Palavras mágicas

Quando nasceu a palavra? Que voz teria resumido a noção de alma que temos? Quanto silêncio durou no espaço de tempo em que esteve a palavra oculta? Teria vivido apenas nos gestos e no olhar imenso. Olhar de amplitude ilimitada. Ou teria sido exatamente a imensidão o primeiro estágio de nossa gigantesca miniatura interior?

Teria sido imitação de zunido? Balido, gorjeio? Vazado de nosso olho pela perspicácia do camaleão um só vocábulo? Antropófagos de dubiedades de que é feito o resumo de todos os móveis da ilusão. Como a palavra o camaleão come com a língua. Como a palavra.

A palavra devora o complexo e simplificado sentido de tudo.

Sobre a amplidão ela contém sentido em que até o que é desconhecido se retrata e de imaginação se veste. A palavra é rio que pode não ter havido em lugar estranho que ninguém conhece, mas segue. Bem mais do que voz, efeito de alma sobre cada dia que amanhece. Atrás de espaço, longe desse mundo, além de nossa fixada morada e em todo o vazio.

Sinto apenas que a palavra tem dó de quem não sonha, pois sobre ela, um espaço anterior se compõe de um tempo em que não havia, tempo de olhar, verter sem fogo a própria luz noturna. Conquistar sem possuir o incomunicável das horas. Madrugadora expressão de carinho o vocábulo se faz sono delicado, para alivio de tanta inquietação. Tanto movimento prestes a pedir socorro num gesto de abraço.

Em tudo a palavra aparece e se conduz. É veículo de todas as formas e telefona para dizer “amor” ou simplesmente “adeus”. Resume a matéria farta de perspectivas, insinuante como a aurora insana de um demônio perdoado a se perder. Impróprio numa cabeça vaga de esfinge que avistamos da rua. Os transeuntes guiados pelas palavras. Cada qual por ordem da sorte entre expressões adequadas. Cada sentido de artificial natureza a se louvar tão pobre, tão sensível. Pobrezinhos que somos de conhecimento entre funções divinas.

**********