MEU ESPELHO NADA MÁGICO ( O pior da velhice é a feiura e a desgraça do ser um velho pobre)

Eu tenho uma aluna que, no início do ano, era sorridente e feliz, dada com todos e especialmente comigo até o dia em que, por acaso, ela me apresentou à sua mãe, não sei quais foram as orientações matriarcais, nem o que falaram a meu respeito, mas, depois disso, aquela mocinha mudou completamente o seu comportamento para comigo, se protegendo, agora mal olha para mim. Porém, isso não me preocupa tanto, pois não preciso da simpatia dela para viver melhor, apenas me preocupa, sim, o fato de ainda ser eu o professor dela. Que contribuição aquela mãe deu para a formação de sua filha? Será que ela vai se interessar por aprender de um professor desmoralizado e mal afamado? Todos os dia, ainda passo por aquela rua, na direção do colégio, e ela, às vezes, acompanhada de sua mãe nem sequer, os cumprimentos da formalidade. O leproso está passando! Na sala de aula, a mesma indiferença!

Os jovens devem ser ensinados a amar e respeitar os idosos, não falo pejorativamente, porque hoje existem tantos males, mas falo, sim, de responsabilidade social, isto é cidadania. Aquela mãe, com a idade que tem e as limitações da velhice que incorporarão em sua vida em breve, espera ter a simpatia da filha e os futuros cuidados! Contudo, treinada a se proteger dos asquerosos, como será uma filha amável?

O pior que a velhice é a desgraça do ser um velho pobre, assevero que é difícil admitir que qualquer idiota jovem se impõe melhor que eu, à vizinhança. As rugas de minha cara, marcas das expressões de quando eu era feliz e não sabia, sabem muito bem arruinar meu argumento e a gabarolice de que um dia foi herói. Do que adianta vinho novo em odre velho? Meu espírito é promissor, mas o corpo não ajuda. O que ainda me mantém vivo é o que falam a meu respeito, embora na tentativa de me desvirtuar e denegrir, sobretudo enquanto se protegem de mim, consideram-me pelo menos um perigo. Só meu espelho não me engana, de algum jeito, pois insiste em dizer-me que não sou nem um perigo a ninguém, nem nada. Defino-me melhor com um termo de João Guimarães Rosa: Eu "nonada" de mim mesmo perante este final de vida.