ALÔ MOÇA DA FAVELA...

Lembro-me bem quando eu voltei dos Estados Unidos, e fui morar numa casinha bucólica e charmosa na Pompeu Loureiro em Copacabana; a noite eu costumava ir visitar os amigos das embaixadas e andar pelo calçadão na Avenida Atlântica até altas horas da noite, bebendo uma caipirinha aqui, uma cervejinha gelada ali e de dia comendo açaí com granola nos botecos de Copa. Raramente eu retirava da garagem o carro, salvo quando eu queria ir no Recreio ou quando eu queria visitar os amigos na Taquara.

A noite fervia entre a Lapa, Santa Tereza e Botafogo; cada noite era um programa diferente; eu cheguei a ir muitas vezes a Vila Mimosa e para quem não sabe o que é, trata-se do maior prostíbulo brasileiro, quiçá do mundo, com mais de 1500 senhoritas cadastradas. O local fica entre o Maracanã, o Morro do Barro Vermelho, Estácio e a favela Moreira Pinto e como se diz no Rio, sempre foi “chapa quente”; mas eu nunca tive um único inconveniente sequer; isso porque eu não ia pra lá para comprar ou vender drogas, muito menos desrespeitava as senhoritas que estavam em serviço.

Eu via as reportagens de arrastões, seqüestros, assaltos a carros fortes e chacinas, mas jamais vi nada enquanto morei na Cidade Maravilhosa. Quando os amigos chegam de fora e não conhecem o Rio, geralmente me pedem para apresentá-la; subo o Dona Marta, vou ao Cristo e no Pão de Açúcar; já assisti a um Fla X Flu no Maracanã lotado e as únicas mazelas que sempre percebi foram os taxistas maldosos que roubam clientes desavisados e os trombadinhas que se notarem um vacilão de tênis, meia até a canela e uma câmera fotográfica, eles limpam até a alma do sujeito; mas isso tem em toda cidade grande (às vezes as pequenas também).

Recente, fui ao Rio com minha esposa e minha filha; saímos de carro de Belo Horizonte e fomos para Angra dos Reis; na volta, atravessamos a Avenida Brasil inteira à tardinha e num domingo; passamos pelo Aterro e fomos dormir em Copacabana. Não vimos nada, mas sabíamos que a chapa já estava esquentando, pois o descontrole público para as questões das drogas e tráfico de armas não tardava em explodir e neste caso, como estamos notando, quem paga o preço mais caro é a grande sociedade que não cheira pó, que não fuma crack ou maconha, que não rouba carro, não seqüestra, muito menos matam pessoas.

Com esta onda de terror, onde até os hotéis são invadidos e hóspedes são feitos de reféns; onde a polícia mata, seqüestra, extorque, vende droga e arma em igualdade de condições com os próprios delinqüentes comuns, fica a pergunta: - quem é mais bandido?

Em 60 dias foram quase cem carros queimados; muitos destes foram ônibus onde as pessoas são convidadas a descer pela mira de fuzis; veículos onde famílias são ameaçadas, roubadas e depois vêem seus veículos sendo devorados pelas chamas. Este não é o Rio de Janeiro em que conheci e vivi no passado. Eu que já estive num dos lugares mais perigosos do planeta, Ciudad Juarez no México, não me recordo de ter visto cenas iguais as que foram veiculadas nos últimos dias nos noticiários do Rio de Janeiro. Hoje, se eu tivesse que escolher viver entre Ciudad Juarez e o Rio de Janeiro, acho que preferia o México, pois pelo menos, num caso de pene social, eu poderia fugir para a estadunidense El Paso, segunda cidade mais segura dos Estados Unidos e que fica colada a Juarez.

Antes do filme Cidade de Deus, eu estive lá também; comi tremoços e bebi cerveja nos becos, sempre na companhia de alguém da comunidade e antes do filme Tropa de Elite, eu também já fui algumas vezes no Morro do Alemão para levar uma antiga paquera que morava na comunidade, mas hoje, falando sério, nem se Jesus Cristo me garantisse a vida eu voltaria a muitos dos locais onde freqüentei. Falo com orgulho que vivi no Rio de Janeiro, conheci muitas pessoas de todos os níveis, que jamais me envolvi com drogas e que sempre entrei e saí de todos os lugares com total segurança. Nunca vi helicópteros sendo abatidos em pleno centro da cidade, muito menos tanques de guerra rasgando as ruelas das comunidades.

Hoje eu vi o Secretário de Segurança Pública do Rio, José Mariano Beltrame, dizer que os problemas são os mesmos e que esta onda de terror se dá, porque a polícia está sufocando os bandos de traficantes dos morros e favelas. Eu sinceramente acho que o digníssimo secretário, que é um homem probo e capaz na sua área, fala como político. O Rio de Janeiro tem dois problemas gravíssimos e isso só será capaz de reverter, caso haja homem com H que haja com mais rigor. O primeiro problema é que ninguém sabe quem é ladrão, traficante, assassino e policial. As pessoas se pelam de medo quando se deparam com uma blitz num local mais ermo; se a blitz for da polícia há uma grande chance de serem roubados; se for falsa blitz há uma grande chance de serem roubados e da polícia nada fazer, portanto, se um dia, utopicamente falando, pudermos evitar 10% da corrupção policial fluminense, já poderemos por as mãos para o céu! Na questão da corrupção policial eu não sei quem é pior, se o Rio de Janeiro, o México ou o Paraguai!

A segunda questão gravíssima do Rio é que o judiciário pouco se empenha para expedir mandados de prisão, mandados de busca e de apreensão. Muitos juízes vivem a sombra do medo, muitos promotores de justiça estão mais preocupados em dar carteiradas nas boates do Recreio dos Bandeirantes e fazerem a política da boa vizinhança com quem transgride a lei e o sistema penal. Ninguém pede a justiça uma ação mais enérgica nos locais mais críticos e quando se pede, ela nega, por medo, conivência, subserviência ou associação.

Se for feito um círculo no entorno do Rio, como uma operação sigilosa e enérgica, agregando forças policiais e das forças armadas, com amplo e irrestrito apoio do Poder Judiciário, onde por uma semana, todos que entrassem ou saíssem do Rio fossem revistados e investigados; e uma retaguarda de destemidos homens fizesse uma mega operação nos morros, favelas ou onde mais fosse identificado como suspeito; teríamos uma diminuição significativa da criminalidade carioca. Neste caso, a presença das Forças Armadas seria imprescindível para a garantia da ordem pública durante o ato, da mesma forma que nossas fronteiras, principalmente as linhas de divisa com o Paraguai, Bolívia, Colômbia, Venezuela e nas Guianas, fossem tratadas como PRIORIDADE NACIONAL, já somaríamos muitos pontos na diminuição da distribuição e venda de drogas no Brasil.

Mas então, porque não fazem isso? – É simples! Ninguém se compromete em sugerir e organizar uma operação desta magnitude, primeiro porque irão dizer que a coação não resolve; depois porque durante uma operação pesada de combate ao tráfico de drogas e armas, se pode chegar facilmente aos lares de muitos senadores, muitos deputados, governadores e muitas outras pessoas que ostentam títulos e medalhas nas paredes dos escritórios; muitos têm diplomas do TRE!

Enquanto houver o crime pesado no Rio não faltarão altas verbas nacionais e internacionais para o Governo e a Prefeitura gastá-las a título de combate a delinqüência; se não houver a crescente onda do crime no Rio o Governador não poderá contratar pessoas (que dá voto), não pode comprar viaturas e caveirões (que dão comissões e financiam campanhas), e sem verbas os gestores públicos não se podem comprar mais armas para aparelhar a polícia e os bandidos; portanto, se chega à conclusão que o crime dá lucro e ninguém quer acabar com ele!

Uma das polícias em que ainda se pode confiar é a Federal e a Rodoviária Federal; neste caso, criar mais delegacias, preparar mais agentes policiais, dotá-los de equipamentos modernos e com acesso a um banco de dados dos criminosos, isso ninguém faz; ao invés disso, as poucas delegacias da PRF que temos, estão com dois ou três patrulheiros no máximo, num plantão medíocre em uma cabine no meio do nada; locais onde a sorte é a única companheira desta gente. Neste último episódio carioca o Governo disse que mandou a PRF ajudar nos casos, mas a presença deles, pois mais que desejem o contrário, é meramente figurativo e não é isso que desejamos.

A Copa do Mundo de Futebol de 2014 está batendo a porta e uma fortuna será gasta para camuflar toda esta situação. - Tenham a mais absoluta certeza de que o Governo não poupará esforço para esconder a sujeira debaixo do tapete, para que o Brasil saia bem na foto, pelo menos, menos pior do que foi na África do Sul!

Gilberto Gil cantou “o Rio de Janeiro continua lindo, continua belo, continua sendo, fevereiro e março...”; até a época recente, eu também cantaria o mesmo, mas hoje, o Rio de Janeiro continua sendo uma zona de perigo máximo e se eu tivesse que dizer “alô, alô” para alguém, com certeza seria para o Governador Sérgio Cabral: Alô, alô Sérgio Cabral, olha o balaço!

Se a estratégia dos tanques não surtir efeito, quem sabe não vejamos as fragatas aportadas no mangue e os caças rasgando o céu e despejando bombas na cabeça da galera? – Duvidar, eu não duvido de nada!

Carlos Henrique Mascarenhas Pires

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Enviado por CHaMP Brasil em 25/11/2010
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