - Área externa 
Fonte: http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/5/55/Pampulha.jpg



O futebol, “é o ópio do povo”, disse um dia o cronista Millôr Fernandes, e completou “e é o narcotráfico da mídia”. Enquanto o dramaturgo Nelson Rodrigues afirmava que em época de Copa do Mundo a Seleção brasileira é a “pátria de chuteiras”. Exageros à parte, talvez as imagens corroborem a fala, da excelente poetisa e cronista Conceição Gomes de Curitiba/Paraná
     Por causa do futebol a paixão fala mais alto e aí quando você percebe, já era. Você atravessou o samba. É que às vezes, a situação escapa do seu controle, mesmo por breve momento, e deixa de ser uma diversão, um simples jogo de bola. Acaba tornando-se uma loucura total. 
     Por causa dessas loucuras, que a gente faz algum dia, é que já se completou 40 anos que não vou ao Mineirão, o gigante da Pampulha.
Se bem que o jogo entre Cruzeiro e Atlético nunca em tempo algum, será um simples jogo de bola. As paixões envolvidas e nervos à flor da pele desmentem mesmo que haja tal propósito de ser apenas uma diversão.
Qualquer pessoa bem centrada e comedida nos atos, no meio de uma multidão histérica em um estádio lotado acabará por se envolver com a violência que há nos campos de várzea ou mesmo nos grandes estádios.
     Naquela época, nos idos anos setenta, impensável perdermos o jogão.
       Era dia de clássico quando chegamos lá, por volta das 09h30min horas. A bebida corria à solta dentro e fora do estádio. As torcidas chegavam cedo para assistir aos jogos preliminares, dos juvenis que hoje são os Juniores dos times principais, ou rodada dupla do certame regional.
     Neste dia de clássico no campeonato mineiro, uma manhã maravilhosa, sol a pino, sol de praia, como uma estufa, já esquentando as cabeças nos estacionamentos que agora chamamos os anéis do entorno do Mineirão. Lá dentro, no estádio com previsão para mais de oitenta mil torcedores com os ingressos vendidos, mais parecia um braseiro ou a boca de uma fornalha.
No nosso caso, a confusão que eu narro, começou quando chegamos ao estádio. Inadvertidamente entramos pelo portão errado, quase no limite da divisão das torcidas em dia de jogo Atlético e Cruzeiro.
A nossa sorte, se é que se pode dizer assim, é que ainda era bem cedo, por volta de mais ou menos dez horas tão somente, de uma manhã bem festiva. Ainda tinha pouca gente.
     A besteira já tinha sido feita, a decisão era correr para fora ou para dentro, mas, a grande besteira ainda estava a caminho. Antônio Eustáquio o “Caneco”, Tatão Miranda que além de ser o dono do carro era também o motorista, Sô Antônio Eliziário, outro colega de serviço e eu.
     Adentramos o portão naquele mundão de concreto, passando pelas roletas, ninguém com camisa de clube, mas, de azul discretamente. Externando nossa insanidade resolvemos encarar, coisa de loucos, embora sempre julgássemos os loucos são outros. Voltando à questão da entrada: Quando fomos alertados pelos homens da segurança interna, um dos colegas (talvez o mais pirado do grupo) sacou o boné estrelado que trazia no bolso e colocou na cabeça e estufou o peito e fomos em frente. (Bando de malucos).
     Quando a torcida do Galo que estava próximo aos bares, resolveu engrossar fizeram uma passagem indicando que iríamos passar no corredor polonês. Foi aquela gritaria, quanto mais grito, mais gente aparecia. (pequena mostra da histeria coletiva que tanto falam) E nós, tentando bancar os valentes...
     Depois de muitos xingos iniciais, das ameaças e chope gelado entornado bem no rego das costas, com um monte de impropérios, e dedos em riste na cara, uma equipe do batalhão de choque com aqueles cassetetes de madeira de mais de metro resolveu nos escoltar através daquele espaço sem torcedores a chamada terra de ninguém... A polícia bem armada dividia a cambada...
Podemos dizer que chegamos a salvo, isto é, molhados feito pintos, Opa!!! Ato falho nosso time não é o Galo. 
     Após  ouvirmos o que queríamos ou não ouvir da torcida adversária, ainda ouvimos o sermão da polícia, que achando que nós entramos naquele portão do inferno por pura provocação, fizeram uma advertência em tom pouco amistoso: - Tratem de ficar quietinhos, aí bem do seu lado. Se resolverem passar pro lado de lá, por qualquer motivo que seja o pau vai quebrar seus lombos. Nós mesmos cuidaremos disso.
Claro que ficamos na nossa!!! - Quem é besta?
     No gramado naquela tarde só dava o adversário, o primeiro tempo foi mesmo um arraso.
     Nas arquibancadas, além de pilha de rádio, urina envasada nos saquinhos de plástico, e muitas outras coisitas mais voando de lado a lado, e não era nenhuma “guerra de travesseiros”, ou brincadeiras de adolescentes, podes crer, ficavam coisas no ar mais que a bola no gramado.
     A torcida cruzeirense já bem desesperada não acreditava no que via. Parecia que o time azul não queria nada com a bola, até mesmo parecia que haviam passado a noite na zona ou na farra.
Naquela tarde... A coisa ficou bem feia, o Atlético ganhava de 3x0 e no final, faltando menos de 10 minutos, os torcedores atleticanos já comemoravam o que seria uma goleada histórica.
     O Cruzeiro empatou a partida o desespero mudou de lado. Os bambus de cinco metros que eram mastros das bandeiras, agora eram a arma preferida e o pau quebrou, tanto lá dentro quanto na saída e lá fora.
Como se não bastasse, conseguimos sair do estádio depois das 22 horas. Haviam roubado as quatro rodas da Vemaguete com os pneus e tudo mais.
     E o cúmulo do absurdo é que um rapaz que, a título de prestativa ajuda, disse que conhecia num ferro velho distante um amigo do seu cunhado que teria quatro rodas velhas sendo que uma estava bem amassada e com os pneus bem carecas. E se nos quiséssemos, pelo menos para vir embora, poderíamos comprar a tralha: quatro rodas com pneus, por uma bagatela, o preço de uma roda nova. Era pegar ou largar... Pensei com o lombo ardido, em jogo do Cruzeiro e Galo, “aqui não volto mais. É mole ou ainda quer mais?!”
     
Agora, já pensativo com minha intenção de “nunca mais voltar a o Mineirão”. Se bem que algum tempo depois, voltei para ver um jogo da Seleção Mineira e Carioca, mas aí, já é outra história.
     Vem aí a Copa do Mundo no Brasil e BH será uma sede, tem jeito não: - TÔ DE VOLTA AO MINEIRÃO.

Itabira, junho de 2010

CLAUDIONOR PINHEIRO
Enviado por CLAUDIONOR PINHEIRO em 20/06/2010
Reeditado em 10/02/2012
Código do texto: T2330152