O DESBUNDE
Por Carlos Sena (Reflexões de um domingo pós beijo-gay).


 
A gente, às vezes, diz que “quem vive de passado é museu”. Diz também que o futuro a Deus pertence. Como quase não se sabe filosofar sobre o momento presente, então se inventa dizeres acerca da própria felicidade: “felicidade não existe, o que existem são momentos felizes”... Só que os momentos felizes não ficam “presos” numa garrafinha com álcool para a posteridade ver – fica no interior das pessoas para compor o seu passado. Se, por momentos, a felicidade foge, logo já será passado. Se, com saudades dos momentos felizes desejamos “de novo”, repetir aqueles momentos, então avocaremos o futuro. Vê-se, pois, como complicada é a natureza humana, talvez pela sua incessante necessidade de se imortalizar a si mesma. Porque só o tempo tem a credencial de nos imortalizar, tamanho é o seu poder de ser e não ser ao mesmo tempo. Talvez por isso a gente costume exagerar no desejo quando nos dizemos uns aos outros “vamos dar tempo ao tempo”. A rigor o tempo não se precisa a si mesmo, mas serve para nos completar em nossas limitações humanas – talvez no viés do que sempre costumamos ouvir ou mesmo ler na faculdade da vida: “há mais mistérios entre o céu e a terra do que possa imaginar nossa vã filosofia” (grifo meu). É isso. Hoje é domingo e amanhã poderá não ser segunda, porque a gente pode fazer domingo numa segunda e deixar o domingo para ser o nosso desbunde no dia que nos aprouver ser.