Acaboou...

      Enquanto lá fora o mundo se divertia sob os sovacos do Rei Momo, eu caminhava, suavemente, entre meus livros e o meu incansável notebook.
     E li Pitigrilli (1893-1975), pseudônimo do jornalista e escritor italiano Dino Segre.
     Ó, o divertido, mordaz e irônico Pitigrilli! Hoje, pouco se ouve falar nele. Uma pena!
     No seu divertido Não se come frango com as mãos - Manual de Boas Maneiras -, tratando da aparência das pessoas em consequência da idade, ele dá este irrepreensível conselho: "Jovem, prepare-se desde moço para ser um velho suportável."
     Quanta sabedoria! Porque, nada mais intolerável do que um velho ridículo, inconsequente, enxerido.
     É, sem dúvida, um dos seus melhores livros. Creio que somente nos bons sebos será possível encontrar um exemplar de Não se come frango com as mãos. O meu, eu o adquiri, faz em 2012, cinquenta e um anos. Tá velhinho!
               ***   ***   ***
     Pra não dizer que fugira literalmente do carnaval, tive-o diante de mimem dois instantes, e saibam quais foram.
     Primeiro quando assistia o desfile da Portela; agrada-me vê-la alegrando a Sapucai.
     Apaixonei-me pelas suas cores, azul e branco, e sinto nela o entusiasmo da suadosa Clara Nunes.
     Na Portela, vejo o esplendor e a exuberância do carnaval carioca. Carnaval que o João do Rio um dia chamou de o "momento supremo da loucura".
     Segundo. Enquanto pesquisava, botei na minha vitrola marchinhas carnavalescas que fizeram sucesso no meu tempo de rapaz: Aurora, Jardineira, LambretinhaAs águas vão rolar, Me dá um dinheiro aí, Bandeira branca e mais outras que, ainda hoje, quando cantadas o tocadas, arrancam lágrimas de saudade.
     Quero, porém, que não reste a menor dúvida de que fui um acanhado folião. Sempre me faltou o molejo do qual se vale o cidadão para ser um bom sambista, e, consequentemente, arrasar "no chão da praça".
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     Aproveitava a calmaria (na Pituba não há carnaval) para digitar alguma coisa, quando alguém passou pela porta do meu gabinete e fez esta inoportuna observação:
     - "Arre! Você não cansa de escrever?"
     Respondi com esta frase do teólogo beneditino Anselm Grün, que recolhera do seu livro No ritmo dos monges: " Não considero o escrever como trabalho, mas sim como um recreio."
     E prossegui debruçado sobre o teclado do meu, repito, incansável notebook, como se estivesse num piano a tocar uma valsinha de amor...
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     O carnaval acaboou! 
     Quarta-feira de Cinzas e eu, nos seus primeiros minutos, com a mão na massa; melhor dizendo, digitando, digitando, digitando...
     O rei Momo e a Globeleza já se mandaram. A esta altura devem estar a caminho do seu silêncio. 
               ***   ***   ***
     Um esperto folião, que há pouco passou por aqui, confessou-me, sem pedir segredo: "Olha, este foi um carnaval que não me deixou saudade. "E foi logo se despedindo de sua fantasia, cansada e rota.
     Diante de sua desilusão, e como a querer consolá-lo, arrisquei-me a falar-lhe sobre o beijo no carnaval.
       Disse-lhe, que outros foliões, desse carnaval, levarão, se muito, a lembrança de beijos com o gostinho de Schin ou de Skol.   
     São beijos sem alma; furtados ou roubados no meio da multidão em ebulição e delirante. E completei: beijos que logo serão esquecidos!  
     Notei-o menos frustrado.
               ***   *** 
     O carnaval já era. Foi-se.  "Agora é cinza, tudo acabado e nada mais".
     Que  tenham todos uma piedosa Quaresma. Inclusive os que, no carnaval, se beijaram "adoidadamente".
      E por que não?
     
     
     

      


     

      
Felipe Jucá
Enviado por Felipe Jucá em 22/02/2012
Reeditado em 22/02/2012
Código do texto: T3512609