O filósofo de rua

Subi o Morro do Sossego, singrando pelas sujas ruas da Brasilândia. Ia na memória resgatando histórias, recolhendo imagens e batendo em teclas imaginárias o enredo daqueles toscos caminhos tortos; revolvendo velhos erros políticos que fizeram do bairro o mais excluído da Zona Norte de Sampa.

No caminho, cruzei um velho amigo, Laní. Logo rolou um papo longo, entremeado pelo som da roda de samba na esquina. O baticum ancestral irritava Laní. Ele dizia que aquele comportamento não mudaria nunca a história do negro no Brasil.

- Estes caras precisam se informar. Pegar pesado. Ler mais. Tirar a consciência da lama, da roda, senão vai todo mundo pro Carandiru. O fim é aquele já escrito: pegar em armas e apontar sempre pro lado errado. Irmão contra irmão. Não dá!

Laní predizia o futuro, descrevia o presente e lembrava o passado daquelas quebradas. Ele, com sua inseparável touca jamaicana, que misteriosamente escondia as tranças que apontava a consciência política rastafari.

O cara era a própria negritude ambulante, filosofando por aquelas esquinas de botecos e batuques. Dizia que o negro-escola-de-samba não tinha a força rebelde exalada da roda imaginaria da qual participara Zumbi, Malcon X, Bob Marley. Estes ícones eram, como dizia, consciências acesas da raça.