HIERARQUIA ÀS AVESSAS (Os coordenadores pedagógicos: Clínicos gerais da educação)

Ouvi de minha coordenadora pedagógica, que ali, naquele colégio, havia professor que fazia um rascunho de suas provas com respostas, porque não as sabia e precisaria “colar” para corrigir as respostas dos seus alunos. Fiquei indignado. Seria essa uma forma pedagógica de orientar um professor!? Eu sempre fiz gabarito para facilitar a correção das provas de meus alunos, que são muitas. Minha preocupação foi tamanha, que me levou a entrevistar alguns colegas. Contei o incidente à professora de sociologia e perguntei se ela entendeu a observação da professora-coordenadora. Ela pensou e disse:

— Eu a comparo com uma assistente social de uma grande cidade, que descobre um homem velho e andrajoso, vivendo na mais completa miséria, num escoadouro abandonado. Essa assistente resolve, então, fazer algo por esse ancião; ela lhe proporciona um banho e novas vestimentas, coloca-o num confortável lar para a velhice. Alguns dias depois, o velho desaparece. Volta para o seu abrigo anterior, alegando ter acostumado a viver naquele lugar. Assim é um professor de muitos anos de classe.

Seria verdade que ela falou de mim! Sou um professor de um bom nível (Pós-graduado), cheio das titularidades, apesar de mergulhado numa rotina: é assim que sempre funcionou.

Desta vez, fui ter com o professor de história. Contei o incidente, a comparação da socióloga e perguntei o que ele pensava disso:

— Por isso penso que, na escola, ainda, estamos há alguns séculos, durante o feudalismo no Japão, quando era costume um homem carregar seus idosos pais ao alto de uma montanha e deixá-los ali, para morrerem de fome e frio. De acordo com esse costume, quando uma pessoa completava setenta anos de idade e não era mais produtiva, a sociedade não tinha mais nenhuma obrigação para com ela. O sistema vai lhe vomitar, é só uma questão de tempo.

É, se bem que a coordenadora devia ter um pouco de paciência comigo. Vai ver, talvez, nem seja eu! Ela sempre fala a mesma coisa para muita gente. Até porque eu sou um professor tradicional e um tradicional gosta do outro!

No dia seguinte, falei com o professor de ciências e contei o incidente, a comparação da socióloga, o comentário do historiador e perguntei o que ele pensava disso:

— No meu tempo de aluno no colegial, conheci um mágico. Um de seus truques consistia em esvaziar reiteradas vezes um jarro de água sem acrescentar-lhe a menor quantidade desse líquido. Não sei exatamente como ele fazia isso com um jarro de vidro transparente; mas, se estou bem lembrado, toda vez que ele esvaziava o jarro, a quantidade de água despejada era menor do que na vez anterior. Esvaziar-se do próprio eu assemelha-se em alguns aspectos com o que o mágico fazia: você é o jarro do mágico; um velho profissional que se mostra cheio, mas oferece um conteúdo cada vez menor.

Eu não sou egoísta, apenas não deprecio a mim mesmo e não estou centralizado no meu próprio eu. Será que minha própria pessoa não deve, portanto, receber a mínima consideração?

Outra vez, falei com alguém; contei o incidente, a comparação da socióloga, o comentário do historiador, a ilustração do professor de ciências e perguntei o que ele pensava disso:

—Acho que para um escultor deve ser um problema dificílimo pegar um pedaço de mármore recusado, há anos, por um outro escultor mais talentoso, com uma figura parcialmente acabada e transformá-lo naquela que ele tem em mente, uma perfeita estátua. Você veio de outras mãos que desistiram, depois de tanto tempo precisa-se de um milagre para fazê-lo um espetáculo.

Não, não me acho intratável, além do mais, quero melhorar. Bastava ela dizer que era eu o tal professor e eu não faria mais gabarito.

Naquela noite, falei com o Cristo e contei o incidente, a comparação da socióloga, o comentário do historiador, a ilustração do professor de ciências, a fala do "alguém" e perguntei o que Ele pensava disso:

—Eu, com esse incidente, ampliei sua capacidade de amar, porque, tanto para ensinar quanto para aprender, precisa-se de amar. Ninguém jamais deu tão grande lição de amor como Eu: ao deixar sem condenação a mulher adúltera; ao fazer do ladrão um amigo crucificado ao Meu lado; ao perdoar alegremente a Pedro que Me negara; ao orar pelos que Me crucificaram. A minha norma de amor prefere um pecador que ama a um “santo” que não ama. O amor vem de outra demonstração de amor. Sua capacidade de amar a outrem está na medida em que deixe que Eu o ame, ou melhor, está na raiz de nosso relacionamento. Aprouve-Me redimi-lo a fim de torná-lo uma pessoa amorável. O Meu amor perdoa todos os seus pecados: triunfa sobre todo o egoísmo do coração, sobre sua impaciência, hostilidade, ressentimento, inveja, ciúmes. Eu sou o professor de todos os tempos. Também sou tradicional.

Depois desse encontro, nunca mais falei sobre o incidente. Lembrei dele quando assisti ao retorno da coordenadora à regência em sala de aula. Posteriormente, soube que ela solicitou uma vaga para a coordenação novamente, pois não conseguia mais lecionar (Os coordenadores pedagógicos são assim, põem-nos na sala de aula, e eles contratam um substituto atrás do doutro) — A indisciplina estava demais.

Encaminhamento de percepção

1- Segundo a coordenadora pedagógica, o rascunho para colar é prática de quem não tem capacidade. Você concorda?

2- Um professor com experiência de muitos anos em sala de aula(tradicional) está inadequado para “dar aulas” nos dias de hoje?

3- A que se atribue a atual indisciplina em sala de aula e falta de vontade do aluno para o aprendizado?

4- Por que as ações de um coordenadora pedagógica transformam tanto sua unidade escolar, tornando-a obsoleta quando esta retorna à regência em sala?

5- Pedagogo lecionando para o Ensino Médio é leigo, e o Licenciado em outra área, exercendo função de coordenador pedagógico é o quê?

6- Faça uma ilustração para a crônica que acabou de ler.