Reforma Geral

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Paulo Sergio Medeiros Carneiro - 1995

Começar uma vida nova é bem difícil!

Muito mais do que nascer pela primeira vez.

É derrubar paredes, consertar telhados, trocar a pintura velha e desbotada por outra mais nova.

No fundo a gente acaba pensando que é tudo novo e que valeu a pena o sacrifício.

Chamamos os amigos (novos amigos, pois os velhos ainda se lembram onde ficavam nossos sótãos e porões). Mostramos a eles a decoração, os móveis novos, a nova distribuição. Esquecemos, porém, que as casas têm um estilo, pertencem a uma época e se assemelham aos seus donos. Só nós sentimos o sabor do novo e até nos esquecemos do que era velho e, por ser velho, antigo. Iludidos, pensamos que mudamos e que ninguém vai notar o cheiro de tinta fresca aplicada sobre a antiga, o remendo em nossas paredes, o azulejo moderno contrastando com o piso antigo. Talvez alguns dos novos amigos gostem dos nossos cômodos amplos, o pé direito alto e as paredes sólidas. Talvez a outros a mesma curiosidade que temos pelas coisas antigas os façam explorar os nossos caminhos. Em seus olhos o incessante brilho dos que buscam o desconhecido.

Começar uma vida nova é bem difícil quando é muito o volume de entulho a ser removido: muitas vidraças a trocar, muitas trancas a substituir, muitas portas a abrir, outras a fechar...

Mas, depois de tudo pronto, tudo limpo, brilhando e cheirando a novo, o que importa se a casa é antiga? Já resistiu a tantas ventanias, tanto sol forte e tempestades de areia e continua lá, de pé, firme e segura contra o tempo e as ameaças que vêm de fora.

Nós, homens, temos muitas moradas. Umas firmes e rijas; novas, velhas ou reformadas. Outras, provisórias, frágeis, efêmeras e sem estilo; apenas abrigos contra o mau tempo. Pisamos, porém, o mesmo chão que tem-nos desenhado muitos caminhos. Alguns já percorridos, outros por descobrir. Alguns, suaves e planos; outros, lamacentos e difíceis. Todos com atalhos que chegam até a nossa porta e nos levam para a linha do horizonte, onde as moradas são só silhuetas; os homens, apenas sombras cinzentas e escuras, de mesma natureza, indistiguíveis. Onde o caminho traçado e riscado no chão nos leva a um único lugar: o infinito de onde viemos, de onde pertencemos e para onde sempre voltaremos!

Paulo Sergio Medeiros Carneiro
Enviado por Paulo Sergio Medeiros Carneiro em 13/09/2006
Reeditado em 09/11/2006
Código do texto: T239149
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