Numa tarde de primavera eu admirava a graciosidade das borboletas e dos beija-flores.  
Com o toque sutil destas minúsculas criaturas sobre as flores, exalava um suave aroma indescritível por todos os lugares daquele agreste. De repente senti um abraço por traz de mim, e uma mão carinhosa tocou meus olhos e o silencio perguntou: “adivinha quem ?“ Nem precisava perguntar, pois eu já conhecia aquele toque singular.
Senti extasiada quando você molhou meus lábios com teus beijos e estendendo teu corpo sobre a relva, alojou tua cabeça sobre meu colo; ficou me olhando como quem examinava meus traços faciais.
Pôr um instante, desviou teu olhar de mim, e certamente encantado com as maravilhas da natureza, buscou minha opinião:
---Com qual destes personagens você me identifica, com uma borboleta ou com um beija-flor? 
Beijei tua face e, sem vacilar ,respondi que uma borboleta teria a tua cara. Pareceu-me que você esperava outra resposta, talvez um beija-flor. Observando os passarinhos, notei que os mesmos são lindíssimo , atraentes, mas pairam sobre as flores superficialmente e numa rapidez descomunal, proporcionando um balé frenético.
As borboletas são diferentes, param loooongamente sobre as flores, sugam o néctar também longamente, e se alimentam delas como que amando-as .
Você era minha borboleta , sugava meus lábios, alimentava-se dos meus carinhos, pousava sobre meu corpo , e parecia não poder existir sem mim, meu olhar parecia ser o segredo da tua vida .
Obviamente que eu contrariado a natureza, não deixava você pousar em outras flores ; nosso amor era insondável, e no meu modo de ver..., interminável.
Você me ouviu, sorriu e ,no relento perfumado e acariciado pelo toque das minhas mãos em teus cabelos, adormeceu. 
A natureza é linda, mas misteriosamente implacável conosco, nada fica intacta, tudo se transforma; e você como que obedecendo a esta lei, mudou teu caráter , teu modo de vida, teu jeito de me amar, é até tua expressão mudou- acabou aquele brilho em teu olhar encantador.
Abandonou a minha flor, beijou outra... mais outra... e mais outra... e no delírio de uma vida aventureira , se esqueceu que o tempo passa, não parou para pensar, tomar fôlego , refletir e descansar .
Permaneceu com aspecto de borboleta, mas interiormente, um beija-flor. Turvou-se tua visão, e com teu pico desgastado, impedido estás de sentir o sabor do alimento que precisas; tuas asas ficaram espessas , impedindo - o de voar, e tua mente confusa, não o deixa perceber a qualidade das flores que procuras, e nem mais percebes os venenos nelas camuflados.
Tua vida se tornou um modelo de esquizofrenia catatônica num vai e vem desenfreado .
Não escolheu nenhuma flor para fazer teu ninho definitivo. O tempo passou e você envolvido com o agora, não percebeu e, hoje vagas como um espectro de gente, como um fantoche ambulante.
O campo florido, onde tantas e tantas vezes fomos felizes, o homem o destruí ; assim também como destruído ficou você .
A relva onde repousavas comigo, não existe mais, em seu lugar, os trapos servem de colchões para os desabrigados; as flores que enfeitavam aquele jardim, se perderam entre o entulho . Os beija- flores que nos encantavam, são os teus“amigos” que usurparam você de mim,e hoje zombam da tua existência desumana; e as borboletas que disputavam comigo o direito de beijar teu rosto, são os corvos que voam como que profetizando teu misero estado.
Mas a natureza foi contigo sensível e tolerante , pois não permitiu que eu mudasse em tudo, principalmente o meu jeito de viver e de encarar a vida. Eu sei que o mundo dá muitas voltas e relutei ao máximo para preservar a essência da minha vida ; metamorfose minha cor, meu nome, meu aspecto e passei de uma ingênua e inofensiva flor, para uma planta elegante, audaciosa, consciente e carnívora; carnívora porque os sofrimentos e as desfeitas da vida me ensinaram a conhecer e desviar das falsas flores e agarrar com sapiência , paciência e esmero carinho , aquém hoje amo; mas não mudei meu caráter , nem meu ideal. 
Ainda te amo , e é mister compadecer-me de ti, pois o verdadeiro amor é eterno. 
Amar , não significa necessariamente conviver ou sujeitar-se aos caprichos de quem se ama, nem tão pouco envolver-se sexualmente, até porque o néctar que flui da minha essência, não mais te pertence.
Mudei quase tudo em mim, mas preservei meu humor e meu moderado  tom de voz, e é com estas minhas garras poderosíssimas  , que te caçarei para te ajudar, e quando tudo te parecer perdido, o destino te fará voar mesmo com uma das asas quebrada, e então como fosse teu último vôo, atraído pelo meu cheiro, cairás no átrio do meu amor.