OLHARES

 
  
      Num mundo cada vez mais complexo como o nosso, nesta virada de milênio, é preciso exercitar uma verdadeira disciplina do olhar; com a colaboração de todas as áreas, da Filosofia, Educação, Letras e Artes, de todas as Ciências Humanas, para tornar visíveis as novas formas que vem tomando nossa existência histórica, especialmente o império do mercado e o gigantesco processo de exclusão que desencadeia no mundo inteiro.
     Sobre a sociedade e a cultura contemporânea está sempre lançado um olhar crítico haja vista a necessidade e a cobrança de justiça social e cultura mais viva..
     Ao conversarmos com alguém naturalmente olhamos para seus olhos numa demonstração de generosidade, atenção, confiança e, sobretudo, segurança. Muitos são os olhares que se vê estampados nas faces das pessoas, os quais sempre comunicam alguma coisa, uma mensagem, cuja linguagem é fortemente carregada de sentido. Eles dizem o que as pessoas, com palavras, não conseguem dizer, por questões várias.
     O olhar é uma linguagem forte e é também linguagem de Deus. Se prestarmos bem a atenção descobriremos vários tipos de olhares. Mesmo o olhar indiferente suscita reações contraditórias. O olhar é, em grande parte, a morada do homem cujo universo é vasto e misterioso. Olhar acolhedor que acolhe o próximo desabrigado. Olhar de rejeição que distancia o gesto de diálogo. Olhar de atração que cativa e envolve o semelhante. Olhar envenenado que espalha ameaça. Olhar inocente que semeia simplicidade pela face da terra. Olhar malicioso que planta a semente da maldade no corpo dos homens. Olhar indiscreto que revela as intimidades humanas. Olhar sigiloso que arquiva quadros dolorosos e cenas humilhantes. Olhar atento que não desperdiça o menor sinal de boa vontade.
 
Olhar displicente que esquece a presença do outro. Olhar compreensivo que apaga os rastos dos erros. Olhar intolerante que espreita o deslize da fraqueza. Olhar generoso de Cristo que abraça a todos. Olhar mesquinho do fariseu que cata e filtra migalhas.
 Olhar pastoral de Cristo que recupera o hesitante. Olhar encolerizado que fulmina o parceiro. Olhar de apelo que suplica compaixão e ajuda. Olhar intransigente que cobra a última gota de sofrimento. Olhar amoroso que unifica os que se querem. 
Olhar histórico que vive a evolução das construções, o fluxo das gerações, o movimento dos estilos. Olhar documentação que registra as clareiras dos horizontes, a floração dos campos, o sangue dos acidentes, o desesperado precipitando-se do edifício, o último aceno de quem está se afogando. Olhar de ansiedade que fica na estrada acompanhando aquele que parte. Olhar de esperança que não sai da estrada, aguardando a volta do filho pródigo. Olhar do agonizante que procura perpetuar sua presença entre os que ficam. Olhar sereno que anuncia a presença divina. Olhar céptico que recusa os sinais da esperança. Olhar consciente que ativa a reflexão humana. Olhar libertador que retira o irmão do cativeiro moral. Olhar argentário que industrializa até os sentimentos humanos. Olhar decidido que busca a realização pessoal. Olhar evasivo que evita o encontro com a realidade. Olhar pacifico que reconcilia as vidas separadas. Olhar reticente que fragmenta a confiança. Olhar de perdão que põe de pé a quem estava caído.
       O olhar diz tudo e na sua profundidade revela uma magia que vem de dentro, voz da alma que silencia a voz, apaga o gesto, solta a verdade, mostra o sentimento, solta a emoção e até pode parar o tempo.
 
 
Maria Loussa
Enviado por Maria Loussa em 27/01/2011
Código do texto: T2754418
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